Divagações: Promising Young Woman

Histórias de vingança são contadas desde sempre. Promising Young Woman é mais uma delas e segue várias características do gênero. Ainda ass...

Promising Young Woman
Histórias de vingança são contadas desde sempre. Promising Young Woman é mais uma delas e segue várias características do gênero. Ainda assim, a produção consegue se destacar: o tema é bastante atual, a atriz principal é ótima e o texto de Emerald Fennell (também responsável pela direção) consegue trazer vários pormenores bastante incômodos, demonstrando sutileza e atenção aos detalhes.

Suponho que, se não fosse a pandemia de covid-19, o filme talvez não tivesse recebido algumas de suas cinco indicações ao Oscar e, talvez, não tivesse ganhado o prêmio de Melhor Roteiro Original. Mas esse vai ser um “fantasma” sobre todas as produções que participaram da festa deste ano. O fato é que Promising Young Woman se fez presente por seus próprios méritos e mereceu sua estatueta.

Na trama, Cassie (Carey Mulligan) é uma jovem de 30 anos que ainda está tentando lidar com o que aconteceu com sua melhor amiga na época da faculdade. Assim, ela desenvolveu seus próprios métodos para, digamos assim, tentar fazer do mundo um lugar melhor para as mulheres (não vou entrar em detalhes para evitar contar surpresas). Após um encontro casual com um antigo colega, Ryan (Bo Burnham), no entanto, suas atenções se voltam para pessoas específicas que fizeram mal para sua amiga, especialmente Al Monroe (Chris Lowell).

Desta forma, o filme mistura os planos de Cassie com o desenrolar do que realmente aconteceu com a amiga e com a maneira como a protagonista passou a se relacionar com o mundo a sua volta após o trauma. Um ponto de atenção é a relação entre ela e os pais (Clancy Brown e Jennifer Coolidge), que parece ser algo prestes a explodir – porém, ao final, a forma como a mãe e o pai dela reagem aos acontecimentos é bem diferente, enfatizando a própria questão do filme.

Promising Young Woman é, obviamente, um filme que caracteriza o tempo em que estamos vivendo. Ele até pode ser acusado de generalizar situações ou de explorar certos sentimentos, mas não de representar mal o cenário. Homens adultos sendo chamados de crianças para justificar atos criminosos, violências sendo tratadas como piadas, culpabilização de vítimas, entre outras questões, estão bem presentes, mas parece que só as pessoas tidas como instáveis conseguem enxergá-las pelo que são.

Há, inclusive, um esforço para retratar a enganosa figura do “cara legal”, que se vê desta forma e é encarado assim pela sociedade, mas que destila hipocrisia e comportamentos frequentemente contraditórios. Afinal, no final das contas, a amiga não foi vítima apenas dos atos praticados diretamente contra ela, mas de um sistema que protege os criminosos – e isso não é “coisa de filme”, é algo bem real.

Por isso, quando o longa-metragem acaba e as luzes se acendem, a sensação incômoda permanece. Esta é uma história inventada, mas ela poderia ser real e, provavelmente, seria crível se acontecesse perto de você. Promising Young Woman tem seus momentos de humor e há quem ache o filme engraçado, mas a verdade é que, para mim, ele toca muito perto para isso. A amiga da protagonista poderia ser a minha amiga ou poderia ser eu mesma. A hipocrisia poderia vir da mesma forma de várias pessoas próximas a mim.

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