Divagações: Beetlejuice Beetlejuice

Beetlejuice é uma daquelas obras icônicas dos anos 1980 que seguiu um caminho difícil de compreender. Apesar do humor grotesco e questionáv...

Beetlejuice Beetlejuice
Beetlejuice é uma daquelas obras icônicas dos anos 1980 que seguiu um caminho difícil de compreender. Apesar do humor grotesco e questionável, tornou-se um desenho animado e se manteve na consciência popular, a ponto de recentemente ganhar um musical bastante elogiado. O que a produção não havia recebido durante todo esse tempo, porém, era uma continuação.

Convenhamos que o próprio Tim Burton passou por sérias idas e vindas em sua filmografia recente, encontrando uma espécie de “redenção surpresa” fora dos cinemas, o que talvez o tenha ajudado a sair da fase de filmes criticamente “mornos”. Além disso, com o retorno de Michael Keaton aos holofotes, uma continuação para Beetlejuice talvez tenha passado a fazer mais sentido.

Mais de 30 anos após o filme anterior, uma situação bem distinta está em jogo em Beetlejuice Beetlejuice. Lydia Deetz (Winona Ryder) encontrou sucesso em sua carreira como médium e apresentadora de televisão, mas agora enfrenta o desprezo da filha, Astrid (Jenna Ortega). A relação entre as duas desandou depos da morte do pai da garota e só piorou após a chegada de Rory (Justin Theroux), o novo namorado de Lydia.

Após o repentino falecimento do pai da própria Lydia, as várias gerações dos Deetz se reúnem novamente em Winter River para lidar com a perda. Mas o local continua sendo assombrado por Beetlejuice (Michael Keaton), que também se vê em uma complicada situação no mundo dos mortos devido ao retorno da sua ex-esposa Delores (Monica Bellucci), que busca vingança.

Escrever essa sinopse foi um exercício complicado. A verdade é que Beetlejuice Beetlejuice tem uma trama rocambolesca, que parece mais com uma série de vinhetas do que com uma história coesa e que ruma em direção a uma conclusão emocional. Em certo momento, a personagem de Ortega exclama que “o pós-vida é muito aleatório” – e sou obrigado a concordar.

Ainda que o filme original tenha este mesmo “problema”, ele não era acorrentado pela necessidade de fazer referências a uma obra anterior ou pelo senso de nostalgia. Isso, aliás, muitas vezes torna transforma a trama central deste novo filme em algo completamente sem foco, que não vai a lugar algum.

Porém, não acho que estamos aqui necessariamente pela trama principal – o objetivo maior é justamente ver todas as situações estranhas envolvendo o titular espectro. Neste sentido, Keaton talvez tenha entregado uma versão menos problemática do personagem, mas sem perder o charme bizarro pelo qual ele era conhecido. Fazendo caras e bocas, ele ajuda a entregar uma comédia genuinamente engraçada, especialmente por ser acompanhada de uma série de piadas visuais muito caprichadas.

Em vez de apelar para o excesso de computação gráfica, que serve como atalho para produzir resultados rápidos, o filme tenta, sempre que possível, usar efeitos práticos. Por meio de bonecos, maquiagem, stop motion e cenários montados, a produção se torna extremamente charmosa e denota um carinho e um esforço por parte da equipe – ainda mais quando tudo isso é acompanhado pela trilha de Danny Elfman, que continua fantástica.

Ainda assim, é difícil não lamentar o potencial não realizado do filme. Tanto Ryder quanto Keaton têm bem menos espaço para mostrar seus talentos do que eu esperava (sinceramente, como o personagem-título, Beetlejuice passa tempo demais ausente da história). Por sua vez, Monica Bellucci deve ter, no máximo, uma dúzia de falas no filme.

Ou seja, passamos a trama esperando por uma resolução daquela história que não chega a lugar algum, facilmente suplantada por coadjuvantes como Willem Dafoe e Catherine O'Hara, que tiveram bem menos espaço no material promocional. Se você gosta de Jenna Ortega, talvez seja mais bem servido, mas pessoalmente não acho que ela tenha calibre para carregar uma obra dessas como protagonista (ainda que também não atrapalhe).

Em uma época em que a nostalgia se tornou uma desculpa fácil para lançar filmes criativamente falidos, Beetlejuice Beetlejuice faz esforço suficiente para passar ileso pelo crivo crítico mais básico. Obviamente, este poderia ser um filme melhor caso se esforçasse para dizer ou expressar algo, em vez de ser uma coleção meio desconexa de ideias que devem parecer legais para Tim Burton e sua equipe de roteiro.

A produção fez uma tentativa sincera de recapturar o charme do original e, por mais que não tenha acertado na mosca, o resultado é perfeitamente palatável e serve como uma comédia de grande orçamento, algo que anda meio sumido. Eu não poderia dizer que Beetlejuice Beetlejuice é imperdível ou que vai ser tão icônico quanto seu antecessor, mas ele não é constrangedor, o que talvez já seja o suficiente.

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

Outras divagações:
Alice in Wonderland
Dark Shadows
Frankenweenie
Big Eyes
Miss Peregrine's Home for Peculiar Children

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