Divagações: Omoide no Mânî

Cada mídia, cada técnica, cada estilo narrativo tem seus méritos e consegue tocar as pessoas de diferentes formas. E mesmo dentro de cada ...

Cada mídia, cada técnica, cada estilo narrativo tem seus méritos e consegue tocar as pessoas de diferentes formas. E mesmo dentro de cada um deles, há uma variedade enorme de possibilidades. A animação tradicional, quando levada para um aspecto mais dramático e nostálgico, por exemplo, é capaz de levar a um envolvimento que o cinema tradicional não consegue chegar. Por mais que os efeitos especiais estejam cada vez mais realistas, há uma mágica muito natural na animação, algo que não pode ser replicado com facilidade.

Omoide no Mânî é um caso assim. O filme conta uma história simples, fortemente apoiada em um elemento fantástico, e consegue entregar essa premissa com relativa naturalidade. Sua delicadeza de traços e cores também parece facilitar uma empatia com personagens que não exatamente emanam carisma, como a própria protagonista. Ela é uma adolescente irritadiça, que não compreende muito bem o mundo que a certa e frequentemente julga a tudo e a todos sem os devidos conhecimentos de causa. Ao mesmo tempo, todo mundo já foi adolescente um dia.

Anna Sasaki (Sara Takatsuki) é uma menina solitária, que gosta muito de desenhar e está enfrentando alguns problemas de saúde e também em casa. Para lidar com a situação, sua mãe adotiva (Nanako Matsushima) resolve enviá-la para passar uma temporada no campo, morando com parentes (Susumu Terajima e Toshie Negishi). Lá chegando, ela se encanta com uma casa aparentemente abandonada, onde o acesso depende das marés.

Por algum motivo, Anna se sente atraída à casa e frequentemente vai até lá. Após alguns dias, ela conhece Marnie (Kasumi Arimura), uma menina bonita, alegre e cativante, que alega morar no local e que está disposta a ser sua amiga, ainda que algo esteja definitivamente errado – afinal, o lugar está visivelmente abandonado. Mas ao entrar na casa acompanhada por Marnie, Anna praticamente viaja ao passado, encontrando pais negligentes e uma grande falta de afeto na residência da nova amiga.

Pouco tempo depois, uma nova peça se junta ao quebra-cabeça, quando a família da pequena Sayaka (Hana Sugisaki) decide se mudar para a casa. A menina encontra o antigo diário de Marnie, onde ela relata sua triste vida familiar. Sayaka, então, decide pedir a ajuda de Anna para entender esta história, assim como a relação entre as duas garotas.

Tudo isso, como não poderia deixar de ser em um filme do Studio Ghibli, é acompanhado por cenários muito bonitos e bem elaborados. Além disso, Omoide no Mânî tem um ar bucólico e adorável que combina bastante com as outras obras do diretor Hiromasa Yonebayashi, o qual parece gostar de colocar suas protagonistas para crescer em meio à natureza em adaptações de textos de autoras britânicas – desta vez, a escolhida foi Joan G. Robinson.

De qualquer modo, ao longo de todo o filme, a descoberta de algum tipo de tragédia parece ser iminente, mas quem espera por uma grande revelação pode acabar se decepcionando quando ela efetivamente acontece. De alguma forma, o grande objetivo é demonstrar como estas duas meninas tão diferentes lidaram com as angústias, ressentimentos e raivas da adolescência, uma fase que não é fácil e que deve deixar marcas profundas nas adultas que elas se tornarão.

Inclusive, Omoide no Mânî talvez tenha até ares de romance – inclusive com Anna muitas vezes assumindo o papel que, pelos diários, seria de um garoto local, amigo de Marnie –, mas o foco real é o amadurecimento da protagonista. Ao embarcar em uma vida absolutamente nova e ter a possibilidade de explorar a história desta garota desconhecida e fantástica, ela acaba dando uma nova perspectiva para a sua própria vida e, no processo, também faz novos amigos. E, convenhamos, estas foram umas férias e tanto para Anna.

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