Divagações: Faroeste Caboclo

Tem muita gente por aí que simplesmente não suporta Legião Urbana. Tudo bem, entendo perfeitamente as razões (melodias pobres e por aí vai...

Tem muita gente por aí que simplesmente não suporta Legião Urbana. Tudo bem, entendo perfeitamente as razões (melodias pobres e por aí vai, já ouvi várias). Mas eu cresci ouvindo essas canções e sempre achei as letras super bacanas. Também me perguntei um milhão de vezes quando transformariam Eduardo e Mônica e Faroeste Caboclo em filmes. Obviamente, eu não era a única com essa ideia (bem longe disso, aliás).

Com direção do estreante René Sampaio, Faroeste Caboclo se transformou em uma história contada por meio de imagens em 2013 – com direito a nomes famosos no elenco e tudo o mais. Contudo, o filme não era exatamente o que eu estava esperando.

Antes disso, dou um breve resumo da história. O filme acompanha o romance entre João de Santo Cristo (Fabrício Boliveira) e Maria Lúcia (Isis Valverde). Ele é um rapaz de origem pobre que tenta uma vida melhor em Brasília e seu único contato na cidade é um primo, Pablo (César Troncoso), que é traficante de drogas e oferece a ele suas primeiras oportunidades. Ela, por sua vez, é estudante de arquitetura e filha de um senador, Ney (Marcos Paulo). Assim, não demora para que o caminho de João se cruze tragicamente com o do playboy e traficante Jeremias (Felipe Abib).

Só para começar, ocorreram algumas adaptações bem estranhas nessa trama que descrevi. Embora sejam nove minutos de música, muita coisa simplesmente foi cortada nesse longa-metragem de 1h48min (e o fato de terem envelhecido a heroína é realmente o menor dos problemas). No lugar do sofrimento do povo brasileiro, da violência entranhada no cotidiano, dos problemas do sistema carcerário e de tantos outros grandes temas que poderiam ter sido levantados, Faroeste Caboclo se transformou em um drama digno da novela das seis.

Mas é claro que há boas intenções. O filme se foca especialmente na questão do preconceito racial e entrega diversas cenas bem cruéis no processo. Nesse processo, funciona bem a inclusão do personagem do policial corrupto Marco Aurélio (Antonio Calloni). Mas a violência acaba distanciada do público – especialmente em comparação com outras produções marcantes do cinema nacional – devido à opção pela narrativa em forma de tragédia romântica com narração em off (pois é!). 

De qualquer modo, a fotografia é caprichada e foi feito um esforço em trazer elementos da estética faroeste para a tela, inclusive com direito a um bom número de referências (visualmente, não dá para reclamar). Além disso, a personagem feminina ganhou profundidade, o que sempre é algo bem-vindo. E, para completar, o elenco consegue dar conta do recado – o que me faz pensar em todo o potencial dessa produção caso o roteiro fosse melhor e mais agressivo.

Também restou pouco do ritmo da canção propriamente dita. Essa, provavelmente, foi uma escolha intencional da direção, mas talvez não tenha sido a mais correta (ao menos quando o público potencial do filme é de fãs). A música que dá título à produção é tocada apenas nos créditos finais e não há muita coisa que lembre a banda, Renato Russo, o cenário musical de Brasília nos anos 1980 ou o período em que a história supostamente se passa (mas eu achei o fusca da protagonista um charme, preciso admitir).

Para um filme baseado em uma música, Faroeste Caboclo se esforçou demais em se afastar de suas origens. Ainda assim, fico feliz que uma produção como essa tenha efetivamente saído nos cinemas e ainda atraia a atenção do público. Essa é uma história que mora não apenas em uma canção (ou em um filme), mas no imaginário popular de uma geração, e que merece ser contada e recontada.

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