Divagações: Ginger & Rosa

Quase um romance, quase uma história sobre amadurecimento, quase um filme sobre a Guerra Fria. Ginger & Rosa é um pouco de tudo isso,...

Quase um romance, quase uma história sobre amadurecimento, quase um filme sobre a Guerra Fria. Ginger & Rosa é um pouco de tudo isso, mas seu enfoque maior está no fim de uma amizade que, para suas protagonistas, tem o impacto emocional de um armagedom. Mas também não é um filme sobre adolescentes imaturas fazendo bobagens e, de algum modo, aprendendo com elas. Esse é um drama para ser levado a sério.

A história acompanha duas meninas, nascidas na Inglaterra no dia em que os Estados Unidos jogaram a bomba atômica em Hiroshima. As mães são amigas e, já na infância, elas se tornam inseparáveis. Ambas vivem com pais ausentes. Em um caso, ele abandonou a família quando ela ainda era uma criança. No outro, ele é um professor universitário que trabalha muito e é distante emocionalmente, ainda que objeto de intensa admiração. Aos 17 anos, contudo, as duas começam a ter prioridades diferentes na vida. O amadurecimento as afasta e, inesperadamente, as coloca em confronto.

As amigas, como o título já indica, são Ginger (Elle Fanning) e Rosa (Alice Englert). Elas gostam de curtir a vida e não estão nem aí para o que os adultos pensam. Pegam carona com estranhos por aí, aprontam tudo o que duas adolescentes têm direito e talvez um pouco mais. Mas, enquanto Ginger começa a ler autoras feministas e a se preocupar com a possibilidade de uma guerra nuclear, Rosa está mais concentrada em seu despertar sexual. A princípio, não há nada demais nessa divisão de interesses, mas as coisas começam a ficar estranhas entre as duas, especialmente quando fica claro que ambas buscam a aprovação do mesmo homem.

Ginger quer ser admirada e respeitada por seu pai, Roland (Alessandro Nivola). Já Rosa percebe olhares cheios de interesse e resolve buscá-lo com carinhos. Sem saber traçar uma linha, ambas passam dos limites convencionais esperados para meninas com tais ambições. Nenhuma delas se define pela relação com Roland, mas ambas ficam desbalanceadas pela falta da companheira de toda a vida e, ao mesmo tempo, elas se afastam de suas mães (Christina Hendricks e Jodhi May). Ginger começa a sofrer demais com os riscos da bomba, com os protestos, com a falta de atenção à sua voz. Rosa quer pular fases da vida e busca uma segurança familiar com alguém que não pode dar isso a ela. Ginger está prestes a abandonar a família que Rosa tanto busca, enquanto Rosa quer o fim da liberdade e do descomprometimento que Ginger parece já ter perdido.

Ao dar caminhos tão diversos e sofridos para o amadurecimento de suas duas protagonistas, a diretora Sally Potter trabalha o feminino a partir de carências e inseguranças comuns a adolescentes, mas intensificadas pelas circunstâncias. As duas jovens não são desequilibradas, loucas ou malvadas. Mas elas têm uma boa dose de ingenuidade e é maravilhoso que seja assim (inclusive, a escalação de Elle Fanning, aos 13 anos, para interpretar uma jovem de 17 é perfeita nesse sentido). São meninas descobrindo o mundo a seu modo – e dando com a cara na parede de uma forma espetacular. Não que sofrer seja bom ou ‘interessante’, mas o que vemos na tela são dois caminhos. Ambos levam ao crescimento de uma forma tortuosa e é isso que gera o drama, não a ‘natureza feminina’, mas a falta de empatia de uma sociedade onde pais e filhos são pessoas estranhas e desconectadas, onde não se sabe se haverá um amanhã.

Ginger & Rosa não é um filme feliz. Mas esse também não é um drama feito estratégica para levar lágrimas aos olhos dos espectadores – ele é feito para causar reflexão. Assim como as duas protagonistas da história, a produção tem suas ambições de ir além. Ela busca carinho, sim, mas também quer ser admirada por suas ideias e por trazer algo de novo. Ginger & Rosa é Ginger e Rosa ao mesmo tempo.

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