Divagações: Love and Death

Esqueça os títulos mais famosos do diretor. Love and Death expressa melhor que qualquer um deles o quão brilhante é o humor de Woody All...

Esqueça os títulos mais famosos do diretor. Love and Death expressa melhor que qualquer um deles o quão brilhante é o humor de Woody Allen. Por mais que algumas pessoas possam considerar o retrato apresentado do povo russo como uma junção de preconceitos, não dá para negar que esse é um bom retrato da visão ‘externa’ que costumamos ter. Como não há o objetivo de ofender ninguém, suponho que isso sempre possa ser interpretado como uma divertida homenagem.

A história se passa na época da Rússia czarista. Boris Grushenko (Allen) é o mais novo – e o menos brilhante – de três irmãos em uma típica família do país. Ele está apaixonado por sua prima, Sonja (Diane Keaton), mas ela tem outros interesses. O drama romântico entre os dois, contudo, é interrompido pelo início dos avanços bélicos de Napoléon Bonaparte (James Tolkan). Em pouco tempo, Boris passa do mais covarde soldado do exército russo a herói de guerra, até se envolver em uma conspiração para assassinar o imperador francês.

Toda a envolvente trama é intercalada com algumas das mais espertas frases do cineasta, que aproveita para fazer todo o tipo de tiradas envolvendo comunismo, preceitos filosóficos, aspectos culturais do país, relacionamentos, sexo, boas maneiras e, claro, morte. O texto é tão rápido que o absurdo é dito como algo corriqueiro e é preciso estar atento para não se perder nada.

Além disso, para mim, que adoro literatura russa (não sou uma especialista e nem estou perto disso, mas posso dizer que sou uma entusiasta), as diversas referências Liev Tolstói, Fiódor Dostoiévski e Vladimir Nabokov foram muito bem-vindas. Dá até vontade de conhecer mais sobre a filosofia e o cinema produzidos no país para poder entender melhor as construções narrativas do filme. Afinal, fica bem claro de que nada em Love and Death é em vão.

Mas nem só de russos vive a produção. A influência do sueco Ingmar Bergman é claramente perceptível em algumas sequências (especialmente ao final). O resultado dessa junção é particularmente interessante e combina com os devaneios filosóficos e religiosos dos protagonistas.

Para completar, vale ainda acrescentar que Love and Death foi filmado na França e na Hungria e teve uma grande equipe de apoio francesa e belga. Para Woody Allen, que fala apenas inglês, isso representou muitas dificuldades – tanto que o diretor demorou 20 anos para voltar a filmar fora de Nova York.

Embora isso talvez seja um empecilho para algumas pessoas, acredito que o aspecto quase ‘caseiro’ de algumas sequências apenas ajudem a ampliar o efeito cômico. As batalhas, particularmente, têm um visual bastante amador, o que combina não apenas com o humor da produção, mas com a própria situação de uma guerra inesperada e de poucos armamentos (estamos falando da Rússia czarista, afinal de contas). Esse aspecto barato dos primeiros filmes de Allen também tem relação com seu estilo ágil de fazer cinema, dando preferência para os personagens e o andamento da história em detrimento de detalhamentos de cenários e contextos históricos.

Assim sendo, Love and Death é uma verdadeira jornada pela interpretação que Woody Allen faz de uma Rússia tradicionalista e nacionalista. Acompanhar seus passos é rir a cada novo tropeço, mas torcer para que ele continue levantando.

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