Adaptar histórias reais é sempre um desafio – ainda mais quando envolve mostrar uma pessoa que é querida mesmo muitos anos após sua morte. Acrescente a isso a dificuldade de retratar um período pouco conhecido da vida dessa personalidade e você talvez chegue perto de entender o que tentaram fazer em Becoming Jane.

O filme acompanha o romance de uma jovem Jane Austen (Anne Hathaway) com o irlandês Tom Lefroy (James McAvoy). Ela é uma moça bem educada, mas que não tem dinheiro e propriedades, enquanto ele vive da mesada de um tio muito exigente. Ao mesmo tempo, ela recebe uma proposta de casamento de um homem rico, mas que não conquista seu coração (Laurence Fox).

Infelizmente, existem poucos registros desse período da vida da escritora. Sabe-se que ela se encantou pelo rapaz e que ele, posteriormente, chamou sua filha de Jane. No entanto, não existem provas de que os dois realmente tiveram um romance ou de como foi o desenrolar dos fatos. Como o período coincide com os primeiros rascunhos de Pride and Prejudice, o filme aposta em referências do livro para criar a personalidade do protagonista masculino, enquanto a própria escritora também se confunde com sua mais famosa heroína.

Isso, a princípio, não seria um problema, mas Becoming Jane não sabe brincar com as referências que traz. O filme tenta construir a história sem deixar explícito o quanto cada acontecimento influenciou nas futuras obras da protagonista. Eu, particularmente, sou uma admiradora e gostaria que os livros estivessem presentes de uma forma mais direta, não apenas como uma ambição distante (suponho que isso também facilitaria para aqueles que não conhecem as obras de Jane Austen). Essa talvez fosse uma opção menos realista, mas o filme não consegue afastar a sensação de que tudo é especulação e exagero.

Filmada na Irlanda, a produção também se aproveita das locações para situar a protagonista como uma de suas próprias personagens, especialmente em uma comparação com a série Pride and Prejudice. Por mais que iluminação, cenários, figurinos e músicas ajudem, contudo, algo parece estar fora do lugar.

Anne Hathaway, sem dúvida, está linda no papel, mas sua Jane Austen não parece ser capaz de escrever aqueles livros. Ela sonho alto e foge de alguns dos comportamentos que pregava como corretos. Por mais que a ideia seja mostrar a transformação de menina ingênua em mulher, é complicado acreditar que a autora de tantos romances seja alguém com um coração partido e ressentido. Talvez eu esteja contando demais, mas a verdade é que não se pode fugir do fato de que Jane Austen nunca casou.

Por sua vez, James McAvoy entrega um personagem coerente. Ele flerta sem medir as consequências de seus atos (algo compreensível pelo contexto) e seria o suficiente permanecer nesse ponto. No entanto, a magia se quebra quando são utilizados recursos um tanto quanto aparentes demais para torná-lo mais alto que Anne Hathaway, o que acaba trazendo um efeito cômico indesejado.

Becoming Jane sonha alto demais, mas não consegue ser inovador o suficiente para garantir um bom resultado. O diretor Julian Jarrold parece confiar demais no material e nas caracterizações, esquecendo de colocar alma em seu filme. Tudo está no lugar, mas falta aquela paixão que os leitores de Jane Austen buscariam em uma produção como essa.

Outras divagações:

The Jane Austen Book Club

Pride & Prejudice