Divagações: Arrival

Em meio a tanta fantasia e ação, uma ficção científica séria é algo que aparece em Hollywood apenas ocasionalmente – e, quando aparece, ne...

Em meio a tanta fantasia e ação, uma ficção científica séria é algo que aparece em Hollywood apenas ocasionalmente – e, quando aparece, nem sempre é boa o suficiente para fazer valer a longa espera entre um título e outro. Arrival parecia ser uma aposta segura, com ótimos visuais, a direção firme do canadense Denis Villeneuve e uma história que, a despeito das comparações óbvias, ressoava um pouco do senso de fascínio com o espaço que Contact nos deu em meados da década de 1990.

Em Arrival, acompanhamos a história de Louise Banks (Amy Adams), uma linguista brilhante que se vê metida nos esforços do governo americano de decifrar a incompreensível linguagem de uma raça alienígena após o pouso de doze naves extraterrestres através do globo. Acompanhada pelo físico teórico Ian Donnelly (Jeremy Renner), a equipe de pesquisa tem de lidar com as tensões crescentes entre as diversas potências mundiais, o alarmismo da mídia e, é claro, a paranoia do governo sobre as intenções dos “visitantes”. Esses fatores acabam se somando para desencadear uma crise internacional que arrisca colocar em xeque não apenas a pesquisa de Louise, mas o destino da raça humana.

Como falei, o filme tem tudo para ser bom. A fotografia é interessante, com sequências realmente bonitas e instigantes; a trilha sonora de Jóhann Jóhannsson, apesar de muito experimental (com direito a muitos graves dissonantes e ruído ambiente), combina perfeitamente com a atmosfera do filme; e o elenco é bastante competente. Porém, Arrival peca por não ser interessante o bastante, algo que é completado por ritmo moroso e arrastado.

A trama avança a passos de tartaruga (exceto quando lhe é conveniente) e o desenvolvimento acontece de modo quase que arbitrário. Sabemos que existe um processo de aprendizado acontecendo, mas ele não é sentido e nem mostrado, o que tira a empolgação de ver a parte mais científica da coisa, que é justamente o esforço em estabelecer contato com uma raça alienígena. O restante é preenchido por um dramalhão forçado e descolado do resto da história. Quando as duas coisas finalmente convergem é por meio de um artifício narrativo que, embora seja interessante na teoria, é executado de modo tão forçado que só subtrai do conjunto da obra.

Tal qual como em Interstellar, existe um senso de auto importância e de grandeza que não combina com uma trama que é intimamente sobre a vulnerabilidade da raça humana em frente ao desconhecido – e sobre nossa incapacidade social de chegar a consensos. O tema não é bem trabalhado, sendo até mesmo evitado quando o filme usa uma espécie de destino predeterminado da humanidade como pretexto. No final, temos uma catarse que não fizemos por merecer, o que é definitivamente frustrante.

Até o bom elenco sofre com esses problemas de roteiro. O personagem de Jeremy Renner não faz quase nada como cientista e serve muito mais como um par romântico do que como alguém capaz de fazer a trama rolar. Forest Whitaker também está no filme, mas interpreta um militar tão genérico que qualquer um poderia assumir o papel. Já Amy Adams teve um pouco mais de sorte e apresenta mais nuances na interpretação, mas não convence como alguém genuinamente empolgada com o que pode ser a maior descoberta científica da história – mostrando apenas uma faceta da personagem.

Não posso dizer que Arrival é um filme ruim, mas ele tinha potencial para ser muito mais interessante. Ainda que alguns possam ver além dos defeitos mais óbvios e realmente curtir o filme, não imagino que um consenso será atingido, dividindo a opinião do público, tal como o já citado Interstellar. De todo modo, agora devemos apenas esperar que Denis Villeneuve tenha aprendido alguma coisa e que suas próximas incursões no gênero, com o malfadado Blade Runner 2049, sigam por um caminho um pouco diferente.

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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