Divagações: One Battle After Another

One Battle After Another

Por mais que tenha gostado de Licorice Pizza, lançado em 2021, eu esperava algo com um pouco mais de “mordida” para o próximo projeto de Paul Thomas Anderson. Seus filmes recentes eram todos mais intimistas e mundanos do que as grandes e ambiciosas produções do passado, como There Will Be Blood, de maneira que eu gostaria do retorno do diretor a algo mais substancial. 

One Battle After Another, de certo modo, parece ser a resposta a essas inquietações. Por mais que a produção acabe não tendo o mesmo senso de escala dos maiores projetos do cineasta, ela entrega uma montanha russa emocional de quase 3 horas de duração e que em momento algum diminui a sua velocidade.

A história acompanha Bob (Leonardo DiCaprio), um membro de uma célula revolucionária que operava ações de guerrilha em território americano, mas que teve de se esconder em uma vida mundana no interior após a identidade do seu grupo cair nas mãos do governo 17 anos atrás. Acompanhado da sua filha, Willa (Chase Infiniti), que não tem muita ideia dos motivos da constante paranoia do pai e só quer ter uma vida normal, Bob passa seus dias bebendo e se drogando na espera de que algo aconteça. O que ele não contava é com o retorno do coronel Steven J. Lockjaw (Sean Penn), que desmantelou o grupo décadas atrás e que, agora, tem uma vingança pessoal, mandando Bob em uma corrida desesperada para reencontrar sua filha.

Também cabe dizer que One Battle After Another é mais um dos filmes de Anderson baseado em uma novela de Thomas Pynchon. Assim, o filme compartilha várias características com Inherent Vice, como a energia maníaca, o grande rol de personagens e a maneira como a dinâmica entre estas pessoas funciona, especialmente no que toca o protagonista e sua incapacidade de ver todo o quadro da situação. 

Ou seja, frequentemente, Bob apenas reage às coisas que acontecem, tendo pouca agência na resolução da história. Apesar disso, ao contrário do que ocorre no outro filme, desta vez Anderson não sai do seu caminho para tornar este longa-metragem propositalmente confuso e obtuso, sendo que o resultado é bem mais digerível, por mais que o filme apresente essa mesma pegada “pynchoesca”.

A verdade é que se trata de uma adaptação bastante liberal do romance, mais preocupada em comentar, satirizar e analisar as questões políticas atuais dos Estados Unidos, sobretudo quanto a imigração e raça, ao invés de se vincular ao movimento de contracultura dos anos 1970. O impulso revolucionário de One Battle After Another é uma resposta aos novos imperialismos e protofascismos, não uma visão do macarthismo do passado.

Isso dá uma textura muito própria para a produção. Sinto que o filme tem um dedo no pulso da cultura política americana, tocando na vontade das novas gerações de “fazer revolução” mesmo sem saber como ou estar apta a tal. Há um festival de bordões e boas intenções investido em gente que não tem a capacidade de ir contra o aparato repressivo do Estado, mas vai do mesmo jeito e, aos trancos e barrancos, tenta desastradamente mudar o mundo.

Com duas horas e quarenta minutos de duração, One Battle After Another poderia ser cansativo, mas a produção tem uma energia fenomenal, que nunca diminui até sua conclusão catártica – e a direção soube aproveitar esse caos. O filme é absolutamente sério e sincero na maneira como retrata certas coisas, derivando humor do absurdo delirante das situações, sem fazer com que elas ultrapassem o verossímil e criando situações em que é preciso rir para não chorar. E tudo isso é acompanhado por uma direção visual impecável e uma ótima trilha sonora.

O elenco também está muito bom. Sean Penn é um dos antagonistas mais detestáveis que vi em um bom tempo. Também tenho que dar uma menção especial a Benicio Del Toro que, em sua silenciosa consternação e inesperada competência, é o parceiro perfeito para o personagem de DiCaprio. Chase Infiniti, mesmo cercada de grandes atores e atrizes, segura-se bem, fazendo com que sua metade do filme funcione. Assim, talvez meu maior desapontamento seja o próprio DiCaprio, que tem seus momentos de brilhantismo, mas não consegue ter o mesmo charme, parecendo confuso quase o tempo todo.

No geral, este é um grande filme de Paul Thomas Anderson e todos seus elementos funcionam; também é um começo bastante forte para a temporada de premiações deste ano. Suponho que não seja uma produção unanimemente aclamada justamente porque ela se arrisca a fazer comentários políticos, estando sujeita a escrutínio e deslizadas. 

Além disso, como o estilo narrativo é meio solto, o espectador sai do cinema sem muitas explicações, o que pode não agradar a todos. Mas, para quem gosta da filmografia do diretor e queria ver algo mais diferente em um mar de filmes que não tomam risco nenhum, One Battle After Another é um prato cheio.

Outras divagações:
Punch-Drunk Love
The Master
Inherent Vice
Phantom Thread
Licorice Pizza

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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