Divagações: Moana 2
26.11.24
Perdoem o trocadilho, mas Moana 2 é o tipo de filme que parece bastante comum em sua superfície, mas que diz muito sobre o estado da indústria de animação quando analisado em profundidade.
A produção de 2016 foi claramente fruto de um esforço conjunto e apaixonado de algumas das melhores mentes da indústria. Inclusive, Moana foi o último grande destaque da lendária dupla Musker e Clements, responsáveis por sucessos da era renascentista da Disney nos anos 1990, além de contar com músicas de Lin-Manuel Miranda no auge de sua fama após Hamilton.
Moana 2, por sua vez, substitui quase toda a equipe criativa principal por profissionais jovens e menos experientes. Os diretores David G. Derrick Jr., Jason Hand e Dana Ledoux Miller são estreantes na posição, enquanto a trilha sonora ficou a cargo de Abigail Barlow e Emily Bear, que ganharam fama no TikTok com um musical não autorizado de Bridgerton.
Embora isso possa ser visto como uma “passagem de tocha” para a nova geração, tenho uma visão cética sobre as intenções da Disney, especialmente considerando que Moana 2 foi inicialmente concebido como uma série para o Disney+. O objetivo parece ser apenas manter a marca viva no imaginário popular, seja pelo merchandising ou para preparar terreno para a igualmente desnecessária adaptação em live-action. O resultado é um filme competente, mas com apenas uma fração da intenção criativa e da paixão do original.
Admito meu desdém pelo estado atual da indústria cinematográfica. Em 2024, todos os dez filmes mais assistidos foram sequências, uma tendência que só parece se intensificar. A animação sofre ainda mais com essa falta de inovação e, tirando Elio, da Pixar (adiado por mais de um ano devido a problemas de produção), o cronograma da Disney até 2026 é dominado por sequências e adaptações em “live-action”. Isso, combinado com o já mencionado “desmonte criativo” visto em Moana 2, é preocupante.
Obviamente, eu disse algo muito parecido sobre Inside Out 2 e o filme foi um enorme sucesso, tendo a maior bilheteria do ano. Então, concedo o ponto: se você se divertiu com Inside Out 2 e não vê nenhum problema nessa minha interminável diatribe, pode ir ver Moana 2 sem nenhum medo, é um filme bacaninha. Quanto aos demais, escutem.
Três anos após os acontecimentos do filme anterior, Moana (Auli'i Cravalho/Any Gabrielly) é uma respeitada navegadora em Motonui. Porém, mesmo tendo explorado todo o oceano ao redor da ilha que chama de casa, ela falha em encontrar a presença de qualquer outra tribo.
Eis que, durante um ritual para assumir uma posição de liderança, Moana recebe a mensagem de um de seus ancestrais, revelando que Nalo, o deus das tempestades, escondeu a ilha de Motufetu, que unia os povos do mar, para os separar. Assim, cabe a ela encontrar a mítica ilha e remover a maldição, de modo a juntar novamente as tribos.
Nesse meio tempo, Maui (Dwayne Johnson/Saulo Vasconcelos) se vê preso por Matangi (Awhimai Fraser/Lara Suleiman), uma das asseclas de Nalo. Com isso, ele se vê impedido de ajudar Moana, que reúne um novo grupo para sair nessa aventura pelo mar.
Ainda que não tenha nada de errado com esse tipo de história, eu sinto que o filme trilha caminhos já conhecidos; nenhum dos dramas ou dos novos personagens consegue passar uma abordagem verdadeiramente transformativa. Moana, em vez de estar insegura sobre seu papel no mundo, teme apenas a possibilidade de falhar em sua missão. Já Maui perde relevância, só aparecendo para dar suporte ao final.
Para completar, nenhum dos novos personagens é muito interessante. Apenas Loto (Rose Matafeo/Éri Correia) parece ter algum destaque, mas acaba desaparecendo completamente no último ato do filme. Contudo, admito que simpatizei com a “vilã” Matangi (que tem a música mais divertida do filme) e não me incomodaria de vê-la novamente.
Falando nisso, Moana 2 deixa bem claro que haverá pelo menos uma continuação, com direito a uma surpresa “estilo Marvel” após os créditos. Sinceramente, essa insistência em transformar uma história criada para ter um começo, meio e fim em um produto com uma trama expansiva e rocambolesca soa como algo desrespeitoso. Embora eu não possa afirmar que isso vai resultar em algo ruim, também não vejo como esse tipo de estrutura pode agregar.
Além disso, a parte musical do filme também é fraca. Nenhuma canção é tão grudenta quanto as do filme original e, liricamente, elas não conseguem expressar bem os personagens ou suas percepções de mundo, parecendo meio “jogadas” para cumprir uma cota e avançar a trama (por exemplo, há mais de uma canção-montagem).
A animação, por sua vez, permanece muito boa. Apesar disso, sinto que o visual dos personagens está um pouco menos estilizado, mesmo considerando os avanços da tecnologia; entretanto, essa pode ser apenas uma questão de preferência pessoal.
Embora Moana 2 não tenha sido tão criativamente fraco quanto Frozen 2, saí da sala de cinema desapontado. A produção não manteve a energia do filme anterior e nem a mesma dose de reverência às comunidades tradicionais do pacífico. Ainda que o longa-metragem tente ser mais “ambicioso” ao expandir sua mitologia para comportar possíveis continuações, nada nele soa como um risco criativo real; é, simplesmente, mais Moana. Para mim, isso não é o suficiente, ainda que Hollywood pareça estar satisfeita.
Outras divagações:
Moana
A produção de 2016 foi claramente fruto de um esforço conjunto e apaixonado de algumas das melhores mentes da indústria. Inclusive, Moana foi o último grande destaque da lendária dupla Musker e Clements, responsáveis por sucessos da era renascentista da Disney nos anos 1990, além de contar com músicas de Lin-Manuel Miranda no auge de sua fama após Hamilton.
Moana 2, por sua vez, substitui quase toda a equipe criativa principal por profissionais jovens e menos experientes. Os diretores David G. Derrick Jr., Jason Hand e Dana Ledoux Miller são estreantes na posição, enquanto a trilha sonora ficou a cargo de Abigail Barlow e Emily Bear, que ganharam fama no TikTok com um musical não autorizado de Bridgerton.
Embora isso possa ser visto como uma “passagem de tocha” para a nova geração, tenho uma visão cética sobre as intenções da Disney, especialmente considerando que Moana 2 foi inicialmente concebido como uma série para o Disney+. O objetivo parece ser apenas manter a marca viva no imaginário popular, seja pelo merchandising ou para preparar terreno para a igualmente desnecessária adaptação em live-action. O resultado é um filme competente, mas com apenas uma fração da intenção criativa e da paixão do original.
Admito meu desdém pelo estado atual da indústria cinematográfica. Em 2024, todos os dez filmes mais assistidos foram sequências, uma tendência que só parece se intensificar. A animação sofre ainda mais com essa falta de inovação e, tirando Elio, da Pixar (adiado por mais de um ano devido a problemas de produção), o cronograma da Disney até 2026 é dominado por sequências e adaptações em “live-action”. Isso, combinado com o já mencionado “desmonte criativo” visto em Moana 2, é preocupante.
Obviamente, eu disse algo muito parecido sobre Inside Out 2 e o filme foi um enorme sucesso, tendo a maior bilheteria do ano. Então, concedo o ponto: se você se divertiu com Inside Out 2 e não vê nenhum problema nessa minha interminável diatribe, pode ir ver Moana 2 sem nenhum medo, é um filme bacaninha. Quanto aos demais, escutem.
Três anos após os acontecimentos do filme anterior, Moana (Auli'i Cravalho/Any Gabrielly) é uma respeitada navegadora em Motonui. Porém, mesmo tendo explorado todo o oceano ao redor da ilha que chama de casa, ela falha em encontrar a presença de qualquer outra tribo.
Eis que, durante um ritual para assumir uma posição de liderança, Moana recebe a mensagem de um de seus ancestrais, revelando que Nalo, o deus das tempestades, escondeu a ilha de Motufetu, que unia os povos do mar, para os separar. Assim, cabe a ela encontrar a mítica ilha e remover a maldição, de modo a juntar novamente as tribos.
Nesse meio tempo, Maui (Dwayne Johnson/Saulo Vasconcelos) se vê preso por Matangi (Awhimai Fraser/Lara Suleiman), uma das asseclas de Nalo. Com isso, ele se vê impedido de ajudar Moana, que reúne um novo grupo para sair nessa aventura pelo mar.
Ainda que não tenha nada de errado com esse tipo de história, eu sinto que o filme trilha caminhos já conhecidos; nenhum dos dramas ou dos novos personagens consegue passar uma abordagem verdadeiramente transformativa. Moana, em vez de estar insegura sobre seu papel no mundo, teme apenas a possibilidade de falhar em sua missão. Já Maui perde relevância, só aparecendo para dar suporte ao final.
Para completar, nenhum dos novos personagens é muito interessante. Apenas Loto (Rose Matafeo/Éri Correia) parece ter algum destaque, mas acaba desaparecendo completamente no último ato do filme. Contudo, admito que simpatizei com a “vilã” Matangi (que tem a música mais divertida do filme) e não me incomodaria de vê-la novamente.
Falando nisso, Moana 2 deixa bem claro que haverá pelo menos uma continuação, com direito a uma surpresa “estilo Marvel” após os créditos. Sinceramente, essa insistência em transformar uma história criada para ter um começo, meio e fim em um produto com uma trama expansiva e rocambolesca soa como algo desrespeitoso. Embora eu não possa afirmar que isso vai resultar em algo ruim, também não vejo como esse tipo de estrutura pode agregar.
Além disso, a parte musical do filme também é fraca. Nenhuma canção é tão grudenta quanto as do filme original e, liricamente, elas não conseguem expressar bem os personagens ou suas percepções de mundo, parecendo meio “jogadas” para cumprir uma cota e avançar a trama (por exemplo, há mais de uma canção-montagem).
A animação, por sua vez, permanece muito boa. Apesar disso, sinto que o visual dos personagens está um pouco menos estilizado, mesmo considerando os avanços da tecnologia; entretanto, essa pode ser apenas uma questão de preferência pessoal.
Embora Moana 2 não tenha sido tão criativamente fraco quanto Frozen 2, saí da sala de cinema desapontado. A produção não manteve a energia do filme anterior e nem a mesma dose de reverência às comunidades tradicionais do pacífico. Ainda que o longa-metragem tente ser mais “ambicioso” ao expandir sua mitologia para comportar possíveis continuações, nada nele soa como um risco criativo real; é, simplesmente, mais Moana. Para mim, isso não é o suficiente, ainda que Hollywood pareça estar satisfeita.
Outras divagações:
Moana
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
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