Divagações: Chatô, o Rei do Brasil

Um filme não fica pronto da noite para o dia. Mas também não é normal que uma produção só seja lançada 20 anos após o início das filmagen...

Um filme não fica pronto da noite para o dia. Mas também não é normal que uma produção só seja lançada 20 anos após o início das filmagens. Com muitas idas e vindas, cheguei a pensar que Chatô, o Rei do Brasil seria engavetado permanentemente e nunca chegaria oficialmente aos cinemas (confesso que gosto da piada de que esse filme é o Boyhood brasileiro). 

Felizmente, o longa-metragem escrito, dirigido e produzida por Guilherme Fontes está disponível – ainda que em um número pequeno de salas – e traz grandes nomes do cinema nacional em seus créditos, que inclui cinco in memoriam (sim, eu contei!).

Como jornalista, digo que os estudantes de comunicação podem ver o filme, mas é essencial que continuem lendo o livro. O roteiro de Guilherme Fontes, que também creditou Matthew Robbins (e dizem que Francis Ford Coppola ajudou), não tem o objetivo de dar a aula de história que a biografia de mais de 600 páginas consegue fazer com aparente facilidade.

Baseado no livro de Fernando Morais, Chatô, o Rei do Brasil não se preocupa em contar cronologicamente a vida de Assis Chateaubriand (Marco Ricca), o estudante de direito que se tornou jornalista, empresário e um dos homens mais influentes do Brasil. Ele foi dono dos Diários Associados, um verdadeiro império midiático que, em seu auge, contou com mais de cem jornais, além de revistas, emissoras de rádio e TV e uma agência telegráfica.

Misturando fatos e datas, a produção aposta no ponto de vista pouco confiável de um protagonista doente e confuso. Temos apenas um vislumbre de infância, não conseguimos entender muito bem os romances, mas o crescimento e o alcance da influência política não são discutíveis. Assim como sua personalidade é moralmente questionável.

Entre os personagens que rodeiam Chateaubriand estão a amante ficcional Vivi Sampaio (Andrea Beltrão), baseada em diversas mulheres influentes da época, mas especialmente em Aimée Soto-Maior de Sá; o fotógrafo ficcional Rosemberg (Gabriel Braga Nunes), inspirado no jornalista e empresário Samuel Wainer; Getúlio Vargas (Paulo Betti); suas ex-esposas (Letícia Sabatella e Leandra Leal); e suas ex-sogras (Zezé Polessa e Eliane Giardini).

Sabendo que é difícil para o público criar empatia com uma figura como seu protagonista, Chatô, o Rei do Brasil simplesmente não busca por isso. O filme alterna diversos momentos importantes da vida do magnata intercalando genialidades empresariais, um patrão autoritário, um marido machista, um poderoso descontrolado e outras facetas. Dá nojo, assusta e faz rir. Não dá respostas, mas traz muitas perguntas sobre a história do Brasil, os impérios de comunicação do país e as relações de poder estabelecidas.

Isso poderia não funcionar, mas Guilherme Fontes contou com um elenco competente e dedicado, além de uma edição que consegue controlar muito bem todo esse caos. Só posso imaginar, mas acredito que, para quem não conhece muito da história, alguns trechos possam ficar um pouco confusos e haja a estranha ideia de que tudo se resume a Era Vargas. Isso não atrapalha o impacto do filme em si, mas é sempre melhor buscar mais informações para conseguir uma compreensão mais profunda.

É triste que, depois de tanto esforço para chegar às telas, Chatô, o Rei do Brasil não se torne um grande sucesso de bilheteria. Esse é um filme muito mais para festivais e premiações que para as acirradas concorrências dos multiplexes. Ainda assim, é uma ótima opção para quem quer algo mais profundo antes da chegada dos filmes do próximo Oscar – com a vantagem de ser cinema nacional.

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2 recados

  1. Rê, o Marco Ricca está transcendental no papel?

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    1. Ele está muito bom, mas ainda não faço ideia do que seria uma atuação transcendental! Acho que preciso estudar mais o assunto. ;)

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