Divagações: M-8: Quando a Morte Socorre a Vida
2.12.20
A conquista de espaços tradicionalmente “brancos” e “privilegiados” é um desafio muito grande. Ao tratar sobre um jovem negro e periférico que conquista uma vaga para estudar medicina, M-8: Quando a Morte Socorre a Vida parece até exagerado. É paulada atrás de paulada, situação desagradável atrás de situações ainda mais desagradáveis. Mas não é exagero, não. Todos os episódios de racismo que surgem na tela são situações bastante plausíveis e absurdamente frequentes. Para um rapaz imaturo, que está começando a enfrentar o mundo sozinho, a situação pode se tornar insuportável.
Mas parece que Maurício (Juan Paiva) está enxergando coisas onde não têm. Em suas aulas de anatomia, ele e um grupo de colegas precisam estudar o cadáver M-8 (Raphael Logam), porém, Maurício começa a vê-lo abrir os olhos e até mesmo andar pelos corredores, além de ter pesadelos em que ele e o corpo trocam de lugar. O fato de que todos os corpos estudados são negros em uma turma majoritariamente branca também começa a afetar o rapaz, que desconfia que M-8 pode ser o filho de uma das mães que protestam incansavelmente contra o misterioso desaparecimento de diversos jovens negros.
Para desvendar esse mistério, Maurício acaba aceitando de forma relutante as ajudas eventuais de dois colegas de turma, Suzana (Giulia Gayoso) e Domingos (Bruno Peixoto), embora tenha um pouco de dificuldade em se comunicar e expressar seus sentimentos. Além disso, ele faz amizade com os assistentes do laboratório de anatomia (Ailton Graça e Alan Rocha) e mantém boas relações com a secretária do curso (Zezé Motta), as únicas pessoas negras na faculdade (digo, além dele mesmo e dos cadáveres). Para completar, em casa, ele tem o apoio de sua mãe (Mariana Nunes), uma mulher forte e que frequenta um terreiro.
Com uma temática um tanto quanto macabra, M-8: Quando a Morte Socorre a Vida alimenta a tensão de suas sequências ao praticamente não usar trilha sonora. Mas que fique claro: há músicas e muito bem colocadas, diga-se de passagem; minha observação se refere às melodias instrumentais de fundo, que frequentemente ditam “o tom” de cenas.
De qualquer modo, soma-se a isso a questão de que o protagonista é um rapaz não muito amigável lidando com uma situação difícil, o que o torna um tanto quanto soturno. Como resultado, eu confesso que, durante boa parte da produção, esperei por algo diferente. Treinada por Hollywood, criei expectativas por um suspense com elementos de terror – e poderia ter me decepcionado por não encontrar exatamente isso.
Mas o que o diretor Jeferson De – que assina o roteiro ao lado de Carolina Castro e Felipe Sholl – acaba entregando é algo muito mais calcado na realidade (o que não deixa de ser assustador, dadas as circunstâncias). Embora o filme tenha aspectos sobrenaturais, seu desenvolvimento e sua resolução estão muito mais vinculados ao mundo dos vivos. Ainda que isso acabe (vejam só!) justificando o subtítulo da produção, preciso admitir que essa forma de frasear a situação alimentou a perspectiva errada que eu criei do filme (quero crer que não serei a única).
M-8: Quando a Morte Socorre a Vida é o filme nacional que precisamos encarar com mais frequência. É uma história bastante brasileira, conectada com a população e com as narrativas que podemos tirar de nossas vivências. É uma pena que o atual contexto de pandemia atrapalhe o acesso a obras como essa (ainda mais que o habitual). Ainda assim, espero que a produção encontre quem a aprecie, quem se surpreenda com ela e quem aprenda com ela.
Mas parece que Maurício (Juan Paiva) está enxergando coisas onde não têm. Em suas aulas de anatomia, ele e um grupo de colegas precisam estudar o cadáver M-8 (Raphael Logam), porém, Maurício começa a vê-lo abrir os olhos e até mesmo andar pelos corredores, além de ter pesadelos em que ele e o corpo trocam de lugar. O fato de que todos os corpos estudados são negros em uma turma majoritariamente branca também começa a afetar o rapaz, que desconfia que M-8 pode ser o filho de uma das mães que protestam incansavelmente contra o misterioso desaparecimento de diversos jovens negros.
Para desvendar esse mistério, Maurício acaba aceitando de forma relutante as ajudas eventuais de dois colegas de turma, Suzana (Giulia Gayoso) e Domingos (Bruno Peixoto), embora tenha um pouco de dificuldade em se comunicar e expressar seus sentimentos. Além disso, ele faz amizade com os assistentes do laboratório de anatomia (Ailton Graça e Alan Rocha) e mantém boas relações com a secretária do curso (Zezé Motta), as únicas pessoas negras na faculdade (digo, além dele mesmo e dos cadáveres). Para completar, em casa, ele tem o apoio de sua mãe (Mariana Nunes), uma mulher forte e que frequenta um terreiro.
Com uma temática um tanto quanto macabra, M-8: Quando a Morte Socorre a Vida alimenta a tensão de suas sequências ao praticamente não usar trilha sonora. Mas que fique claro: há músicas e muito bem colocadas, diga-se de passagem; minha observação se refere às melodias instrumentais de fundo, que frequentemente ditam “o tom” de cenas.
De qualquer modo, soma-se a isso a questão de que o protagonista é um rapaz não muito amigável lidando com uma situação difícil, o que o torna um tanto quanto soturno. Como resultado, eu confesso que, durante boa parte da produção, esperei por algo diferente. Treinada por Hollywood, criei expectativas por um suspense com elementos de terror – e poderia ter me decepcionado por não encontrar exatamente isso.
Mas o que o diretor Jeferson De – que assina o roteiro ao lado de Carolina Castro e Felipe Sholl – acaba entregando é algo muito mais calcado na realidade (o que não deixa de ser assustador, dadas as circunstâncias). Embora o filme tenha aspectos sobrenaturais, seu desenvolvimento e sua resolução estão muito mais vinculados ao mundo dos vivos. Ainda que isso acabe (vejam só!) justificando o subtítulo da produção, preciso admitir que essa forma de frasear a situação alimentou a perspectiva errada que eu criei do filme (quero crer que não serei a única).
M-8: Quando a Morte Socorre a Vida é o filme nacional que precisamos encarar com mais frequência. É uma história bastante brasileira, conectada com a população e com as narrativas que podemos tirar de nossas vivências. É uma pena que o atual contexto de pandemia atrapalhe o acesso a obras como essa (ainda mais que o habitual). Ainda assim, espero que a produção encontre quem a aprecie, quem se surpreenda com ela e quem aprenda com ela.
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