Divagações: The Artist
28.2.12
Muitos
projetos que exigem coragem – e ela se manifesta de diferentes formas. Agora
que o filme já ganhou cinco prêmios no Oscar, parece que todo mundo já falou
sobre a incrível ideia de The Artist. Mas faça um esforço e lembre como estava
o mundo há dois anos. Quando Avatar concorria em nove categorias, as pessoas
falavam apenas sobre o futuro em 3D e as novas tecnologias, com mundos
imaginários se transformando em reais e tudo se tornando possível através da
imersão possibilitada por uma tela do IMAX. Nessa realidade, onde se encaixa um
filme em mudo, em preto e branco e na proporção 4:3 (aquela da sua TV antiga,
de tubo). É incrível ver James Cameron fazendo Avatar, sempre mergulhando no novo e submergindo
para surpreender. Mas também é maravilhoso ver Michel Hazanavicius criar The Artist. Ele olhou para uma direção completamente diferente dos demais e fez
algo único com elementos que todos já conheciam tão bem que até haviam
esquecido como eram bons.
É
nessa nostalgia, nesse resgate, que surge The Artist. O filme conta a história
de George Valentin
(Jean Dujardin),
um ator de grande sucesso do cinema mudo. Bem sucedido, ele não acredita no
potencial do cinema falado até que é jogado para escanteio. Orgulhoso, ele
tenta resolver a situação apostando em sua antiga fama, mas só encontra mais
decadência. Ao mesmo tempo, uma antiga fã dele, Peppy Miller (Bérénice Bejo)
começa a crescer na carreira, algo que, de certa forma, é devido aos conselhos
do ídolo. Os dois são rodeados por figuras clichês de Hollywood, como a
coadjuvante invejosa (Missi Pyle), a esposa infeliz (Penelope Ann Miller),
o fiel motorista (James Cromwell), o produtor de cinema (John Goodman) e o cachorro
superinteligente (Uggie).
A
questão é que, nesse filme, não importa que os personagens sejam óbvios. É
preciso ver o que os atores fazem com eles – e são coisas fantásticas. O casal
de protagonistas (e não venham me dizer que Bérénice Bejo é coadjuvante!) é extremamente
expressivo e passa muita emoção em cada gesto. Enquanto Jean Dujardin vai do
cômico ao melodrama com facilidade e naturalidade, ela transforma uma jovem
sonhadora em uma mulher batalhadora antes que você perceba o que está acontecendo.
Essas transições são ainda auxiliadas por outros elementos como os figurinos e
cenários, que acabam relembrando diversos bons momentos da Hollywood da época.
Inclusive, é nessa atenção
aos detalhes (reparem na cena inicial e na sequencia de Bérénice Bejo com o
terno, são ótimas) que se percebe o quanto esse filme de origem francesa e
belga admira o cinema americano. A estrutura dos estúdios, a ascensão e queda
das estrelas, os ternos, os bigodes, os casacos e os cortes de cabelo. Obviamente,
muitos filmes já retrataram essa transição do cinema mudo para o falado e
alguns deles se tornaram clássicos, como Singin' in the Rain, por exemplo.
Ainda assim, The Artist é uma homenagem que nem os
americanos poderiam fazer ao seu próprio cinema, pois traz essa capacidade de
enxergar aquilo que está na frente do nariz, amando defeitos e qualidades.
Assim,
não é a toa que o filme foi bem recebido por onde passou. Ele transmite apenas
carinho e humildade; é uma mensagem contra o orgulho e a favor de soluções
criativas. Não dá para filmar em 3D e com cores exuberantes, que tal explorar o
preto e branco? Não dá para transmitir tudo em palavras, que tal uma piscadinha
capaz de dizer tudo? Para quem cansou de ver os mesmos filmes de sempre, The Artist relembra o que existe de tão bom no cinema. Parabéns para os artistas Michel Hazanavicius, Jean Dujardin, Bérénice Bejo e companhia!
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