Divagações: Barbie

Fazia um tempo considerável em que eu não me empolgava com um filme – e um ainda maior em que tal longa-metragem era capaz de atender minhas...

Barbie
Fazia um tempo considerável em que eu não me empolgava com um filme – e um ainda maior em que tal longa-metragem era capaz de atender minhas expectativas (ou superá-las). Então, já peço desculpas de antemão caso essa resenha esteja um tanto “deslumbrada”. Mas não posso negar que é assim que eu me sinto. Desde que saí da sessão de Barbie, tudo o que eu quero é conversar sobre o que vi e relembrar sequências.

Para começar, gostaria de comentar a perspicaz escolha de Greta Gerwig para dirigir a produção (e escrever o roteiro, ao lado de Noah Baumbach). Afinal, a presença de uma cineasta conectada com o momento e que já entregou obras bastante interessantes sobre o papel da mulher na nossa sociedade deixa uma marca. Mesmo sendo uma comédia cheia de exageros e repleta de referências à boneca e sua longa história, a produção é um comentário sobre o mundo em que vivemos, os ideais que nos rodeiam (de beleza, de relacionamento, de carreira, de conquistas, de vida) e, sim, o papel do patriarcado nisso tudo.

Barbie acompanha uma versão padrão da famosa boneca (Margot Robbie). Ela é branca, loira, magra, bonita e mora em uma casa dos sonhos. Ao seu redor, moram diversas outras Barbies, cada uma com sua carreira, suas características e suas casas. Todos os dias, ela e suas xarás se vestem com algo bonito e se alimentam de comidas imaginárias. Além disso, Barbie também costuma ir à praia, onde encontra com Ken (Ryan Gosling) e observa as tentativas dele para chamar a sua atenção. Para fechar o dia, nada como uma festa com as amigas.

O problema é quando Barbie começa a ter pensamentos estranhos, que não são apropriados para uma boneca. Como todos são perfeitamente cientes de que suas vidas fantásticas existem porque há crianças reais, uma outra Barbie (Kate McKinnon) sugere que a versão padrão vá ao mundo real, onde ela deve encontrar com a menina que brinca com ela, Sasha (Ariana Greenblatt). Coincidentemente, a mãe da garota, Gloria (America Ferrera), trabalha como secretária do CEO da Mattel (Will Ferrell).

A visita ao mundo real e o colapso entre esses dois mundos é o que torna Barbie um filme interessante. Obviamente, há a piada sobre a presença de uma boneca viva e em tamanho humano descobrindo a cidade grande, mas ela não passa disso. A história em si envolve a jornada de Barbie, Sasha e Gloria rumo a um entendimento e a uma reaproximação entre mãe e filha, mas com uma grande pedra no caminho: uma “revolução patriarcal” com direito a episódios de misoginia e até lavagem cerebral.

Mas não se assuste. Esta é uma produção que consegue falar sobre questões sérias fazendo rir o tempo todo. Seja com Margot Robbie se movendo com as limitações de uma boneca ou seja por meio de um texto esperto, o longa-metragem não deixa a bola cair. Sob todos os aspectos, ele se constrói sobre situações exageradas e tudo é levado ao limite. É engraçado porque é um retrato absurdo de algo bem real.

Além disso, o visual é exatamente o que você quer encontrar em um filme como esse: um mundo de plástico, com uma praia de ondas falsas, casas sem a quarta parede, armários com um interior de adesivo e tudo o mais. Os figurinos, obviamente, também são cuidadosamente pensados, fazendo referências a bonecas que foram comercializadas, escancarando todas as profissões e ajudando a contar a história. Isso sem contar as divertidas menções a todos os produtos relacionados a este universo, incluindo os descontinuados.

Outra camada de diversão está no elenco cheio de participações especiais. O núcleo principal ainda é composto por Simu Liu, Michael Cera, Rhea Perlman, Issa Rae e Helen Mirren (como narradora); também há uma presença marcante de atores que saíram do elenco de Sex Education, como Emma Mackey (uma escolha esperta, já que ela se parece com Robbie), Ncuti Gatwa e Connor Swindells; isso sem contar Nicola Coughlan, John Cena, Dua Lipa, Alexandra Shipp e por aí vai.

Na prática, a escolha de fazer Barbie como um filme para adultos, com aposta na nostalgia e em um humor atual funciona muito bem – e faz sentido, afinal, não está fácil financeiramente levar a criançada ao cinema. Eu me questiono sobre como a produção deve “envelhecer”, mas suponho que boa parte de seus questionamentos devem resistir ao tempo. Por ora, de qualquer modo, é uma ótima pedida para um programa com as amigas.

Outras divagações:
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