Divagações: Zorba the Greek

Como esse é um espaço onde eu divago sobre filmes, vou fazer algo um pouco diferente do normal nesta resenha de Zorba the Greek ; não tenho ...

Zorba the Greek
Como esse é um espaço onde eu divago sobre filmes, vou fazer algo um pouco diferente do normal nesta resenha de Zorba the Greek; não tenho a intenção de ser acadêmica (longe disso), apenas quero jogar umas ideias que tive. Este é um filme de 1964, baseado em um livro de 1946, cuja história deriva de memórias do autor Nikos Kazantzakis, datadas da década de 1910, e acrescidas de um bocado de elementos fictícios. Em seu retrato de um homem que o inspirou e da sociedade de Creta, a obra frequentemente trata as mulheres como criaturas diferentes dos homens, mais frágeis, mais limitadas, menos inteligentes e, consequentemente, mais presas a sua natureza animal.

Em seu filme, o diretor e roteirista Michael Cacoyannis manteve a linha geral da história, apenas simplificando algumas passagens – ainda assim, o corte original tinha mais de três horas de duração e o resultado comercial ultrapassou 2h20. Em resumo, ele acompanha a chegada de um escritor inglês a Creta (Alan Bates) e suas tentativas de emplacar empreendimentos que rendam algum dinheiro, como uma mina de linhita e a exploração de madeira. Inexperiente nos negócios, ele se apoia no grego Alexis Zorba (Anthony Quinn), que é repleto de energia e de ideias, além de estar sempre disposto a dar conselhos de vida.

Entre as tramas mantidas em Zorba the Greek estão duas relacionadas a personagens femininas: uma delas é Madame Hortense (Lila Kedrova, que ganhou um Oscar pelo papel), uma imigrante francesa idosa, com uma série de aventuras amorosas em seu passado; já a outra é uma bela viúva (Irene Papas) desejada por praticamente todos os homens da ilha. Ambas, desta forma, são construídas a partir de suas relações com os homens.

Preciso confessar que, no livro, estas histórias me soaram bastante incômodas. No filme, por sua vez, elas talvez sejam ainda mais chocantes, mas a representação visual fez com que os homens envolvidos parecessem mais cruéis e errados, o que inclui até mesmo os protagonistas masculinos. Nos próximos parágrafos, vou contar alguns spoilers da história para justificar este ponto.

No caso de Madame Hortense, a iludida senhora é trazida com uma luz praticamente infantil, com todas as grandes safadezas de sua juventude adquirindo ares heroicos e de brincadeiras (como, pensando bem, não deixavam de ser). Assim, quando Zorba e seu patrão a enrolam em uma brincadeira sem graça, o sentimento transmitido é de tristeza. Além disso, quando ela está em seu leito de morte e seus objetos começam a ser levados embora pela comunidade, a falta de apreço e de empatia por uma pessoa de outra cultura surge em sua forma mais chocante.

Já a viúva recebe menos tempo de tela, mas sua história envolve algo mais complexo. Desejada pelos homens da cidade, ela é pressionada e odiada por não se envolver com eles; ao mesmo tempo, se o fizesse, seria facilmente taxada de “prostituta” ou algo similar, como Madame Hortense. Para completar, quando um jovem morre após se sentir rejeitado, ela é considerada culpada pelo destino do rapaz e o ressentimento dos homens ganha uma nova força-motriz. Ela não tem culpa nenhuma, mas é tratada como se tivesse; ao mesmo tempo, o único homem que aceitou em sua cama não esboça nenhuma reação para defendê-la.

Considerando o conjunto, talvez Zorba the Greek seja um filme inspirador e bonito, com uma trilha sonora marcante, personagens cativantes e uma história bastante única, além de contar com ótimas e expressivas atuações. Mas isso não muda o fato de que ele traz muitas coisas sobre a crueldade do ser humano, sua fala de consideração com o próximo e a sempre presente necessidade de agir para o próprio gozo.

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