Divagações: Corações Sujos
21.8.12
Entrar em uma sala de cinema para ver uma produção nacional onde praticamente só se fala japonês é uma experiência bastante única. O público é bastante previsível, assim como o pequeno número de salas e a estreia já em horários promocionais. No entanto, percebi que existe um interesse sincero pela história retratada e confesso que ela chama a atenção e merece uma chance mesmo daqueles que torcem o nariz para qualquer coisa mais dramática produzida no Brasil.
A trama de Corações Sujos se passa dentro de uma colônia japonesa em um período logo após a Segunda Guerra Mundial. Uma vez que, dentro desse contexto, o Japão representava o inimigo, os moradores desses locais foram proibidos de se reunirem, ouvirem rádio e terem escolas próprias. Embora isso até faça sentido em uma época de guerra, também causava certa alienação. Quando a guerra acabou, boa parte dos japoneses não acreditou na rendição e começaram a surgir conflitos internos que se transformaram em pequenas guerras.
Takahashi (Tsuyoshi Ihara) é um jovem fotógrafo casado com a professorinha da colônia, Miyuki (Takako Tokima). Eles convivem bem com os vizinhos, especialmente com a família da pequena Akemi (Celine Fukumoto), que é aluna de Miyuki e assistente de Takahashi. O pai da menina, Sasaki (Shun Sugata) é presidente da associação comercial da colônia e tem uma relação mais aberta com os brasileiros, retratados pela figura sem nome do policial interpretado por Eduardo Moscovis. Assim, quando a guerra acaba, Sasaki tenta esclarecer as pessoas a respeito do que realmente aconteceu e atrai o desagrado do Coronel Watanabe (Eiji Okuda), uma figura com influência sobre Takahashi, além de trazer uma carga de desespero para sua esposa Naomi (Kimiko Yo).
Baseado em um livro de Fernando Morais com personagens e fatos reais, Corações Sujos traz uma história triste e forte, que em nenhum momento apela para emoções fáceis. Os sentimentos dos personagens são compreensíveis, já que é clara a situação de opressão e isolamento em que vivem. Obviamente, aspectos culturais também influenciam os comportamentos e é praticamente impossível deixar de questionar isso.
Dirigido por Vicente Amorim e com roteiro de David França Mendes (e não por descendentes de japoneses, vale lembrar), o filme assume o lado dos mais frágeis, permanecendo com as mulheres e as crianças enquanto os homens entram em brigas ideológicas que, sob o ponto de vista adotado nesse caso, prejudicam a todos. Ao mesmo tempo em que há um grande respeito pela cultura, pela noção de honra e pelo amor que aquelas pessoas sentem pela pátria distante, também há uma crítica ao nacionalismo exacerbado e às posturas radicais.
Mesmo que o final seja um pouco clichê, o conjunto da obra faz com que Corações Sujos seja memorável. Aqueles que tiverem curiosidade a respeito da temática não irão se decepcionar, assim como as pessoas que se interessam pelo comportamento humano. Talvez o filme acabe sendo exibido em escolas, o que é muito válido, mas um pouco difícil pela baixa receptividade das legendas e pelo excesso de sangue. Ainda assim, é válido aproveitar enquanto Corações Sujos ainda pode ser visto em uma sala de cinema com toda a sua glória.
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