Divagações: Che - Part Two

É difícil dizer o que a figura de Ernesto Che Guevara representa nos dias de hoje. Ele era um médico argentino comunista que viajou de m...

É difícil dizer o que a figura de Ernesto Che Guevara representa nos dias de hoje. Ele era um médico argentino comunista que viajou de moto pelo continente americano. Também acreditava que a luta armada era a forma ideal para o socialismo chegar ao poder. Um idealista, ele representa ao mesmo tempo o intelectual e o guerreiro. No entanto, em algum momento ele se tornou também ícone pop, estampa de camiseta e símbolo sexual.

Não vou tentar definir uma pessoa em um parágrafo, mas a verdade é que são tantas as mensagens diferentes que rodeiam essa persona que se tornou difícil receber uma mensagem como a que Steven Soderbergh tentou passar em seus dois filmes sobre ele. Com um tom mais realista (e um ritmo lento), Ernesto Che Guevara se mostra aos poucos, mas todos parecem já conhecê-lo. Ele não prova para ninguém quem é ou o que pode fazer, simplesmente é (o que eu também não acho muito normal, mas também não vivi naqueles tempos e lugares).

Dizem que, dividindo sua obra em duas partes, Soderbergh fez um tributo à dualidade marxista mostrando conflitos de ideias, diferentes esquemas de cores, percepções desiguais da cronologia e finais distintos. Além disso, Benicio Del Toro alegou mais de uma vez ter estudado durante anos para o papel. As escolhas artísticas e interpretativas que eles fizeram foram, então, de admiradores de Che Guevara e esses filmes merecem serem vistos como as verdadeiras homenagens que são.

Em Che: Part One, ele conta a história da revolução cubana, com a vitória de seus ideais e a queda de um regime. Já Che: Part Two trata da revolta na Bolívia, que não teve um final muito feliz. Na posição de um homem procurado no resto do mundo, Ernesto Che Guevara (Benicio Del Toro) é dado como desaparecido em Cuba por Fidel Castro (Demián Bichir). No entanto, ele usa de documentos falsos para se infiltrar na Bolívia, onde lidera um grupo de guerrilheiros através de um pseudônimo.

Retratado como um homem extremamente idealista e correto, o líder se reflete no grupo. Ao invés de saquear, os guerrilheiros pedem ajuda e pagam aos camponeses. Também são educados, procuram instruir a população a respeito dos ideais da causa e oferecem ajuda aos que precisam de médicos, por exemplo. Por mais que o filme tente mostrar que nem todos são perfeitos, fica difícil acreditar em um grupo vivendo em condições tão precárias, mas mantendo a ‘dignidade’ dessa forma tão severa.

Por mais que tenha essa postura favorável ao ídolo de tantos, o filme tem uma visão própria e um estilo que a valoriza, não sendo uma obra fácil de assistir. É monótono, tem poucos diálogos, não apresenta grandes momentos cheios de esperança e sonhos – fala da vida na guerrilha.

Assim, não é de se estranhar que a recepção tenha sido um tanto fraca. Por mais que se esperasse muito, o filme abre pouco espaço para discussões de ordem ideológica e não procura aproximar o espectador dos personagens. No Brasil, o lançamento dos dois filmes foi tão separado que Che: Part Two nem ao menos chegou a estrear em muitos lugares, sendo lançado diretamente em DVD.

De qualquer modo, vale a pena experimentar algo diferente do usual cinema hollywoodiano. O que não deixa de ser estranho porque Steven Soderbergh é um nome muito ligado às grandes bilheterias e badalações. Mas essa é uma obra autoral e a visão que ele tem da América Latina – com seus méritos, problemas e demais particularidades – é muito diferente da nostalgia proposta por Walter Salles em seu Diarios de Motocicleta, que conta a história de um recém-formado e sonhador.

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