Divagações: Wonderstruck

Hugo é um dos meus filmes favoritos. Assim, quando Wonderstruck foi anunciado, eu tive que tomar cuidado para não criar expectativas mai...

Hugo é um dos meus filmes favoritos. Assim, quando Wonderstruck foi anunciado, eu tive que tomar cuidado para não criar expectativas mais elevadas que o necessário. Afinal, esse é um filme da Amazon Studios, lançado por aqui diretamente na plataforma de streaming. Ao mesmo tempo, a produção conta com roteiro do próprio autor do livro, Brian Selznick, e direção de Todd Haynes, que tem vários filmes maravilhosos no currículo.

Na tentativa de segurar a empolgação, eu li a obra original e me deparei com uma história que, indubitavelmente, tem a mesma delicadeza e o mesmo apego à pesquisa visto em The Invention of Hugo Cabret. Embora existam vários elementos em comum – crianças solitárias que tentam resolver seus próprios problemas, apenas para citar o maior deles –, essa é uma narrativa que tenta utilizar de uma forma diferente os recursos já vistos antes, mas que não consegue criar o mesmo senso de estupefação. Há uma bela surpresa antes do final, não se enganem. Ela só não envolve as crianças descobrindo sobre a vida e a obra de um grande diretor dos primórdios do cinema.

Wonderstruck conta duas histórias paralelas, separadas por um período de 50 anos. Em 1927, Rose (Millicent Simmonds) é uma menina surda que mora com o pai (James Urbaniak), não tem uma boa relação com ele e se distrai recortando revistas e vendo filmes da estrela de cinema Lillian Mayhew (Julianne Moore). Um dia, ela foge de casa e vai para Nova York – não só atrás de Lillian, mas também de sua mãe e de seu irmão mais velho (Cory Michael Smith), que trabalha no Museu de História Natural.

Já em 1977, Ben (Oakes Fegley) é um menino que não conhece seu pai e mora com os tios, pois sua mãe (Michelle Williams) faleceu recentemente. Mergulhado em lembranças, ele buscava pistas sobre a identidade de seu pai quando sofre um acidente e acaba ficando surdo. Desesperado, ele foge do hospital e vai para Nova York com um maço de dinheiro deixado por sua mãe e uma única pista. Lá, ele faz amizade com Jamie (Jaden Michael) e encontra abrigo no mesmo Museu de História Natural.

As duas tramas, obviamente, possuem muitos pontos em comum e a história ganha peso justamente devido a esse paralelismo – reforçado pela presença de Julianne Moore em ambos os momentos. É um tipo de narrativa interessante, que raramente vemos como adultos, pois lida com um grande número coincidências, algo que costuma quebrar a suspensão de descrença.

Contudo, é justamente esse fator que traz magia a Wonderstruck. É uma história infantil, protagonizada por crianças e que trata sobre a descoberta de um mundo. O maravilhamento das personagens no museu ou mesmo nas ruas de Nova York é algo muito legal de se ver e traz à tona esse sentimento de “exploração” e “aventura” que muitas vezes deixamos de lado na vida cotidiana.

Para completar, o diretor apresenta 1927 e 1977 de uma forma praticamente didática. O mundo de Rose é em preto e branco e absolutamente sem som – o que faz sentido, já que ela nasceu surda –, combinando com sua adoração pelo cinema mudo às vésperas da chegada dos diálogos nos filmes. Já o universo de Ben, em contraste, explode em cores e barulhos, o que o deixa ainda mais agoniado e perdido.

Wonderstruck, dessa forma, é um filme muito bonitinho e competente. Não se trata de um grande drama ou de uma análise aprofundada, mas há uma mensagem muito presente pedindo por tolerância e esperança. Todd Haynes e Brian Selznick utilizaram de toda a sua sensibilidade para contar uma história que pode, muito bem, se tornar um A Little Princess ou até mesmo um The Secret Garden para uma nova geração. Falta só esse filme ser descoberto por pais e crianças.

Outras divagações:
Carol

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