Divagações: Mother!
21.9.17
É fácil sair de Mother! completamente desnorteado. Por alguns momentos, eu realmente me perguntei como diabos conseguiria escrever a respeito de um filme sobre o qual tinha minhas dúvidas se realmente havia entendido e cuja a experiência é muito mais sensorial e subjetiva do que algo que pode ser facilmente colocado no papel. Mas as ideias amadurecem e resolvi encarar o desafio de falar um pouco sobre o novo filme de Darren Aronofsky, ainda mais em vista a recepção terrível que o filme tem tido nas bilheterias internacionais, o que ao meu ver é uma injustiça compreensível.
O que à primeira vista parece ser um filme sobre a relação complicada de um poeta com um bloqueio criativo (Javier Bardem) e sua esposa (Jennifer Lawrence) em uma casa isolada, logo se torna algo a mais, iniciando-se com a visita inesperada de um médico (Ed Harris) e depois a chegada de sua esposa (Michelle Pfeiffer). Esse acontecimento aparentemente inócuo dá o pontapé inicial para grandes mudanças na vida do casal, em uma história em que nada é o que parece e todos aparentam ter algo a esconder.
Repleto de metáforas e alegorias, esse é um longa-metragem realmente denso e com uma história não é muito óbvia de início. Porém, ele também não suficientemente críptico a ponto de não ser compreensível, tendo uma estrutura narrativa convencional a despeito da maneira provocativa como as coisas são colocadas. Talvez, para quem não pegou essas referências e esses símbolos – que vão da Bíblia a Rosemary's Baby –, o filme possa perder um pouco de significado e algumas situações possam não fazer muito sentido. Ainda assim, Mother! é um filme que busca fazer provocações e gerar reflexões, então, muita coisa depende mais da boa vontade de quem assiste do que da disposição da produção em deixar certas coisas claras.
Tanto é que antes de ver o filme poucos sabiam exatamente do que ele se tratava ou do seu tom. Seria ele um terror? Um suspense? Uma viagem existencial? Mother! é ao mesmo tempo todas essas coisas e nenhuma delas, tratando de temas tão diversos como casamento, maternidade, fama, meio ambiente, religião e violência de uma forma tão holística que é difícil definir qual é o ponto central de sua narrativa. Dessa forma, ainda que seja um ótimo filme para se discutir em detalhes, é terrível para quem quer falar sobre ele de modo breve e sem entregar demais.
Dito isso, Mother! é um filme sobre desconforto e apreensão, é um pesadelo kafkiano tornado real onde o espectador nunca realmente sabe o que está acontecendo e não tem tempo para respirar e colocar as peças no lugar, é uma espécie de descida a loucura em um caos orquestrado e que certamente vai deixar muita gente coçando a cabeça e se perguntando o que diabos acabou de ver. Em suma, apesar do seu elenco conhecido e sua grande distribuição, esse não é lá um filme com um grande apelo mainstream e vai desagradar quem queria apenas um entretenimento mais tradicional.
Mesmo que seja encarado como uma ‘peça de arte’, o longa-metragem ainda pode desagradar a muitos por seus excessos, pela maneira nada sutil que demonstra seus pontos e pela prevalência de formas alegóricas ao invés de real substância em seu texto em relação ao subtexto. Inclusive, talvez a superfície seja a parte mais desinteressante da obra no geral. No geral, esse é o tipo de filme que facilmente pode ser chamado de pretensioso e grandiloquente demais – até entre aqueles que gostam de ver uma boa dose de ambição no cinema.
O que resta é um filme absolutamente polarizante, mas que pode ter um grande valor para o público certo, deixando o errado completamente furioso e com aquela impressão de ter perdido duas horas da sua vida. Então, recomendar uma produção como essa é sempre muito, mas muito complicado – é o tipo de coisa que uma pessoa tem que ser ver por sua própria conta e risco. Quanto a mim, considero que Aronofsky atingiu seu objetivo de me fazer pensar e quebrar a cabeça para entender o que ele queria dizer. O fato de que o filme continua na minha cabeça depois de algum tempo fora da sala é uma prova desse sucesso. Para o bem ou para o mal, Mother! é memorável e a coisa mais diferente nos cinemas nos últimos tempos.
Outras divagações:
Black Swan
Noah
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
O que à primeira vista parece ser um filme sobre a relação complicada de um poeta com um bloqueio criativo (Javier Bardem) e sua esposa (Jennifer Lawrence) em uma casa isolada, logo se torna algo a mais, iniciando-se com a visita inesperada de um médico (Ed Harris) e depois a chegada de sua esposa (Michelle Pfeiffer). Esse acontecimento aparentemente inócuo dá o pontapé inicial para grandes mudanças na vida do casal, em uma história em que nada é o que parece e todos aparentam ter algo a esconder.
Repleto de metáforas e alegorias, esse é um longa-metragem realmente denso e com uma história não é muito óbvia de início. Porém, ele também não suficientemente críptico a ponto de não ser compreensível, tendo uma estrutura narrativa convencional a despeito da maneira provocativa como as coisas são colocadas. Talvez, para quem não pegou essas referências e esses símbolos – que vão da Bíblia a Rosemary's Baby –, o filme possa perder um pouco de significado e algumas situações possam não fazer muito sentido. Ainda assim, Mother! é um filme que busca fazer provocações e gerar reflexões, então, muita coisa depende mais da boa vontade de quem assiste do que da disposição da produção em deixar certas coisas claras.
Tanto é que antes de ver o filme poucos sabiam exatamente do que ele se tratava ou do seu tom. Seria ele um terror? Um suspense? Uma viagem existencial? Mother! é ao mesmo tempo todas essas coisas e nenhuma delas, tratando de temas tão diversos como casamento, maternidade, fama, meio ambiente, religião e violência de uma forma tão holística que é difícil definir qual é o ponto central de sua narrativa. Dessa forma, ainda que seja um ótimo filme para se discutir em detalhes, é terrível para quem quer falar sobre ele de modo breve e sem entregar demais.
Dito isso, Mother! é um filme sobre desconforto e apreensão, é um pesadelo kafkiano tornado real onde o espectador nunca realmente sabe o que está acontecendo e não tem tempo para respirar e colocar as peças no lugar, é uma espécie de descida a loucura em um caos orquestrado e que certamente vai deixar muita gente coçando a cabeça e se perguntando o que diabos acabou de ver. Em suma, apesar do seu elenco conhecido e sua grande distribuição, esse não é lá um filme com um grande apelo mainstream e vai desagradar quem queria apenas um entretenimento mais tradicional.
Mesmo que seja encarado como uma ‘peça de arte’, o longa-metragem ainda pode desagradar a muitos por seus excessos, pela maneira nada sutil que demonstra seus pontos e pela prevalência de formas alegóricas ao invés de real substância em seu texto em relação ao subtexto. Inclusive, talvez a superfície seja a parte mais desinteressante da obra no geral. No geral, esse é o tipo de filme que facilmente pode ser chamado de pretensioso e grandiloquente demais – até entre aqueles que gostam de ver uma boa dose de ambição no cinema.
O que resta é um filme absolutamente polarizante, mas que pode ter um grande valor para o público certo, deixando o errado completamente furioso e com aquela impressão de ter perdido duas horas da sua vida. Então, recomendar uma produção como essa é sempre muito, mas muito complicado – é o tipo de coisa que uma pessoa tem que ser ver por sua própria conta e risco. Quanto a mim, considero que Aronofsky atingiu seu objetivo de me fazer pensar e quebrar a cabeça para entender o que ele queria dizer. O fato de que o filme continua na minha cabeça depois de algum tempo fora da sala é uma prova desse sucesso. Para o bem ou para o mal, Mother! é memorável e a coisa mais diferente nos cinemas nos últimos tempos.
Outras divagações:
Black Swan
Noah
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
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