Divagações: The House of the Spirits
8.7.14
Eu gosto muito dos livros de Isabel Allende, de sua sensibilidade e de sua consciência a respeito do papel da mulher na sociedade. Um dos aspectos que mais me encanta em seu trabalho é a capacidade que ela tem de escrever sobre momentos tão trágicos de uma forma quase mágica, dramática e romântica ao mesmo tempo.
The House of the Spirits é baseado no primeiro e mais conhecido livro da autora, La Casa de los Espíritus. No cinema, a história acompanha duas mulheres – mãe e filha – que vivem momentos importantes da história do Chile. Clara (Meryl Streep) é casada com o poderoso Esteban Trueba (Jeremy Irons), um homem rígido e retrógrado, mas que um dia foi apaixonado por sua irmã mais velha, morta em um atentado contra o pai de ambas, que, por sua vez, estava envolvido com a política do país.
A filha dos dois é Blanca (Winona Ryder), uma jovem que quer mudar o mundo e se apaixona ainda muito nova por um dos ‘funcionários’ da fazenda de seu pai, o revolucionário Pedro (Antonio Banderas). O casal acaba sendo perseguido quando começa a ditadura militar no país e Esteban precisa provar seu amor por Clara, Blanca e Alba (Sasha Hanau), sua neta.
Só para começar, fica óbvio que há muita história para pouco filme. Nada em The House of the Spirits é aprofundado devidamente e diversos personagens apenas passam pela tela – um dos poucos que deixa uma impressão maior é a irmã de Esteban, Ferula (Glenn Close). São cinquenta anos que passam voando em apenas duas horas, mas os horrores da ditadura se fazem presentes (ainda bem!).
Outro ponto que deve ser observado é o caráter europeu da produção, com cenários em Dinamarca e Portugal. Ou seja, é uma América pouco crível, com direito a um Natal gelado e sem uma cordilheira ao fundo (estamos falando do Chile, afinal!). Para um público que desconhece o local, suponho que isso pode não fazer diferença, mas tenho dificuldade em aceitar que um texto tão latino-americano como esse seja retratado sem um compromisso com a autenticidade.
A música também não convence muito bem. Por mais que Hans Zimmer tenha tentado colocar alguns temperos, parece que o objetivo era transformar The House of the Spirits em um projeto palatável a um público de qualquer parte do mundo, o que resultou em um filme pasteurizado e sem personalidade. Sinceramente, isso não faz sentido quando se trata de uma história com magia, fantasmas e amores inexplicáveis.
Para falar a verdade, entendo que o diretor e roteirista Bille August tenha gostado do material original, afinal, ele é uma pessoa sensível. Contudo, faltou a mente criativa de alguém que realmente compreendesse o trabalho de Isabel Allende, seu estilo literário e a história da América Latina (e também do Chile, mais especificamente). O filme ganhou ares de um melodrama shakesperiano quando deveria ter um aspecto misterioso e inocente.
Para completar, os atores são dos Estados Unidos, o que não é incomum, mas o fato é que nenhum deles parece estar no lugar certo ou sequer pertencer a uma mesma família. O filme ainda merece ser visto pelos trabalhos individuais, pois todos estão ótimos, com destaque para Meryl Streep, que consegue trabalhar bem o aspecto etéreo de Clara, e Jeremy Irons, que ficou ótimo em todas as fases de seu personagem.
The House of the Spirits é uma produção com muitos problemas, mas que tinha potencial para ser belíssima. Será que a história receberá outra chance? Suponho que a trama funcionaria melhor em uma minissérie que em um longa-metragem.
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