Divagações: Spider-Man: Into the Spider-Verse

Desde quando começou a ser divulgado, Spider-Man: Into the Spider-Verse pareceu estranhamente promissor: uma animação sem medo de ser vis...

Desde quando começou a ser divulgado, Spider-Man: Into the Spider-Verse pareceu estranhamente promissor: uma animação sem medo de ser visualmente provocativa e estrelando um personagem estranhamente negligenciado no universo do Aranha nos quadrinhos – Miles Morales –, algo que sem dúvida me chamava a atenção. Soma-se a isso que o filme parecia emprestar conceitos do Edge of the Spider-Verse, uma saga dos quadrinhos que teve resultados, no mínimo, interessantes. O único problema dessa equação toda era a Sony Pictures Animation, um estúdio que tem sido consistentemente ruim por boa parte da última década e, recentemente, nos trouxe coisas como The Emoji Movie.

Porém, o envolvimento de Phil Lord e Rodney Rothman no roteiro trouxe certo alívio. Lord já havia escrito The Lego Movie e a dupla trabalhou junta em 22 Jump Street. Apesar da direção inexperiente da dupla Bob Persichetti e Peter Ramsey, o trabalho de Lord traz um pouco mais de credibilidade, fazendo os fãs acreditarem que Spider-Man: Into the Spider-Verse não cairia na mesma vala das últimas animações da Sony.

Ao final, o filme acabou superando – e muito – as minhas expectativas. Ele entrega algo que não víamos a muito tempo nos cinemas: uma boa animação de ação, que usa ao máximo as vantagens do seu meio.

Falar da história de Spider-Man: Into the Spider-Verse é ao mesmo tempo algo simples e um pouco complicado. A produção se foca em Miles Morales (Shameik Moore), um rapaz nova-iorquino que está tendo que lidar com a pressão de uma escola nova, com uma relação truncada com o pai (Brian Tyree Henry) e com a admiração ao seu tio Aaron (Mahershala Ali). Mas as coisas se complicam quando Miles acaba sendo picado por uma aranha mutante, entra no meio de um conflito entre Peter Parker (Jake Johnson) e o vilão Wilson Fisk (Liev Schreiber) e, basicamente, adentra uma trama que envolve universos paralelos, múltiplos Spider-Men – incluindo a sempre estilosa Spider-Gwen (Hailee Steinfeld) um porco (John Mulaney), um robô gigante e um detetive-aranha dublado por Nicolas Cage – e a possível destruição de Nova York. Mais quadrinhos que isso, impossível.

Antes de mais nada, Spider-Man: Into the Spider-Verse é uma clara carta de amor à história do herói e do que ele representa na cultura pop. O filme é lotado de pequenas referências e sacadas ao universo do personagem e suas inúmeras encarnações, indo dos filmes de Sam Raimi até os desenhos antigos, o que é um prato cheio para quem gosta desses detalhes e, certamente, deixa transparecer que a equipe estava realmente envolvida com o trabalho.

A animação, que já havia chamado a atenção nos trailers, é bastante inventiva e faz coisas que seriam impossíveis em live action, brincando com estilos e traços diferentes e sendo extremamente competente. Espero que ela também abra portas para esse tipo de produto volte a ser levado a sério em meio a um paradigma que, ao menos no ocidente, limitou a animação para filmes de comédia. Com isso, os grandes filmes de heróis foram relegados para um campo que talvez nem seja o mais apropriado para eles, ainda mais quando há tanta coisa a se explorar na mídia, que permanece quase ignorada.

Isso só se acrescenta ao fato de que, em seu cerne, esse é simplesmente um bom filme, uma jornada bastante emocional que foge dos clichês dos filmes de origem sem deixar de apresentar um arco completo. Ao fim, Miles Morales se torna um sucessor digno do herói que ele admira, reforçando a mensagem de que qualquer um pode ser Spider-Men, independente de origem, e confrontando diretamente aquela parcela da internet que choramingou quando Michael Bendis resolveu transformar um rapaz negro e hispânico no novo amigão da vizinhança. Tudo isso é amarrado por uma boa trilha sonora, que casa bem com os personagens e o clima.

Com essa equação, Spider-Man: Into the Spider-Verse é, possivelmente, o melhor filme do herói até hoje – e, também, o mais próximo dos quadrinhos. Afinal, a produção pode se dar ao luxo de colocar alguns conceitos mais absurdos e carregar bem mais na estética do que as suas contrapartes cinematográficas teriam coragem de fazer.

Tudo bem que o filme talvez pudesse ser um pouco mais condensado e que a animação usa de alguns truques para parecer mais impressionante do que é, pelo menos em termos técnicos. Mas isso não reduz a minha ótima experiência e esse é, sem dúvida, um filme do qual Stan Lee se orgulharia (aliás, aqui temos sua primeira participação póstuma, acompanhada de uma homenagem muito tocante).

Se você tem qualquer interesse na franquia e quer um sopro de ar fresco em um gênero que tende a se repetir, Spider-Man: Into the Spider-Verse é basicamente imperdível, e admito que estou muito ansioso por uma continuação que mergulhe ainda mais fundo nesse conceito. Quem sabe finalmente não veremos Takuya Yamashiro e o fabuloso Leopardon em um próximo filme?

Outras divagações:
Rise of the Guardians

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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