Divagações: Kill Bill: Vol. 2

Talvez eu já tenha “gastado” boa parte de meus argumentos sobre essa obra quando divaguei sobre Kill Bill: Vol. 1 , mas há aspectos bastan...

Talvez eu já tenha “gastado” boa parte de meus argumentos sobre essa obra quando divaguei sobre Kill Bill: Vol. 1, mas há aspectos bastante interessantes para serem tratados quando o assunto é Kill Bill: Vol. 2. Para começar, quero retomar a minha experiência com esse filme no cinema.

Quando esta produção estreou no Brasil, seis meses a separavam de sua antecessora. Ou seja, deu tempo para a poeira baixar um pouco, mas a empolgação se manteve em alta – ainda mais após a boa recepção dada ao longa-metragem anterior. Ao mesmo tempo, havia a questão de que a surpresa inicial com o conceito já havia passado e seria muito difícil atingir uma reação similar do público.

Inesperadamente, muita gente interpretou Kill Bill: Vol. 2 como sendo algo bastante diferente, com um tom narrativo distinto e um apelo novo. Mas a verdade é que, vendo um filme após o outro, essa sensação não fica tão evidente. A continuidade é clara, os recursos narrativos são os mesmos e as mudanças que ocorrem são naturais, visto que a protagonista está cada vez mais próxima de Bill.

Inclusive, vou praticamente repetir a sinopse que já utilizei na minha divagação anterior. Basicamente, a história de Kill Bill começa quando um grupo de assassinos entra em uma igreja e mata todos os presentes em um casamento. A noiva (Uma Thurman), contudo, sobrevive mesmo após levar um tiro à queima roupa do líder do grupo, Bill (David Carradine), que, não por acaso, é pai da filha que ela carrega.

Alguns anos depois, a noiva acorda de um coma e decide ir atrás de todos os membros do grupo, com o objetivo de matar um por um até chegar em Bill. Neste segundo volume, ela enfrenta o irmão de Bill, Budd (Michael Madsen), e sua maior rival, Elle Driver (Daryl Hannah), além do próprio Bill. Ele, porém, traz um segredo que pode mudar o rumo da trama.

Como as batalhas anteriores foram intercaladas com cenas que caracterizavam o passado da protagonista e sua personalidade, Kill Bill: Vol. 2 acaba se concentrando mais em seu relacionamento com Bill e em sua formação como assassina – afinal, ela mesma já fez parte do grupo responsável pelo atentado na igreja. Assim, é como se houvesse um “refinamento” na motivação dos personagens. Eles deixam de reagir ao que acontece com eles e passam a tomar suas próprias decisões.

Além disso, ao tirar a história do Japão – onde se passa uma parte considerável do longa-metragem anterior –, armas de fogo e elementos mais estadunidenses começam a fazer parte da trama, o que complica um pouco as coisas para a personagem principal. Os elementos orientais que caracterizam a produção, então, passam para as cenas de flashback envolvendo o treinamento da protagonista na China, com o lendário Pai Mei (Chia-Hui Liu).

Essa mudança faz com que seja possível intercalar de forma mais natural cenas em que a personagem principal está fragilizada com sequências que trazem demonstrações de força e superação. Para completar, isso também dá uma dimensão mais humana para uma personagem que, até aquele momento, era apenas uma mulher movida pelo sentimento de vingança.

Assim, embora mantenha um tom em seus diálogos e nas interpretações que remete diretamente a filmes de kung fu, Kill Bill: Vol. 2 ganha uma camada mais complexa (mas nem tanto assim) e firma seus dois pés no cinema norte-americano. A motivação principal segue sendo uma vingança, mas há mais coisas em jogo do que um mero acerto de contas.

Mesmo que tenham se passado mais de 15 anos do lançamento do filme, ele continua funcionando muito bem, especialmente porque não há nada parecido por aí. Kill Bill: Vol. 2 não é tão carregado de ação e momentos marcantes quanto seu antecessor, mas ele conclui a história de uma forma muito bem amarrada, sendo condizente com tudo o que foi mostrado até então.

Quero chamar atenção, no entanto, para outro ponto. Em um momento onde praticamente todos os longas-metragens são realizados com o uso de câmeras digitais, a estética de Kill Bill passa a chamar ainda mais atenção. O filme foi captado em película e os ruídos na imagem estão bastante perceptíveis (ao menos na edição em Blu-Ray que eu tenho). Em parte, isso deixa a produção simplesmente datada, mas também a aproxima do universo que o roteirista e diretor Quentin Tarantino busca retratar.

Embora a mensagem não seja direta, este é um filme sobre filmes, sobre cinema. As referências não estão presentes apenas para fazer os nerds terem uma camada extra de diversão, mas também para homenagear um tipo de filme que não existe mais e que não pode ser repetido. Ao trazer uma bagagem ampla para este filme e escancará-la, Tarantino abre as portas para que um novo público tenha interesse pelos velhos filmes de kung fu e saia buscando por mais.

Outras divagações:
Reservoir Dogs
Jackie Brown
Kill Bill: Vol. 1
Death Proof
Django Unchained
The Hateful Eight
Once Upon a Time ... in Hollywood

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