Divagações: Sully

Histórias envolvendo acidentes aéreos, especialmente em voos comerciais, invariavelmente acabam chamando muita atenção. Quando elas são tr...

Histórias envolvendo acidentes aéreos, especialmente em voos comerciais, invariavelmente acabam chamando muita atenção. Quando elas são tristes, o drama é grande, há muitas incertezas e pessoas entram em pânico. Quando elas têm um final feliz, a sensação é de alívio e, frequentemente, os pilotos são rapidamente alçados à categoria de ídolos.

Baseado em acontecimentos reais, Sully se enquadra nesta segunda opção. Em 2009, um avião decolou de um aeroporto em Nova York e, em poucos minutos, estava sem motores funcionais e correndo o risco de cair. Então, o piloto, Chesley 'Sully' Sullenberger (Tom Hanks), toma uma decisão arriscada: pousar no Rio Hudson, que corta a cidade. Com 150 pessoas a bordo, ele consegue salvar a todos e passa a ser considerado um verdadeiro herói nacional.

Ele, porém, não se sentia exatamente assim. Nos dias que se seguiram ao acidente, Sully estava vivendo o trauma longe de sua esposa (Laura Linney) e de suas filhas e, para completar, ele e o co-piloto, Jeff Skiles (Aaron Eckhart), estavam enfrentando um processo judicial sobre o acidente. O principal argumento contra eles era a possibilidade real de pouso em dois aeroportos próximos, o que não teria acarretado na perda da aeronave e em outros prejuízos para a companhia aérea.

Com essa incerteza pairando sobre a cabeça do protagonista, fica difícil não comparar Sully com Flight, lançado quatro anos antes e com uma temática bem parecida. A questão é que há uma diferença bem considerável entre os protagonistas. Em Flight, o piloto é uma pessoa de hábitos e temperamento questionáveis, o que cria uma atmosfera de tensão e dúvida ao redor de suas ações. Já Sully traz um protagonista bastante consciente das decisões que tomou e que acredita fielmente que fez tudo o que estava a seu alcance.

Em resumo, o filme traz um bom moço sendo injustiçado por grandes corporações malvadas. E essa é uma história bastante interessante e digna de ser transformada em filme. Só é uma pena que ela acabe bastante pálida na comparação com sua “irmã” com um protagonista dramaticamente mais complexo.

A seu favor, Sully tem o fato de que a produção vai direto ao ponto e não se prende em tramas paralelas ou outras questões. Com menos de 1h40, este é um dos longas-metragens mais curtos da carreira do diretor Clint Eastwood, que optou por direcionar toda as atenções para o protagonista, com total apoio do verdadeiro Chesley Sullenberger (ou seja, realmente não dava para esperar muitas controvérsias neste ponto).

Ao mesmo tempo, o retrato dos advogados é bastante caricato, com o filme pintando burocratas sem coração ou capacidade de empatia – ao menos nas primeiras audiências. Inclusive, na época do lançamento, algumas pessoas ficaram decepcionadas com a produção e buscaram desmentir publicamente alguns momentos da narrativa (sinceramente, eu entendo o lado delas, mas a verdade é que filmes são releituras da situação e nunca conseguem fazer justiça a todos os envolvidos).

No final das contas, para quem lembra do acidente e se comoveu com toda a história, Sully é um filme que funciona. Ele mexe com a memória e traz uma perspectiva diferente a respeito de uma história já conhecida. Caso você tenha poucas lembranças do ocorrido, no entanto, a falta de um momento mais emocional ou mesmo de um drama mais pesado pode fazer com que a produção soe distante. Querendo ou não, a identificação com um ato de heroísmo destas proporções não é fácil e a produção não se esforça muito para aproximar o público de seu protagonista.

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