Divagações: Charade

Existe uma “aura” em filmes antigos de suspense que dificilmente poderia ser replicada em uma produção atual. Sem a necessidade de fazer coi...

Charade
Existe uma “aura” em filmes antigos de suspense que dificilmente poderia ser replicada em uma produção atual. Sem a necessidade de fazer coisas cada vez mais grandiosas para surpreender o público, os longas-metragens podiam simplesmente contar suas histórias, com quantas reviravoltas fossem necessárias. Charade, por exemplo, adota uma estrutura que, hoje, poderia ser a “base” para muitas produções, mas que raramente se seguraria sem uma camada extra de ação ou de mistério. Ainda assim, ele segue sendo um deleite.

Logo de início, somos apresentados a Regina Lampert (Audrey Hepburn), uma mulher rica e de maneiras ríspidas, que está passando uma temporada em uma estação de esqui com uma amiga (Dominique Minot) e o filho dela (Thomas Chelimsky). Regina é casada com um francês, mas pretende se divorciar em breve, chegando a flertar com um homem que encontra no local, Peter Joshua (Cary Grant).

Entretanto, uma surpresa a aguarda no retorno para casa: o apartamento está absolutamente vazio e seu marido não está em lugar nenhum. Em pouco tempo, ela é abordada por um policial francês (Jacques Marin) que relata o assassinato do seu marido, o fato de que ele estava em posse de uma grande quantidade de dinheiro – que não foi localizado – e a possibilidade de que ela mesma corra perigo.

Após o funeral, por sua vez, é a vez de um agente da CIA aparecer (Walter Matthau), informando que o falecido tinha três perigosos inimigos (James Coburn, George Kennedy e Ned Glass), que acreditam que ela está em posse do dinheiro. Sem o dinheiro e sem saber o que fazer, Regina acaba se apoiando no único homem que aparenta ser confiável, o desconhecido Joshua.

Assim, Charade nos leva por dois mistérios: é preciso desvendar onde está o dinheiro e entender quais dos personagens estão dizendo a verdade. Para mim, a segunda parte é a mais divertida. Cada um tem uma história diferente sobre seu passado, com novas camadas sendo acrescentadas aqui e ali, além de motivações que nunca ficam totalmente claras (até o final, pelo menos). A princípio, é de se pensar que a sinceridade da protagonista seja o único ponto em que o espectador pode confiar, mas até essa “certeza” dá uma balançada em alguns momentos.

Inclusive, embora tenha direção de Stanley Donen e roteiro de Peter Stone, não é incomum que Charade seja comparado às produções de Alfred Hitchcock. A construção da narrativa não é particularmente inovadora e o filme tende a “cair” para o romance, mas a comparação é válida quando se considera o impacto gerado. Se o mistério do longa-metragem parece óbvio ou forçado, provavelmente é porque nosso repertório já foi inundado de referências a ele (ou até mesmo de tramas inspiradas).

Para completar, além de seu mérito enquanto suspense, o filme também traz uma das interpretações mais “sensuais” de Audrey Hepburn. Claro que Charade é uma produção bastante recatada para os padrões atuais, mas há uma protagonista casada que quer se divorciar e, na sequência, torna-se uma viúva. Assim, é de se esperar que a charmosa presença de Cary Grant dê uma balançada em seu coração – e, curiosamente, é o personagem dele quem resiste (mas não muito) aos avanços de sua contraparte.

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