Divagações: Whiskey Tango Foxtrot
19.6.19
Por mais que, muitas vezes, eu diga que fui ver um filme “sem expectativas” isso não é exatamente verdade. Isso fica ainda mais evidente quando assisto um filme com as expectativas equivocadas – como aconteceu quando vi Whiskey Tango Foxtrot.
Não que a culpa disso seja do filme. Eu recordava ter me interessado na época do lançamento, o elenco encabeçado por Tina Fey me parecia uma boa ideia e a Netflix colocou a produção dentro da categoria de comédias. Então, antes que vocês tirem as mesmas conclusões precipitadas que eu, não se deixem enganar: por mais que o longa-metragem tente lidar com seus temas de uma forma acessível e sob o olhar de uma protagonista relativamente bem-humorada, ele é emocionalmente pesado.
Whiskey Tango Foxtrot se passa em 2003 e conta a história da jornalista Kim Baker (Fey). Frustrada profissionalmente, ela decide aceitar uma proposta da emissora onde trabalha para fazer a cobertura jornalística da Guerra do Afeganistão. A princípio, ela ficaria no país por três meses, mas o dia a dia arriscado, repleto de novos desafios e com uma boa dose de adrenalina acaba a contagiando – antes que perceba, os meses se transformaram em anos.
A equipe dela conta com o apoio de um tradutor (Christopher Abbott), um cinegrafista (Nicholas Braun) e um segurança (Stephen Peacocke), mas ela também circula com outros jornalistas, como Tanya Vanderpoel (Margot Robbie) e Iain MacKelpie (Martin Freeman). Além disso, mantém contato próximo com fontes como o general estadunidense Hollanek (Billy Bob Thornton) e o político afegão Ali Massoud Sadiq (Alfred Molina). Assim, não só a vida profissional de Kim se torna mais realizada, mas também sua vida social.
A questão é que todas essas coisas “boas” são acompanhadas por um contexto horrível. Há uma guerra devidamente acompanhada por tiroteios, bombardeios, mortes – inclusive de colegas – e histórias de opressão por todos os lados. Isso sem contar que o tempo da jornalista na televisão também depende do interesse do público pelas histórias que ela tiver para contar. Ou seja, não se trata de um ambiente acolhedor ou sequer saudável.
Dito isso, é preciso complementar que o grande apelo de Whiskey Tango Foxtrot está na personagem de Tina Fey. Como jornalista, eu entendo a sede dela por aventuras e o apelo de uma cobertura de guerra. Mas, como uma mulher que vive confortavelmente em uma cidade, também me visualizo na reunião onde a proposta é feita e o “vou pensar” geral é apenas uma forma de ganhar tempo antes de responder “não”.
Essa contradição ambulante fica clara em todas as cenas, na falta de experiência com o assunto, nos erros bobos, nos acertos acidentais e na euforia de saber que se fez um trabalho bem feito, de que se fez uma diferença – seja para o mundo, seja para um país, seja para algumas mulheres de uma comunidade (quase) esquecida. Dessa forma, o apelo da produção não reside na figura heroica de uma jornalista em uma zona de guerra, mas na pessoa repleta de falhas que está tentando o seu melhor em um contexto sem controle e sem confortos.
Inclusive, a história que se conta é que Fey se interessou pelo filme depois de ler um texto sobre o livro de Kim Barker, onde a resenhista dizia que a jornalista “se retratava como uma personagem de Tina Fey”. Isso é particularmente interessante porque, nas mãos de outra atriz, a protagonista poderia facilmente adquirir outro tom – mais melodramático, nervoso e dominado pelos vícios do cotidiano de uma repórter de guerra. E, com isso, Whiskey Tango Foxtrot também seria bem diferente. O problema é que, talvez, isso também significasse que o filme seria melhor.
Não que Tina Fey seja uma atriz ruim. Mas é difícil desassociar sua imagem dos personagens cômicos e há muitos maneirismos do humor em sua performance, o que dificulta ainda mais esse processo. Isso sem contar que Martin Freeman parece deslocado na trama, em um personagem que está emocionalmente um passo atrás da protagonista. Já em relação a Margot Robbie, só posso dizer que não é crível que uma pessoa seja tão bonita, descolada (ainda se fala isso?) e competente ao mesmo tempo. Simplesmente não dá.
Assim, como é relativamente frequente nos filmes de Glenn Ficarra e John Requa, Whiskey Tango Foxtrot tem boas intenções e é competente, mas carece de algo que o torne verdadeiramente “um filmão”. O ângulo está certo, o ritmo está bom e o elenco é interessante, mas o conjunto não está devidamente alinhado. De qualquer modo, continua merecendo uma chance do público.
Outras divagações:
I Love You Phillip Morris
Crazy Stupid Love
Não que a culpa disso seja do filme. Eu recordava ter me interessado na época do lançamento, o elenco encabeçado por Tina Fey me parecia uma boa ideia e a Netflix colocou a produção dentro da categoria de comédias. Então, antes que vocês tirem as mesmas conclusões precipitadas que eu, não se deixem enganar: por mais que o longa-metragem tente lidar com seus temas de uma forma acessível e sob o olhar de uma protagonista relativamente bem-humorada, ele é emocionalmente pesado.
Whiskey Tango Foxtrot se passa em 2003 e conta a história da jornalista Kim Baker (Fey). Frustrada profissionalmente, ela decide aceitar uma proposta da emissora onde trabalha para fazer a cobertura jornalística da Guerra do Afeganistão. A princípio, ela ficaria no país por três meses, mas o dia a dia arriscado, repleto de novos desafios e com uma boa dose de adrenalina acaba a contagiando – antes que perceba, os meses se transformaram em anos.
A equipe dela conta com o apoio de um tradutor (Christopher Abbott), um cinegrafista (Nicholas Braun) e um segurança (Stephen Peacocke), mas ela também circula com outros jornalistas, como Tanya Vanderpoel (Margot Robbie) e Iain MacKelpie (Martin Freeman). Além disso, mantém contato próximo com fontes como o general estadunidense Hollanek (Billy Bob Thornton) e o político afegão Ali Massoud Sadiq (Alfred Molina). Assim, não só a vida profissional de Kim se torna mais realizada, mas também sua vida social.
A questão é que todas essas coisas “boas” são acompanhadas por um contexto horrível. Há uma guerra devidamente acompanhada por tiroteios, bombardeios, mortes – inclusive de colegas – e histórias de opressão por todos os lados. Isso sem contar que o tempo da jornalista na televisão também depende do interesse do público pelas histórias que ela tiver para contar. Ou seja, não se trata de um ambiente acolhedor ou sequer saudável.
Dito isso, é preciso complementar que o grande apelo de Whiskey Tango Foxtrot está na personagem de Tina Fey. Como jornalista, eu entendo a sede dela por aventuras e o apelo de uma cobertura de guerra. Mas, como uma mulher que vive confortavelmente em uma cidade, também me visualizo na reunião onde a proposta é feita e o “vou pensar” geral é apenas uma forma de ganhar tempo antes de responder “não”.
Essa contradição ambulante fica clara em todas as cenas, na falta de experiência com o assunto, nos erros bobos, nos acertos acidentais e na euforia de saber que se fez um trabalho bem feito, de que se fez uma diferença – seja para o mundo, seja para um país, seja para algumas mulheres de uma comunidade (quase) esquecida. Dessa forma, o apelo da produção não reside na figura heroica de uma jornalista em uma zona de guerra, mas na pessoa repleta de falhas que está tentando o seu melhor em um contexto sem controle e sem confortos.
Inclusive, a história que se conta é que Fey se interessou pelo filme depois de ler um texto sobre o livro de Kim Barker, onde a resenhista dizia que a jornalista “se retratava como uma personagem de Tina Fey”. Isso é particularmente interessante porque, nas mãos de outra atriz, a protagonista poderia facilmente adquirir outro tom – mais melodramático, nervoso e dominado pelos vícios do cotidiano de uma repórter de guerra. E, com isso, Whiskey Tango Foxtrot também seria bem diferente. O problema é que, talvez, isso também significasse que o filme seria melhor.
Não que Tina Fey seja uma atriz ruim. Mas é difícil desassociar sua imagem dos personagens cômicos e há muitos maneirismos do humor em sua performance, o que dificulta ainda mais esse processo. Isso sem contar que Martin Freeman parece deslocado na trama, em um personagem que está emocionalmente um passo atrás da protagonista. Já em relação a Margot Robbie, só posso dizer que não é crível que uma pessoa seja tão bonita, descolada (ainda se fala isso?) e competente ao mesmo tempo. Simplesmente não dá.
Assim, como é relativamente frequente nos filmes de Glenn Ficarra e John Requa, Whiskey Tango Foxtrot tem boas intenções e é competente, mas carece de algo que o torne verdadeiramente “um filmão”. O ângulo está certo, o ritmo está bom e o elenco é interessante, mas o conjunto não está devidamente alinhado. De qualquer modo, continua merecendo uma chance do público.
Outras divagações:
I Love You Phillip Morris
Crazy Stupid Love
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