Divagações: 127 Hours

Juro que tentei evitar spoilers de 127 Hours . Queria ver o filme com toda a ignorância possível, afinal é muito melhor se surpreender com u...

Juro que tentei evitar spoilers de 127 Hours. Queria ver o filme com toda a ignorância possível, afinal é muito melhor se surpreender com uma boa trama do que ficar esperando por algo durante todo o filme. Infelizmente, como às vezes acontece com filme baseado em fatos reais, minha memória me traiu e acabei pescando todos os fatos ocorridos no agora longínquo ano de 2003. Porém, fico contente em dizer que, mesmo com a ausência de surpresas, o filme encanta e espanta do mesmo modo.

A propósito, peço desculpas aos que estão torcendo para Colin Firth nesse Oscar. Após fazer a devida comparação, James Franco, mesmo com poucas chances de vitória, supera o grande favorito da noite com sua capacidade de emocionar e encantar – não em técnica, pois Firth está indiscutivelmente incrível em The King’s Speech. Mas, para mim, Franco seria tão merecedor da honraria quanto o britânico.

Aron Ralston (James Franco) é um sujeito aventureiro e um tanto inconsequente, que foge de sua rotina diária para caminhar pela natureza e pelos cânions rochosos do interior americano. Lá, longe de tudo e de todos, ele sofre um acidente que o deixa preso e esperando por uma morte quase inevitável. Soa como uma história simples para você? Pois é exatamente isso. 127 Hours não está ligando muito para a complexidade dos fatos, mas sim para a maneira como eles são contados. Não há diálogos, personagens ou subtramas. Quer dizer, eles existem, mas são apenas o plano de fundo, representando motivações distantes para a luta desesperada de Ralston pela sua própria vida. Também são estopins para as suas descobertas e revelações interiores. Basicamente, tudo o que acontece em tela orbita em torno do personagem de Franco e de seus pensamentos, sufocados entre as rochas e a poeira.

É muito fácil cair no marasmo em um filme deste tipo, mas 127 Hours se esquiva do problema com perfeição. Em parte, muito disso se deve ao trabalho harmonioso da direção, fotografia e edição. Danny Boyle está impecável como sempre. Jon Harris, que deu um bom ritmo a filmes como Kick-Ass e Snatch, adiciona muito à narrativa e ao modo em que somos apresentados aos sentimentos do personagem. Além disso, a dupla formada por Anthony Dod Mantle (parceiro de Boyle em Slumdog Millionarie) e Enrique Chediak (que eu já havia elogiado na resenha de Charlie St. Cloud) tira leite de pedra (literalmente) ao transformar um corredor rochoso em um cenário cheio de beleza e propício a introspecção. Seria até pretensioso de minha parte dizer que este filme está mais para uma experiência de vivência do que para uma narração, pois ele consegue transportar você para o outro lado da tela, junto a Ralston, compartilhando todos os seus problemas. Você sente, sofre, e vibra junto com ele. E como sofre! Aqueles mais temerosos por quaisquer níveis de violência podem ficar tranquilos, pois, apesar de ter certas cenas fortes, o filme se esforça em ser subjetivo e pouco explícito, talvez por respeito à situação ou por temor de reações negativas.

O filme tem as suas falhas pontuais como não poderia deixar de ser. Talvez ele não seja tremendamente original, apresente novos conceitos ou seja tão polido quanto poderia ser – sobretudo em relação a trilha sonora desencontrada e nos efeitos visuais um pouco precários. Mas, sem dúvidas, isso não deprecia nem um pouco as suas qualidades. Como eu já disse, não adianta falar demais do filme porque não há realmente muito a ser dito. 127 Hours não é um filme para se ver enterrado na poltrona com um balde de pipoca, mas sim uma experiência para ser vivida e apreciada, por mais que isto às vezes signifique ter de sair da sua zona de conforto.


Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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