Divagações: The Danish Girl
16.2.16
Acho muito confuso quando um filme é vendido pelo que ele não é. Em um primeiro momento, isso pode até atrair público, mas logo as decepções começam a se somar e uma boa obra acaba arrastada para escanteio porque todos esperavam por outra coisa. No caso de um filme que envolve a luta das pessoas transgênero, essa estratégia parece ainda mais de mal gosto e deslocada.
Só para começar, The Danish Girl não é um ‘filme baseado em fatos reais’. A história é derivada de um livro de David Ebershoff, uma ficção histórica que empresta alguns elementos do que realmente aconteceu para contar uma história que não é necessariamente verdade. Normalmente, trata-se de uma linha tênue, mas o autor não esconde que fez mudanças com o objetivo de tornar sua obra mais comercial e mais impactante. Além disso, há quem discuta quem é a real protagonista desse drama.
Embora possa parecer um detalhe sem muita importância, isso faz diferença na forma de encarar a produção. Afinal, não se trata da luta de uma mulher para fazer com que seu corpo seja feminino; não existem dilemas sociais ou médicos. Essa é a história de um casal enfrentando problemas em seu relacionamento – sérios problemas, sem dúvida – e de como eles lidam com isso. Nem preciso dizer que esse drama entre quatro paredes não condiz muito bem com os fatos relatados por quem efetivamente tentou entender a vida das pessoas retratadas.
Einar e Gerda Wegener (Eddie Redmayne e Alicia Vikander) são um jovem casal de pintores em Copenhagen. Ele tem certo reconhecimento como artista, enquanto ela ganha a vida pintando retratos. Levando um dia-a-dia moderno para os anos 1920, eles se respeitam e procuram ser livres na vida a dois, mas isso não impede que tudo comece a desandar quando o marido decide, aos poucos, abandonar sua personalidade masculina e se tornar Lili.
O detalhe é que, a medida em que Lili decide abandonar tudo para se dedicar à transformação, Gerda começa a crescer profissionalmente, interligando dramaticamente as duas coisas. Ela sofre com o assédio de Henrik (Ben Whishaw) sobre Lili e com o fato de não poder mais contar com seu companheiro para uma vida social. Eventualmente, acaba pedindo a ajuda de um amigo de infância do marido, Hans Axgil (Matthias Schoenaerts), e de sua melhor amiga, Ulla (Amber Heard), mas sem muito sucesso. Até que surge o médico Warnekros (Sebastian Koch) com suas arriscadas cirurgias...
De certa forma, The Danish Girl é muito mais sobre as circunstâncias de Gerda e sua forma de lidar com uma situação inesperada que exatamente sobre Lili. Uma personagem absolutamente encantadora no começo da produção, Gerda cai em uma espiral sem fim de sofrimentos ao longo do filme – um aspecto que, aparentemente, teria sido suavizado se a personagem fosse mais parecida com sua contraparte real (que era bissexual).
Obviamente, não exijo que um longa-metragem seja totalmente fiel ao que realmente aconteceu, mas sinto que as liberdades tomadas aqui seriam mais bem recebidas se fossem tratadas como ficção. O fato de Lili não ter sido exatamente a primeira pessoa a passar por esse tipo de cirurgia ou a questão de ela ter feito mais operações que o retratado poderiam passar sem muito barulho se não fosse todo um contexto onde nada está exatamente onde deveria.
Para completar, por mais que eu goste do trabalho do compositor Alexandre Desplat, sinto que ele apenas colaborou nessa falta de tom da produção. Uma história que começa em plenos anos 1920 e que é protagonizada por pintores modernos precisava de ritmos repletos de improvisação e arranjos imprevisíveis. O que encontramos, no entanto, é formulaico e sem graça.
O diretor Tom Hooper, assim, apenas consegue se salvar porque conta com o excelente trabalho de Eddie Redmayne e Alicia Vikander – em um roteiro que absolutamente exigia atores competentes. Ambos constroem suas personagens com delicadeza e seriedade. E se existe uma razão que faça as pessoas assistirem a The Danish Girl, ela está nessa dupla que encanta a cada novo enquadramento.
Só para começar, The Danish Girl não é um ‘filme baseado em fatos reais’. A história é derivada de um livro de David Ebershoff, uma ficção histórica que empresta alguns elementos do que realmente aconteceu para contar uma história que não é necessariamente verdade. Normalmente, trata-se de uma linha tênue, mas o autor não esconde que fez mudanças com o objetivo de tornar sua obra mais comercial e mais impactante. Além disso, há quem discuta quem é a real protagonista desse drama.
Embora possa parecer um detalhe sem muita importância, isso faz diferença na forma de encarar a produção. Afinal, não se trata da luta de uma mulher para fazer com que seu corpo seja feminino; não existem dilemas sociais ou médicos. Essa é a história de um casal enfrentando problemas em seu relacionamento – sérios problemas, sem dúvida – e de como eles lidam com isso. Nem preciso dizer que esse drama entre quatro paredes não condiz muito bem com os fatos relatados por quem efetivamente tentou entender a vida das pessoas retratadas.
Einar e Gerda Wegener (Eddie Redmayne e Alicia Vikander) são um jovem casal de pintores em Copenhagen. Ele tem certo reconhecimento como artista, enquanto ela ganha a vida pintando retratos. Levando um dia-a-dia moderno para os anos 1920, eles se respeitam e procuram ser livres na vida a dois, mas isso não impede que tudo comece a desandar quando o marido decide, aos poucos, abandonar sua personalidade masculina e se tornar Lili.
O detalhe é que, a medida em que Lili decide abandonar tudo para se dedicar à transformação, Gerda começa a crescer profissionalmente, interligando dramaticamente as duas coisas. Ela sofre com o assédio de Henrik (Ben Whishaw) sobre Lili e com o fato de não poder mais contar com seu companheiro para uma vida social. Eventualmente, acaba pedindo a ajuda de um amigo de infância do marido, Hans Axgil (Matthias Schoenaerts), e de sua melhor amiga, Ulla (Amber Heard), mas sem muito sucesso. Até que surge o médico Warnekros (Sebastian Koch) com suas arriscadas cirurgias...
De certa forma, The Danish Girl é muito mais sobre as circunstâncias de Gerda e sua forma de lidar com uma situação inesperada que exatamente sobre Lili. Uma personagem absolutamente encantadora no começo da produção, Gerda cai em uma espiral sem fim de sofrimentos ao longo do filme – um aspecto que, aparentemente, teria sido suavizado se a personagem fosse mais parecida com sua contraparte real (que era bissexual).
Obviamente, não exijo que um longa-metragem seja totalmente fiel ao que realmente aconteceu, mas sinto que as liberdades tomadas aqui seriam mais bem recebidas se fossem tratadas como ficção. O fato de Lili não ter sido exatamente a primeira pessoa a passar por esse tipo de cirurgia ou a questão de ela ter feito mais operações que o retratado poderiam passar sem muito barulho se não fosse todo um contexto onde nada está exatamente onde deveria.
Para completar, por mais que eu goste do trabalho do compositor Alexandre Desplat, sinto que ele apenas colaborou nessa falta de tom da produção. Uma história que começa em plenos anos 1920 e que é protagonizada por pintores modernos precisava de ritmos repletos de improvisação e arranjos imprevisíveis. O que encontramos, no entanto, é formulaico e sem graça.
O diretor Tom Hooper, assim, apenas consegue se salvar porque conta com o excelente trabalho de Eddie Redmayne e Alicia Vikander – em um roteiro que absolutamente exigia atores competentes. Ambos constroem suas personagens com delicadeza e seriedade. E se existe uma razão que faça as pessoas assistirem a The Danish Girl, ela está nessa dupla que encanta a cada novo enquadramento.
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