Divagações: Ad Astra

Brad Pitt frequentemente repetiu em entrevistas que não se importa se nunca receber uma estatueta do Oscar – bom, tecnicamente, ele já po...

Brad Pitt frequentemente repetiu em entrevistas que não se importa se nunca receber uma estatueta do Oscar – bom, tecnicamente, ele já possui uma, como produtor de 12 Years a Slave. Ainda assim, ele nunca esteve tão próximo do prêmio por atuação quanto este ano, tendo entregado excelentes performances em Once Upon a Time... in Hollywood e em Ad Astra, que passou praticamente despercebido nos cinemas brasileiros (e de boa parte do mundo).

O motivo da falta de interesse do público não é exatamente um mistério. A princípio, Ad Astra lembra muitos “filmes de espaço” considerados chatos ou inacessíveis por muita gente, daqueles marcados por uma jornada solitária e um lado visual impactante. E ele é isso mesmo, sem tirar nem pôr e sem nunca esconder esse fato. Ainda assim, a produção não é exatamente sobre as situações encontradas fora do planeta Terra e, com algumas adaptações, poderia se passar tranquilamente em qualquer outro lugar.

Em um futuro onde viagens comerciais à Lua são uma realidade e há populações humanas com gerações nascidas em outros planetas, Roy McBride (Pitt) é um astronauta renomado e bastante dedicado. Ele é conhecido por seu próprio trabalho e, também, por ser o filho de um grande astronauta e cientista (Tommy Lee Jones), falecido quando ele ainda era uma criança.

Embora tenha vivido recentemente uma tragédia em uma estação espacial e seja assombrado pelo fim de seu relacionamento com Eve (Liv Tyler), McBride passa facilmente pelos frequentes testes psicológicos impostos por seu trabalho – talvez facilmente demais. Porém, seu estado mental será realmente testado em sua próxima missão: tentar se comunicar com seu pai, que pode ainda estar vivo, mesmo 30 anos após seu desaparecimento.

No processo, ele precisa enfrentar suas próprias memórias e a imagem que tem do pai, sendo inesperadamente ajudado por Helen Lantos (Ruth Negga), a ressentida filha de colegas da missão de seu pai. Ao mesmo tempo, ele também passa a questionar seus superiores, sua lealdade ao trabalho, os objetivos reais da missão e quem realmente é Clifford McBride.

Para contar essa história, Ad Astra aposta fortemente em seu protagonista. Somos guiados por uma narração feita por Pitt, que acrescenta uma nova camada de interpretação sobre a imagem do homem aparentemente frio e calculista que vemos na tela. Além disso, em vez da profusão de planos abertos mostrando a beleza do espaço, passamos a encontrar cada vez mais closes e imagens de ambientes claustrofóbicos (eventualmente acompanhadas por muita tecnologia e imagens de um grande vazio).

Assim, não é à toa que muito se falou em um Oscar para o ator. É ele quem segura as duas horas do longa-metragem, mantendo o espectador atento aos detalhes que o diretor e roteirista James Gray vai apresentando aos poucos. Afinal, esse não é um filme de ação ou de grandes emoções. O ritmo não é de forma alguma lento e sempre há algo importante acontecendo, mas a construção da narrativa acontece passo a passo, sem exatamente a preparação para um momento catártico – embora a crescente pressão sobre o protagonista também tenha suas consequências.

Aliás, são as cenas mais físicas que me trouxeram uma “sensação ruim” em relação a Ad Astra e eu me questiono se elas realmente precisavam acontecer desta forma. São nestes momentos que o protagonista se distancia do público e mostra que ele mesmo não é uma pessoa com a qual o espectador pode se identificar. Ao mesmo tempo, elas também deixam claro que há algo de errado com todo o “sistema” e com as tais avaliações psicológicas.

A seu modo, Ad Astra é uma produção sobre uma jornada e a busca de significados, sendo profundo, filosófico, bonito e triste, exatamente como deveria ser. É um filme que merecia uma recepção mais acalorada do pública, mas que deve alcançar seus adoradores aos poucos. Assim, espero que, assim como outros que o antecederam na “exploração especial com significados ainda mais profundos”, ele também não seja esquecido.

Outras divagações:
The Lost City of Z

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