Divagações: Dope

A adolescência é uma parte fascinante da vida. Não só pelo que ela representa na formação de uma pessoa, mas também sobre como o ambiente pa...

A adolescência é uma parte fascinante da vida. Não só pelo que ela representa na formação de uma pessoa, mas também sobre como o ambiente passa a ter um papel ainda mais forte nessa formação. Em Dope, por exemplo, os personagens já tem plena consciência de que não é fácil crescer em um dos bairros mais violentos de Los Angeles, mas eles vivem com isso e desenvolvem suas próprias estratégias – incluindo uma boa dose de nerdice e uma certa obsessão com o hip-hop dos anos 1990.

Malcolm (Shameik Moore) é um rapaz negro e relativamente tímido, que sabe bem as regras das ruas e as usa para desviar do perigo. Como nem sempre isso é possível, em uma tarde qualquer, ele acaba virando mensageiro do traficante local, Dom (ASAP Rocky), que quer convencer sua namorada, Nakia (Zoë Kravitz), a ir em uma festa. Como recompensa, Malcolm e seus dois melhores amigos – Diggy (Kiersey Clemons) e Jib (Tony Revolori) – também são convidados para as comemorações. E, obviamente, algo dá errado.

Como se não bastasse a correria na saída da festa, Malcolm descobre que um revólver e uma grande quantidade de drogas foram colocadas dentro de sua mochila. Inicialmente, ele parece disposto a simplesmente entregar tudo para o primeiro interessado que aparecer, mas Dom – diretamente da delegacia – o coloca em mais uma missão. Mas o rapaz se vê ainda mais enrolado quando percebe que essas drogas podem ficar no caminho entre ele e uma vaga em uma boa universidade.

Como a história é cheia de idas e vindas, acho melhor deixar a maior parte dos detalhes de fora para não estragar a experiência. Dope consegue brincar com as expectativas do público sobre o gênero, criando uma divertida aventura sobre amadurecimento, amizade e planos adolescentes mirabolantes que parecem estar sempre prestes a dar errado. Só não espere um comentário social pesado e dramático. Ele até existe, mas o filme optou por não se concentrar nisso.

De qualquer forma, o longa-metragem é bem competente em retratar o presente (tecnologia é o que não falta) e em misturar as coisas. Afinal, esse não é um ‘coming of age’ tradicional, pois puxa elementos tanto de histórias adolescentes despretensiosas dos anos 1980 e 1990 quanto de tramas mais intrincadas, com grandes planos para assaltos e golpes. No final das contas, a trajetória dos personagens os transforma como pessoas, mas esse não é exatamente o cerne da questão como um todo.

Assim, o que diferencia Dope de outros filmes sobre crescer em bairros barra pesada e/ou em tempos perigosos, é a absoluta leveza com que o assunto é tratado. O protagonista se envolveu em tudo isso por um acidente e lida com os desafios da melhor forma possível, evitando endurecer a si mesmo. O público de qualquer lugar pode se simpatizar com a situação e até mesmo se imaginar naquela situação absurda. Eu, pelo menos, sei que não conseguiria ter o jogo de cintura de Malcolm e seus amigos.

Aliás, preciso mencionar que o diretor e roteirista Rick Famuyiwa deu a seus personagens uma camaradagem incondicional. Eles estão juntos durante toda a confusão, mas essa é uma parceria que já vem de longa data. Eles ouvem as mesmas músicas, vestem-se da mesma forma e sonham (quase) os mesmos sonhos. Mesmo quando eles discordam, a amizade prevalece – e, não sei vocês, mas eu acho muito legal ver isso.

Dope, para completar, é muito bem embalado (os créditos, aliás, são ótimos). Além das canções que os personagens ouvem, o longa-metragem contou também com algumas músicas inéditas, escritas por Pharrell Williams (que, assim como o narrador Forest Whitaker, também produziu do filme). Ou seja, é uma diversão em muitas camadas.

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