Divagações: Moana

O conceito de ‘princesa da Disney’ mudou um bocado nos últimos anos. Os contos de fadas tradicionais não pareciam mais interessar às crian...

O conceito de ‘princesa da Disney’ mudou um bocado nos últimos anos. Os contos de fadas tradicionais não pareciam mais interessar às crianças – inclusive esteticamente –, ao mesmo tempo em que os pais passaram a questionar as mensagens que estavam sendo transmitidas para seus filhos. O caminho, a princípio, foi contar outro tipo de histórias, abrindo espaço para a crescente popularidade de estúdios como a Pixar, por exemplo. Mas, com isso, também se descobriu que a demanda por histórias engajantes emocionalmente continuava alta, o que levou a uma nova geração de princesas, mais independentes, determinadas e sem a obrigação de um interesse romântico. Se The Little Mermaid fosse feito hoje em dia, é bem mais provável que Ariel quisesse se transformar em humana para poder frequentar uma faculdade em vez de ser motivada pelo amor por alguém que ela nem conhece direito.

Com isso – e passando pelo sucesso comercial e de crítica de Frozen –, chegamos a Moana. O filme segue uma tradição da Disney em busca por uma diversidade em suas protagonistas. Só que, dessa vez, a importância de respeitar uma nova cultura e de trazer credibilidade para a produção foi efetivamente elevada. Afinal, pintar um rosto de traços europeus e simplesmente mudar o cenário acabaria voltando o público contra o estúdio. O mundo onde as princesas não precisam de príncipes é o mesmo onde a internet se abre para a voz de todos, deixando claro que representatividade é um assunto que não pode ser tratado com leviandade.

O que quero dizer com isso é que o elenco de dubladores foi pensado com bastante cuidado, assim como as lendas trazidas para a tela e outros conceitos relacionados com a cultura da Polinésia. Das tatuagens às canções, todos os detalhes foram resultantes de um trabalho de pesquisa intenso e que, segundo os diretores Ron Clements e John Musker, transformaram completamente a produção em comparação com as ideias iniciais.

A história, em resumo, envolve a jovem Moana (Auli'i Cravalho), que possui um desejo inexplicável de se aventurar pelo oceano. Sua ilha é cercada por um recife de corais e, a princípio, ninguém pode atravessar essa barreira. Tudo o que a comunidade precisa para viver é encontrado dentro desses limites e é do interesse do chefe Tui (Temuera Morrison), também pai da garota, que tudo continue assim. Mas há quem alimente sua vontade de conhecer o mar, como sua avó Tala (Rachel House), que conta histórias da mitologia polinésia para as crianças – e efetivamente acredita nelas.

Então, quando os cocos começam a apodrecer e os peixes a faltar, Moana decide que é hora de agir e mudar o final de um dos contos de sua avó. Ela parte em um barco e começa sua busca pelo semideus Maui (Dwayne Johnson) que, muitos anos atrás, roubou o coração de Te Fiti, a deusa responsável pela vida. Ele, contudo, não é uma personalidade fácil de lidar, possui um imenso ego e não acredita que uma menina como ela será capaz de resolver a situação, inclusive desmerecendo sua capacidade e sua motivação. Para completar, Maui está sem seu anzol mágico, o que exige uma parada adicional nos domínios do monstro Tamatoa (Jemaine Clement), um caranguejo gigante que coleciona tesouros.

Como aventura, Moana segue de forma bastante linear e sem muitas reviravoltas, tornando mais relevante os momentos em que realmente acontecem descobertas importantes. Além disso, o filme consegue trazer um bom número de canções sem prejudicar o andamento da história. Ou seja, a estrutura geral é irrepreensível, ainda que os adultos possam ficar levemente entediados pela falta de um subtexto voltado para eles, como acontece em Zootopia, por exemplo. Para mim, isso foi parcialmente compensado pela beleza da animação (não conseguia tirar os olhos daqueles cabelos!), que também incorporou técnicas mais tradicionais para a movimentação das tatuagens de Maui.

Vale acrescentar que a dublagem nacional deu conta do recado e manteve uma boa qualidade na versão mais amplamente distribuída nos cinemas nacionais. Ainda assim, recomendo o original para quem tiver curiosidade em ouvir Dwayne Johnson soltando a voz ou para quem quiser conferir o quão acertada foi a escolha da estreante Auli'i Cravalho para o papel.

Mesmo que seja bastante difícil alcançar o status de uma verdadeira ‘princesa Disney’, Moana é um passo acertado do estúdio, sendo um filme absolutamente adorável e que consegue se segurar como a principal produção para crianças desta temporada. O longa-metragem consegue equilibrar suas lições de moral e trazer uma protagonista condizente com sua idade, repleta de incertezas e medos, mas capaz de seguir em frente e com as motivações certas. Nada mais válido.

Outras divagações:
Hercules
The Princess and the Frog

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