Divagações: Escape from Pretoria

Filmes que contam histórias de fugas de prisões possuem um dilema interessante em mãos. Eles podem focar na prisão e nos riscos de sair dela...

Escape from Pretoria
Filmes que contam histórias de fugas de prisões possuem um dilema interessante em mãos. Eles podem focar na prisão e nos riscos de sair dela (o que inclui a possibilidade de que o plano possa dar errado), nos personagens (normalmente obsessivos e inteligentes, embora frequentemente meio transtornados) ou no plano em si (quase como em um filme de roubo/golpe, com destaque para as estratégias mirabolantes). Além disso, quando a produção se baseia em acontecimentos reais, também é preciso lidar com o retrato do prisioneiro em si (se ele for inocente, sempre é melhor).

Em Escape from Pretoria, os potenciais fugitivos são Tim Jenkin (Daniel Radcliffe), Stephen Lee (Daniel Webber) e Leonard Fontaine (Mark Leonard Winter) – este último, uma construção fictícia, baseada em mais de uma pessoa. Eles estão atrás das grades por discordarem do regime de segregação racial existente na África do Sul, o apartheid, e querem sair da prisão justamente para poderem continuar com sua luta. Ou seja, o caráter dos personagens e suas motivações são questões praticamente intocáveis; o público imediatamente está (ou deveria estar) do lado deles.

E o filme não perde tempo em deixar claro que, desde o julgamento, eles já estão se preparando para escapar. Além disso, o sucesso dessa empreitada também parece ser certo (eu não conhecia a história de antemão, mas nunca cheguei a duvidar). A grande questão é: como eles vão fazer isso.

Assim, para criar tensão, a produção de Escape from Pretoria optou por misturar o enfoque nos riscos (basicamente, morrer) e no plano. O problema é que a estratégia elaborada é bastante meticulosa, mas não exatamente algo de outro mundo. Desta forma, acompanhamos os personagens serem extremamente cautelosos com cada passo, conferindo e reconferindo o plano e testando todas as possibilidades. O resultado é sem dúvida realístico, mas acaba não sendo muito empolgante.

Sob certos aspectos, o roteirista e diretor Francis Annan opta por trabalhar com pequenas situações de perigo, que seguem ao longo de todo o filme. Estas sequências não exatamente criam uma crescente em direção ao grande momento, mas funcionam para manter o espectador atento – afinal, mesmo acreditando que a fuga dará certo, isso não quer dizer que não haverá complicações adicionais até lá.

Outro aspecto que chama a atenção em Escape from Pretoria é que, ainda que esteja muito bem guardada, esta prisão fica no meio da cidade e não possui câmeras de segurança, algo que nos acostumamos a ver no gênero. Então, a fuga parece ser relativamente simples. Obviamente, esse não é o caso e sinto que a produção poderia fazer um esforço maior para ter deixado a dificuldade mais clara. Ao mesmo tempo, o retrato dos guardas como funcionários cumprindo seu dever e crentes no sistema me parece adequado (e, sim, eles são mostrados pessoas péssimas, ainda que não como “vilões”).

Para completar, foi feita a escolha de não focar demais no aspecto político dos personagens, embora seja colocada uma oposição na figura de outro preso político, Denis Goldberg (Ian Hart). Com isso, o longa-metragem coloca uma mensagem estranha em relação aos que optaram por se manterem “inocentes” aos olhos da lei ao cumprirem a pena dada por um regime com o qual não concordam.

De qualquer modo, Escape from Pretoria, por mais que não seja o filme mais empolgante (ou eficiente) do gênero, é fiel ao ponto de vista que escolheu e conta sua história com habilidade e tanta precisão quanto possível. Afinal, a produção é baseada em um livro de Tim Jenkin e o ativista esteve presente durante as filmagens. O resultado é fruto dessa prioridade.

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