Divagações: Small Things Like These

Small Things Like These
Algo me diz que Small Things Like These é um daqueles filmes que tiveram uma estratégia de lançamento pensada para conquistar um espacinho na temporada de premiações, porém, a campanha nunca decolou e ele passou praticamente esquecido pelos cinemas. Dá para entender por que isso aconteceu: em um ano de produções barulhentas e muito marketing, um longa-metragem mais introspectivo soa como algo “menor”.

Dirigido por Tim Mielants e baseado em um livro de Claire Keegan, o filme conta uma história passada em 1985 – mas vale dizer que a instituição retratada existiu entre 1922 e 1998. Bill Furlong (Cillian Murphy) é um homem simples, pai de cinco filhas e perfeitamente ciente de que sua posição levemente privilegiada se deve à caridade de uma benfeitora (Michelle Fairley), de modo que sempre tenta fazer o bem ao próximo.

Um dia, ao fazer uma entrega de carvão em um convento, ele é surpreendido com um pedido de ajuda vindo de Sarah (Zara Devlin), uma jovem grávida que está no local contra a sua vontade e que terá seu filho dado para adoção. Essa demonstração de que há algo de errado com o local faz com que Bill mergulhe em seu próprio passado e questione a forma como ele e as pessoas ao seu redor, incluindo sua esposa (Eileen Walsh), lidam com as atividades do convento, liderado pela irmã Mary (Emily Watson).

Com isso, Small Things Like These intercala dois momentos da vida de seu protagonista, justificando a origem das sensibilidades que o distanciam dos demais e o fazem parecer ser uma pessoa mais razoável (pelos padrões atuais) ante seus conterrâneos. Toda a narrativa é centrada neste personagem, em seu dilema ético/pessoal e em suas relações com as mulheres que o cercam (e eu talvez tenha me incomodado um bocado ao notar que um filme sobre mulheres tem um ponto de vista totalmente masculino).

Mas essa escolha – embora sirva como um bom veículo para Cillian Murphy mostrar do que é capaz – acaba distanciando o filme das Lavanderias de Madalena (ou Asilos de Madalena), que soam como um grande mistério para quem, como eu, não tinha conhecimento prévio sobre o tema. Fica claro o objetivo geral dessa instituição e seu caráter opressor, embora algo mais concreto sobre a crueldade envolvida seja deixado para a imaginação do espectador.

Em essência, Small Things Like These é um longa-metragem muito irlandês, repleto de olhares contemplativos, janelas embaçadas, ambientes cinzentos e, também, um forte senso de comunidade (sim, há ao menos uma sequência relevante no pub). Todo filmado em locações reais, o filme consegue trazer para a tela a ambientação trágica ligada a um povo que já passou por muita coisa e tem orgulho de sua história, mas que segue com um gosto amargo na boca, algo que aparece na relação das pessoas com o convento.

Dessa forma, ainda que seu papel de denunciar as crueldades feitas em nome da religião católica seja minimizado, a produção entrega um excelente estudo de personagem, devidamente acompanhado por atuações de alto calibre. Small Things Like These é um filme muito delicado e bem formulado, que explora tanto vulnerabilidades quanto a capacidade humana de ter empatia.

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