Divagações: Aquaman

Dentre os heróis mais famosos da DC , Aquaman é certamente o menos respeitado, sendo um constante alvo de piadas. Não é difícil de pensar...

Dentre os heróis mais famosos da DC, Aquaman é certamente o menos respeitado, sendo um constante alvo de piadas. Não é difícil de pensar no motivo, já que há toda uma geração que cresceu com a infame versão animada de Super Friends e não vê muita razão de ser em um herói cujos principais poderes são respirar debaixo d’água e falar com os peixes.

Porém, quando o tal ‘universo cinematográfico’ da DC foi anunciado, lá estava ele novamente: esperando por sua chance de nos provar o contrário. Isso é... Até que a promessa de filmes capazes de enfrentar a Marvel morreu na praia, quando cresceu a dúvida se Aquaman vingaria ou se acabaria esquecido que nem outros por aí.

Pessoalmente, fico feliz que James Wan tenha persistido na ideia e, mais ainda, convencido o estúdio a dar o orçamento necessário para tornar esse filme realidade, mesmo depois dos resultados decepcionantes das outras empreitadas da DC. Afinal, Aquaman é muito melhor do ele tem o direito de ser.

Bebendo diretamente da fonte da versão do herói vista no relançamento The New 52 (escrita por Geoff Johns, que também assina o roteiro do filme), Aquaman é um misto de filme de origem e de aventura solo, com uma história que se passa depois dos acontecimentos de Justice League. Aqui, descobrimos um pouco mais sobre a infância de Arthur Curry (Jason Momoa) e a sua história.

Filho de um faroleiro humano (Temuera Morrison) e de uma rainha de Atlântida (Nicole Kidman), Arthur sempre foi atormentado por sua origem mestiça. Porém, quando seu meio-irmão Orm (Patrick Wilson) busca chegar ao trono para travar uma guerra contra a superfície, cabe a Arthur encarar o passado e tentar impedir um conflito entre os dois mundos.

Nesse ponto, o filme assume muito mais o formato de aventura – como um Indiana Jones –, como um filme padrão de super-herói. Arthur cruza o mundo em busca do lendário tridente do rei Atlan para provar seu direito ao trono e, no caminho, conta com a ajuda de Mera (Amber Heard) e do vizir Vulko (Willem Dafoe), com uma participação bastante interessante do vilão Black Manta (Yahya Abdul-Mateen II). Inclusive, vale dizer que, apesar de ser pouco explorado, ele tem uma motivação interessante e um visual cem porcento fiel aos quadrinhos.

Na realidade, o filme inteiro se beneficia da falta de vergonha em assumir suas origens nos gibis. É tudo exagerado, carnavalesco e nada apologético, sem o clima escuro, cinza e modorrento que estávamos vendo na geração Zack Snyder. Atlântida é brilhante, colorida e imaginativa, com todo o tipo de criatura bizarra – de homens-caranguejo a dinossauros, passando até mesmo por um protótipo de Godzilla. Os uniformes e as roupas também remetem muito aos quadrinhos, sem medo capacetes esquisitos ou de cores mais berrantes. Até mesmo a famosa cota de malha laranja do Aquaman dá suas caras e – sabe o que é pior? – ela funciona perfeitamente em meio a essa loucura toda.

O paralelo mais fácil de se traçar é que Aquaman é o Thor do universo DC, com uma pegada mais fantástica e um protagonista mais bem-humorado, mas sem deixar de ter seus momentos shakespearianos ou seus dramas reais. Jason Momoa está ótimo e consegue dar carisma ao personagem sem deixa-lo com uma nota só. Amber Heard, mesmo com escolhas questionáveis de figurino, também se sobressai bastante e apresenta uma Mera que não deve em nada aos poderes do Aquaman, e nem mesmo o romancezinho forçado estraga a personagem. Mas o que surpreende mesmo é que todos os personagens, de heróis a vilões, têm lá suas motivações, por mais básicas que sejam, tornando tudo bem mais amarrado do que eu esperava de início.

A ação é igualmente sólida, com direito a todos aqueles famosos momentos de câmera lenta que remetem ao trabalho de Snyder (mas sem muitos de seus vícios), além de uma coreografia dinâmica e de Momoa apresentando uma fisicalidade que dá peso aos combates, algo que outros atores não têm. O universo embaixo d’água ainda propicia cenas muito interessantes, quando Wan brinca com a perspectiva mutável de uma situação em que não existe necessariamente para baixo e para cima. Isso coloca ainda mais camadas de inventividade em um filme que poderia muito bem ficar só no feijão com arroz.

Admito que não esperava nada de Aquaman, ainda mais depois de sua participação dispensável em Justice League. Felizmente, esse filme me provou errado, justamente porque fez algo que raramente os filmes de heróis fazem, que é abraçar com força a origem nos quadrinhos e todos os exageros deliciosos da mídia que os estúdios parecem ter vergonha de mostrar. Ainda que Aquaman não seja uma obra prima, é um filme pipoca excelente e que também pode ajudar a definir os rumos do universo DC. Pela primeira vez nessa corrida, vejo uma produção do estúdio dando um passo a frente e fazendo algo de único, conseguindo ser ao mesmo tempo divertida e muito diferente da fórmula Marvel.

Outras divagações:
Man of Steel
Batman v Superman: Dawn of Justice
Suicide Squad
Wonder Woman
Justice League

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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