Divagações: Shazam!

Ah, como o mundo dá voltas. A Warner e a DC , que outrora investiu pesadamente em um universo de heróis sombrio, denso e violento tem ach...

Ah, como o mundo dá voltas. A Warner e a DC, que outrora investiu pesadamente em um universo de heróis sombrio, denso e violento tem achado sucesso justamente ao abnegar completamente a visão de Zack Snyder para a franquia e abraçar tons mais afáveis e despretensiosos. Isso gerou a estranha situação de me fazer acreditar que a DC tem acertado mais a mão do que a Marvel em seus últimos títulos.

Aliás, se Aquaman já tinha sido a epopeia exagerada que os filmes baseados quadrinhos estavam devendo a tempo, Shazam! é simplesmente o filme com mais “coração” entre dezenas de produções com brutamontes de uniforme e toneladas de CGI. Realizando o complicado feito de balancear um humor que apela para todas as idades com momentos genuínos de emoção, a produção é empolgante, divertida e, talvez, uma das visões mais humanas de um super-herói dentro de grandes franquias. Além disso, o filme sabe muito bem o que escolher dos quadrinhos originais do personagem e mantém o senso lúdico sem cair na galhofa completa.

Shazam! acompanha o órfão Billy Batson (Asher Angel), um adolescente que recebe uma última chance com uma nova família depois de anos fugindo de pais adotivos. Levado por um casal para um lar comunitário com outras seis crianças, ele não se adequa muito a nova vida, preferindo continuar a busca pela mãe desaparecida. Mas as coisas mudam completamente quando Billy é levado à presença de um mago, Shazam (Djimon Hounsou), que transfere a ele seus poderes – e seu nome –, em uma tentativa desesperada de deter o Dr. Thaddeus Sivana (Mark Strong), um homem obcecado em manipular energias arcanas e que já teve um encontro com Shazam décadas antes.

A experiência transforma Billy em uma forma adulta e poderosa (interpretada por Zachary Levi) e, para completar, o coloca em contato com Freddy Freeman (Jack Dylan Grazer), outra das crianças acolhidas na casa. Juntos, os dois vão aprendendo a controlar os poderes de Shazam e, eventualmente, a como enfrentar Sivana.

Asher Angel e Jack Dylan Grazer estão excelentes e têm uma ótima química, passando bem a imaturidade e a empolgação de dois jovens que se deparam com todo esse universo desconhecido sem pensar demais a respeito. Zachary Levi é também uma ótima escolha, dando a credibilidade necessária para essa trinca central funcionar, em uma atuação bem inspirada em Tom Hanks nos tempos Big (com direito a uma ou duas referências indiretas). Mark Strong também é um vilão interessante e, apesar de um pouco raso em suas motivações, tem lá o seu gravitas e está bem à frente dos bonecões de CGI que assombram a indústria.

Vou dizer que não levava muita fé no trabalho do diretor David Sandberg, um ilustre desconhecido com uma filmografia bastante deficitária para os padrões da indústria, mas ele se segura bem – por mais que o longa-metragem não seja muito inspirado tecnicamente, sendo o mais “básico” dos filmes da DC por uma grande margem. Ainda assim, essa simplicidade funciona, justamente porque a produção é mais emotiva e menos grandiosa. Shazam! é menos sobre salvar o mundo e mais sobre personagens ordinários na Filadélfia, que nem é lá uma cidade tão relevante assim.

Inspirado na versão dos Novos 52 do personagem, o filme não é uma história de herói tradicional, focando mais no caráter humano da coisa: da relação de Billy com sua família (tanto a biológica quanto a adotiva) até sua relutância em aceitar que não precisa fazer tudo sozinho, passando pela necessidade de deixar o cinismo de lado e aprender a lidar com as pessoas a sua volta.

Com isso, vemos o menino passar de um adolescente imaturo que lida com esses poderes incríveis de forma totalmente irresponsável para ser alguém digno deles. É uma jornada do herói redonda e absolutamente satisfatória e que, de lambuja, consegue trazer elementos que eu nunca imaginei que funcionariam em um filme do herói para as telas de cinema. Soma-se a isso a boa mensagem de que uma família vai além daqueles ligados por parentesco.

Mas o filme não é exatamente profundo, nem revolucionário; não há um subtexto particularmente sutil ou um marco para o tema. Ainda assim, não dá pra dizer que o longa-metragem não é bastante genuíno em suas pretensões, pois ele consegue acertar na mosca ao trazer mais humanidade para um universo que desesperadamente precisava dela.

Inclusive, é até mesmo engraçado tentar situar Shazam! no mesmo universo de seus companheiros de estúdio (coisa que ele faz com algumas menções sutis e outras nem tanto), tamanha a dissonância. Mas se a nova fase – menos pretensiosa e mais descompromissada – da DC está trazendo filmes assim, bem, estou mais do que satisfeito em ver o que vem pela frente e dar o meu voto de confiança. Afinal, em breve teremos Joker e a versão de James Gunn para The Suicide Squad. Finalmente o estúdio parece estar dando a volta por cima.

Outras divagações:
Man of Steel
Batman v Superman: Dawn of Justice
Suicide Squad
Wonder Woman
Justice League
Aquaman

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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