Divagações: Batman v Superman: Dawn of Justice

Para um filme de super-heróis, hoje em dia, não basta apenas ser bom. Tem que fazer franquia, abrir para spin-offs, vender brinquedo, ser ...

Para um filme de super-heróis, hoje em dia, não basta apenas ser bom. Tem que fazer franquia, abrir para spin-offs, vender brinquedo, ser fiel aos quadrinhos e render centenas de milhões de dólares no primeiro final de semana. A verdade é que esse filão se mostrou tão monstruosamente lucrativo que as expectativas se tornaram verdadeiramente inalcançáveis – e não há estúdio que não esteja correndo atrás da próxima grande tendência.

Depois de Man of Steel, a Warner e a DC Comics se colocaram em uma posição bastante complicada. A aposta de trazer Superman de volta não foi lá muito acertada, mas a empresa já colocava os carros na frente dos bois ao anunciar um universo cinemático aos moldes da concorrência com direito ao crossover que sairia antes que qualquer um dos demais heróis ter um filme solo. Arriscado? Com certeza. Eu era um daqueles bem céticos com o resultado, mas havia uma parte de mim muito esperançosa de que, finalmente, a DC colocaria seu portfólio de personagens em mãos competentes e os fãs de quadrinhos finalmente descansariam em paz.

Batman v Superman: Dawn of Justice é o primeiro resultado dessa aposta e, bem, é o tipo de filme que tende a dividir opiniões. Por um lado, é uma produção cheia de qualidades (muito superior a Man of Steel) e que cria uma base sólida para incursões futuras no mesmo universo. Porém, o filme ainda é incompleto cinematograficamente, deixando passar alguns pecados bastante graves em prol de uma narrativa com pretensões de grandiosidade.

Passado dois anos após os acontecimentos de Man of Steel, Batman v Superman: Dawn of Justice nos apresenta um Bruce Wayne (Ben Affleck) já velho e cansado, depois de vinte anos combatendo o crime e mais do que o seu quinhão de perdas nas costas. Do outro lado da baía de Metropolis, dividido entre sua persona de Clark Kent e de Superman (Henry Cavill), o homem mais forte do mundo passa seus dias tentando fazer o bem, seja salvando Lois Lane (Amy Adams) de grupos terroristas ou resgatando inocentes em uma enchente. Os dois acabam se colocando em choque quando Lex Luthor (Jesse Eisenberg), um cientista e empresário bilionário, põe as mãos em um mineral que seria capaz de enfraquecer os kriptonianos, levantando a questão se o homem de aço deveria ser capaz de agir sem nenhuma forma de controle.

Assim, são apresentados um subtexto interessante e um começo que traz bem essas questões do Superman como uma figura ao mesmo tempo messiânica e controversa – com direito a participação de Neil deGrasse Tyson, que no último ano virou arroz de festa em Hollywood. Mas, na realidade, o filme só quer arranjar um pretexto para que os heróis troquem algumas porradas e depois façam as pazes. Nem ao menos surpreende quando o inevitável confronto anunciado no título se inicia por uma bobagem e termina tão repentinamente quanto começou.

Não é que o conflito deixe de ser empolgante e visualmente impressionante, mas ele morre na praia por falta de desenvolvimento. Pior que isso, apenas a 'batalha final' com o vilão verdadeiro da trama, que é tudo que os fãs da DC esperavam ver no cinema, pelo menos naquele tom grandiloquente e maior que a vida que os quadrinhos da editora tendem a passar. Porém, tanto quanto é épico e grandioso, esse terceiro ato do filme joga a lógica para as alturas e deixa muito mais questões para trás do que é capaz de responder, desembocando em um desfecho que era possível de se enxergar chegando quilômetros antes – ainda mais porque não estamos falando de personagens B, mas das figuras mais conhecidas dos quadrinhos.

Para não dizerem que estou sendo chato demais, tenho que aplaudir o diretor Zack Snyder pela ótima transposição da linguagem dos quadrinhos para o cinema. Tal como fez com Watchmen, Batman v Superman: Dawn of Justice reconta com primazia sequências absolutamente icônicas da história da DC, sobretudo quando falamos desse novo Batman, que bebe diretamente do Cavaleiro das Trevas de Frank Miller, com esse homem-morcego mais bruto e atarracado, cínico pela idade e pelas decepções da vida.

Falando em Batman, quem torceu o nariz para Ben Affleck deve ter queimado a língua, já que ele é sem dúvida a melhor coisa do filme, mostrando uma faceta do herói que não é conhecida do grande público, mas que é bastante crível para esse universo. O Alfred de Jeremy Irons também tem essa pegada mais utilitarista, afastando-se da imagem de Michael Caine, mas sem perder a essência do personagem. Pena que esse tratamento não é dispensado a Lex Luthor que, apesar de ter boas cenas, não se tornou um vilão que amamos odiar, coisa que anda muito em falta nos filmes de super-heróis.

No final das contas, não sei se Batman v Superman: Dawn of Justice será aquele sucesso todo que a Warner queria. Ainda mais porque o filme custou uma fortuna e o cenário cinematográfico mudou um pouco nos últimos anos.

Mesmo assim, essa ainda é uma fundação forte do que está por vir. Apesar de todas as falhas e de um roteiro frágil, o filme ainda consegue deixar aquele gosto de quero mais, fazendo o espectador ter vontade de ver mais daqueles personagens e daquele mundo. As esperadas participações especiais dos personagens de Justice League, apesar de bem curtas, foram o suficiente para atiçar a minha curiosidade – e talvez o sonho de um universo cinemático da DC não esteja assim mais tão longe.

Outras divagações:
Man of Steel

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

RELACIONADOS

0 recados