Divagações: Nyad

Preciso dizer que sou uma pessoa um tanto quanto cínica em relação a esportes: simplesmente não consigo entender os sacrifícios que uma pess...

Nyad
Preciso dizer que sou uma pessoa um tanto quanto cínica em relação a esportes: simplesmente não consigo entender os sacrifícios que uma pessoa pode fazer para uma conquista que é apenas física (e, em outros aspectos, debilitante). Dito isso, acho que Nyad conseguiu me convencer de que as motivações de sua protagonista são válidas.

Aos 60 anos, Diana Nyad (Annette Bening) tem uma vida confortável, dedicando seus dias a testar a paciência de sua melhor amiga, Bonnie Stoll (Jodie Foster). Ainda assim, ela parece presa a seu passado como nadadora maratonista, daquelas que participam de desafios em alto mar. Em especial, ela não consegue lidar com o fato de ter falhado em sua última missão, o trajeto de 780 quilômetros entre Cuba e Flórida.

Movida pela ideia de que é mais forte mentalmente aos 60 do que era aos 28 anos, Diana decide tentar novamente, abertamente contrariando a percepção de especialistas de que se trata de um desafio humanamente impossível. Para isso, ela recruta Bonnie como sua treinadora e junta uma equipe de profissionais para a acompanhar, com destaque para um navegador cabeça-dura, John Bartlett (Rhys Ifans).

O detalhe é que, além de criar resistência para enfrentar a distância e a temperatura da água, Diana precisa lidar com janelas de oportunidade apertadas, correntes desfavoráveis, tubarões, águas-vivas, alucinações e, claro, o custo da empreitada. Soma-se a isso o fato de que foram necessárias várias tentativas, cada uma com um novo (e perigoso) aprendizado. Sinceramente, só uma velha turrona e obcecada seria capaz de um feito desses.

Com isso, Nyad tem uma história bastante simples, mas com uma variedade de aspectos para abordar. Um deles está justamente na capacidade de sua protagonista em lidar com o desafio psicológico da empreitada. Além da força necessária para se manter nadando, a solidão desta missão também traz muitas coisas à tona, como as pressões trazidas pelo pai (Johnny Solo) e os abusos do treinador (Eric T. Miller).

Além disso, a dinâmica entre Bening e Foster é absolutamente maravilhosa. Elas conversam como duas pessoas que se conhecem muito bem, conseguindo alternar entre assuntos mundanos, momentos de apoio emocional e discussões acaloradas. O retrato crível dessa amizade é um dos aspectos mais importantes do longa-metragem, dando “humanidade” para a protagonista e a ancorando a uma realidade onde sua fixação não é a coisa mais importante do mundo.

Aliás, o fato de ser encabeçado por duas atrizes com mais de 60 anos faz com que Nyad não seja um filme comum. Mas essas histórias existem e merecem ser contadas, sendo tão capazes de emocionar e encantar quanto qualquer outra (e muito mais do que diversas que existem por aí, vale dizer).

Sob a direção de Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi – que, até então, eram conhecidos como documentaristas –, a produção mistura obsessão com ares de “realização de um sonho”, deixando evidente que o caminho não é bonito, com decisões levianas sendo recompensadas com desastres. As consequências físicas também aparecem no corpo da protagonista, mostrando que a empreitada é realmente coisa de gente meio maluca (como eu disse anteriormente, o filme me convenceu de que a protagonista tem uma motivação válida).

De qualquer forma, as várias tentativas, os inúmeros erros e a diversidade de adversidades fazem com que Nyad consiga manter um ritmo interessante. Desde o começo, você acredita que ela vai conseguir e, assim, a questão deixa de ser a chegada na Flórida e passa a ser justamente ver os tropeços pelo caminho. Suponho que gostar de esportes seja gostar de sofrer.

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