Divagações: After Earth

Uma boa ficção científica é toda sobre conceitos e, frequentemente, o sucesso está em trabalhar sobre elementos únicos que se encaixam co...

Uma boa ficção científica é toda sobre conceitos e, frequentemente, o sucesso está em trabalhar sobre elementos únicos que se encaixam com visões de um futuro que acreditamos que podem ser reais. Por isso, esse é um campo tão fértil para experimentações e reflexões filosóficas. É claro que existem muitas obras do gênero que não se levam minimamente a sério, mas é muito fácil relevar todos os seus defeitos apenas pela própria tendência destes filmes em rirem de si mesmos.

Porém, desde o início, senti que After Earth não se enquadra exatamente em nenhum desses casos. Ou seja, acabei me colocando na complicada posição de julgar uma obra que aparentava se levar a sério sem levantar nenhum ponto de especial interesse, situando-se em uma perigosa zona cinzenta onde poucos filmes pareceram tirar bons resultados até hoje.

Na história, mais de um século se passou após a humanidade deixar o planeta Terra. Povoando as estrelas, os seres humanos, apesar de terem dominado a arte da sobrevivência, acabaram se defrontando com um predador inesperado, os Ursa – seres bestiais que, apesar de cegos, conseguem detectar suas presas através do medo.

Um dos heróis no combate a essas criaturas é Cypher Raige (Will Smith), um militar que volta ao lar após uma ausência prolongada. Ele, então, entra em conflito com seu filho, Kitai (Jaden Smith), um jovem rebelde que tenta a todo custo se provar para o seu pai, após anos se culpando pela morte da irmã, Senshi (Zoë Kravitz). Apoiado pela esposa, Faia (Sophie Okonedo), Cypher resolve levar Kitai junto com ele para uma viagem interplanetária de treinamento, no entanto, a nave sofre um grave acidente no espaço, fazendo com que os dois sejam lançados a um planeta hostil esquecido pelo homem, a própria Terra.

O que se nota a princípio é que o filme está mais interessado em trabalhar a relação de pai e filho do que em apresentar uma ambientação instigante. Não existe nada de errado com isso, porém, não sinto que a execução conseguiu dar densidade aos personagens a ponto disso ser o sustentáculo de todo filme. Jaden Smith não é exatamente um excelente ator e o papel de ‘militar durão’ dado a Will Smith também não dá espaço para que se desenvolva muita coisa em termos de dinâmica de personagens.

Além disso, as motivações e o senso de urgência são ridículos para qualquer um com conhecimento mínimo de ciência. Os próprios efeitos visuais que são essenciais para esse tipo de filme são bem fracos, sobretudo quando comparados a outras obras recentes, como Life of Pi, no que diz respeito a modelagem de animais, e Oblivion, que conseguia criar uma atmosfera convincente.

Assim, quem esperava mais surpresas e um trabalho mais aprofundado sobre o que aconteceu com a humanidade depois da Terra, como o título propõe, pode acabar se decepcionando. O roteiro e a direção também não empolgam, parecendo que M. Night Shyamalan emprestou seu nome para a produção ao invés de fazer alguma coisa efetivamente, dando mais combustível para quem já não gostava de seu trabalho.

Talvez After Earth funcione melhor se entendermos que ele mira no público infanto-juvenil e que, provavelmente, seja perfeitamente capaz de agradar a garotada. O filme é completamente modelado tendo em vista o contexto multimídia proposto por Will Smith, como apenas uma parte do conteúdo que se desdobrará em quadrinhos, livros e jogos. Porém, por mais que a estética de videogame e as escolhas de roteiro sustentem essa hipótese, sinto que a maneira como o filme apresenta esses elementos poderia ter sido bem melhor, agradando inclusive um público mais exigente.

No final das contas, After Earth é o tipo de obra facilmente dispensável e com pouquíssimo carisma próprio, o que é um pouco triste, considerando que muitos de nós gostaríamos de ver Will Smith fazendo novamente algo digno de nota. Aconselho os fãs de ficção científica que passem longe, exceto se tiverem de levar aquele seu sobrinho de 12 anos ao cinema, já que talvez ele consiga se empolgar bem mais com o filme do que você.


Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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