Divagações: Shazam! Fury of the Gods

Dias atrás, ao falar do eminente lançamento de Shazam! Fury of the Gods , ouvi que o antecessor parecia ser um dos poucos filmes de herói qu...

Shazam! Fury of the Gods
Dias atrás, ao falar do eminente lançamento de Shazam! Fury of the Gods, ouvi que o antecessor parecia ser um dos poucos filmes de herói que eu realmente havia gostado. Não como “uma noite agradável e divertida no cinema”, mas como algo que fica com você por um pouquinho a mais do que a duração desses filmes. Pensando com meus botões, não posso realmente negar: eu vi algo de fresco e interessante na produção original, algo que conseguia se desvencilhar da sombra que Zack Snyder jogou sobre o universo DC.

De qualquer modo, costumo dizer que tenho uma tolerância um pouco maior para a assumidamente pasteurizada indústria de filmes baseados em super-heróis graças há anos de leitura de quadrinhos, muitos deles igualmente viciados em seu status quo. Isso desenvolveu em mim a capacidade de me importar com personagens mesmo quando o tempo deles ao sol parece já ter passado.

Mas, mesmo em meu otimismo, eu já via Shazam! Fury of the Gods com um pouco de receio. Justamente porque Shazam! foi tão bacana, um declínio de qualidade era mais do que esperado – ainda mais para uma sequência que parecia ser feita só para aproveitar o sucesso do filme anterior. Além disso, as recentes notícias de que James Gunn havia assumido o leme da DC nos cinemas deixou o longa-metragem órfão, já que as inevitáveis promessas que o filme certamente faria questão de enfatizar, não devem ser cumpridas, deixando pontas soltas.

Então, o que me restava perguntar era: quão grande é o estrago? A resposta é que ele é considerável, mas não catastrófico. Shazam! Fury of the Gods tem um semblante de todas as coisas que fizeram o primeiro filme ser legal, mas elas estão envernizadas de um cinismo corporativo e de uma busca por “sinergia” que empobrece seu resultado.

Mais ou menos dois anos depois do filme anterior, Billy Batson (Asher Angel/Zachary Levi) lida com a sua vida dupla de herói e com a sua família, a qual também acabou recebendo poderes. Sentindo-se frustrado com o gradual afastamento de seus irmãos – especialmente de Freddy (Jack Dylan Grazer/Adam Brody) – e com o fato de sua situação não ser mais única, Billy tem sua confiança minada. E isso ocorre justamente quando a sombra de seus erros passados retorna, com a chegada das filhas de Atlas, Hespera (Helen Mirren) e Kalypso (Lucy Liu), que buscam recuperar os poderes roubados do pai.

Se antes Billy servia como o coração pulsante da trama, agora ele parece deslocado em sua própria história. A justaposição entre o adolescente desajeitado e o herói superconfiante funcionava especialmente bem em uma trama de origem, mas a misteriosa ausência de Asher Angel tira as coisas de balanço (ele aparece por menos de dez minutos). Ou seja, o alter ego interpretado por Zachary Levi é quase que onipresente, com um personagem particularmente pueril e irritante, removendo todo o peso de seu drama pessoal. Assim, o papel mais humano sobra para Jack Dylan Grazer; mesmo em uma subtrama mediana, ele é a melhor parte do filme.

A ação também sofre com a ausência de uma coreografia de luta mais interessante, especialmente porque os poderes das filhas de Atlas são ambíguos e terrivelmente subutilizados. Resta, então, mais um daqueles conflitos com um bonecão de computação gráfica sem peso e com uma cadência estranha (pelo menos, ele é visualmente único).

Ainda assim, Shazam! Fury of the Gods tem alguns monstros legais, mesmo que toda essa parte de “reino dos deuses” pareça ter sido igualmente desperdiçada. Aliás, apesar da forçada de mão que Black Adam fez em relação ao tema, a produção não é sequer citada, mostrando mais uma vez que as políticas de estúdio triunfam sobre a integridade narrativa.

Falando nisso, as tentativas de situar o longa-metragem no universo DC são, sinceramente, desajeitadas, servindo como um deus ex machina para resolver o filme. Ou seja, elas empobrecem a história e são tão desastradas que a transformam em uma versão quase satírica desse tipo de universo expandido, onde todo mundo é contratualmente obrigado a fazer pontas nos filmes uns dos outros. Com isso, pelo menos uma das cenas pós-créditos parece deliciosamente apropriada em uma espécie de ironia acidental.

Tirando estas questões, Shazam! Fury of the Gods ainda consegue ser agradável. Os personagens secundários são simpáticos e existe uma dose genuína de criatividade na ambientação e no humor. Mesmo sendo constrangedor em alguns momentos, o tom do filme é coerente, ainda que ele tenha perdido quase todo o charme contextual das bobagens de adolescentes tentando descobrir seus poderes.

No fim, este é só mais um filme de herói para uma pilha crescente. Ele não é ofensivamente chato, mas houve uma clara queda de qualidade em relação ao anterior. Sem um universo maior, não vejo muitas razões para a existência da produção, mas ela está aqui e suponho que vale a pena dar uma olhada quando chegar às plataformas de streaming (acredito que isso não vá demorar). Em resumo, eu recomendaria uma ida ao cinema apenas aos fãs mais ardorosos de quadrinhos.

Outras divagações:

Man of Steel
Batman v Superman: Dawn of Justice
The Batman
Black Adam
Suicide Squad
Birds of Prey: And the Fantabulous Emancipation of One Harley Quinn
Wonder Woman
Justice League
Aquaman
Shazam!
Joker

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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