Divagações: RoboCop (2014)
7.3.14
Não há como negar que o RoboCop de Paul Verhoeven seja um daqueles clássicos que personificam o cinema dos anos 1980. Com uma mistura de sátira, violência e breguice o filme se tornou um sucesso cult que angariou ainda mais apreciadores na década que se seguiria.
Assim, quando um reboot da franquia foi anunciado, as reações estavam longe de uma unanimidade. Para nós, brasileiros, o caso foi ainda mais curioso, pois, acostumados com o trabalho de José Padilha, Lula Carvalho e Daniel Rezende, a crítica nacional tratou de exaltar as possíveis qualidades do filme, dando aquela impressão bastante desconfortável de que se estava com receio de dizer uma só palavra negativa sobre a obra.
Desse modo, fui ao cinema com um pouco de desconfiança, afinal, as comparações entre os dois filmes seriam inevitáveis. Eu ainda estava temeroso para ver como seria esse tal ‘jeito brasileiro de se fazer um blockbuster’ e como ele se sustentaria frente a um público que parece cada vez mais avesso a grandes filmes de ação.
A premissa básica de RoboCop não destoa muito do original. Em uma Detroit vitimada pela violência urbana e pela corrupção, o policial Alex Murphy (Joel Kinnaman) sofre um atentado que o deixa completamente incapacitado. Sabendo da situação, o CEO da Omnicorp, Raymond Sellars (Michael Keaton), oferece a Murphy a ajuda do Dr. Dennett Norton (Gary Oldman), líder de um projeto para voltado a construir um policial ciborgue capaz de melhorar a imagem dos drones de segurança da companhia em território americano.
Curiosamente, o que segue é uma quebra das perspectivas que o filme original propunha. Paul Verhoeven era muito bom em trabalhar em macro escala, estabelecendo os problemas que aquela sociedade decadente enfrentava e usando o RoboCop apenas como uma alegoria para um problema muito maior do que nós mesmos. Padilha, por sua vez, é bem mais contido e trabalha justamente com estes questionamentos do que constitui a humanidade do personagem-título, colocando o conflito interno como ponto central da trama.
Por outro lado, os personagens que rodeiam Murphy são interessantes, mas muitas vezes mal explorados, como a esposa e filho do protagonista (Abbie Cornish e John Paul Ruttan) que, mesmo se encaixando dentro da temática, pouco acrescentam para a resolução dos conflitos internos dele. O médico de Gary Oldman é um dos poucos personagens verdadeiramente bacanas, porém, ele sofre com a ausência de desenvolvimento. Já o papel de Samuel L. Jackson serve como o quinhão obrigatório de crítica social e sátira, embora falte um contraponto a suas opiniões.
As sequências de ação são bastante interessantes, com uma edição e fotografia impactantes e realmente diferentes do que estamos acostumados a ver no cinema estadunidense tradicional. Elas abusam de planos fechados e dão um aspecto de videogame que substitui – até mesmo tematicamente – a violência gráfica do filme original, encaixando-se bem narrativamente como maneira de mostrar a falta de empatia de Murphy pela vida dos criminosos.
Apesar de ter seu valor como filme, apresentando outros questionamentos e conflitos que o seu predecessor não trabalha, RoboCop é um reboot desnecessário e que parece deslocado no cenário atual. Não sei se há ação o suficiente para segurar os que só vão ao cinema buscar explosões e tiroteios, ao mesmo tempo, talvez o arco dramático não seja bom o suficiente para impressionar os que estão acostumados com filmes mais inteligentes.
Deste modo, por mais que, no final das contas, este seja um filme bom e honesto, falta a ele aquela pungência e aquela sagacidade capazes de impressionar quem gosta de uma boa ficção-científica. Talvez sua temática se torne um pouco mais pertinente em um futuro próximo, quando teremos que lidar com esses problemas em nossa vida real, porém, sem o pioneirismo para o salvar, RoboCop acaba ficando aquém do seu potencial, não atingindo aquele fator mais universal que fez do filme original um grande sucesso.
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