Divagações: Camp X-Ray
21.11.17
É estranho como um filme pode ser cruel e pesado sem apelar para grandes cenas de violência ou momentos de sofrimento. Camp X-Ray, por exemplo, é quase tão seco e higienizado quanto o local que retrata, mas a falta de humanidade e de compaixão ultrapassa as barreiras da tela e começa a machucar até mesmo quem está do outro lado. A única saída para se livrar disso é se tornar frio e indiferente, como alguns dos personagens optam por fazer – e você não pode nem ao menos culpá-los por isso. É uma situação ingrata e que representa um lugar de verdade, embora a produção não seja diretamente baseada em situações reais.
O filme, que tem menos de duas horas de duração, mostra pouco sobre o que aconteceu (e talvez ainda aconteça) na base militar dos Estados Unidos localizada na Baía de Guantánamo, mas já se sabe um bocado sobre as torturas realizadas. E, por mais que Barack Obama tenha tentado encerrar as atividades (esbarrando em seu congresso) e tenha efetivamente reduzido significativamente o número de ‘detidos’ (uma denominação que escapa à Convenção de Genebra), o atual presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que se trata de um local para ser enchido de “caras malvados”. “Não me diga tortura não funciona – a tortura funciona (...) E, se não funcionar, eles mereceram de qualquer maneira”, afirmou. Vale lembrar que nenhum dos ‘detidos’ foi formalmente acusado de qualquer crime.
Voltando ao filme. Camp X-Ray conta a história do tempo de serviço de Amy Cole (Kristen Stewart) no Campo de Detenção de Guantánamo. Ela é uma jovem que está tentando um espaço na carreira militar e que tem um perfil adequado para isso – sabe as regras, é disciplinada e quer fazer a diferença para seu país. Ela assume com firmeza as tarefas de vigilância constante dos detidos e tem uma necessidade constante de se provar. Contudo, a convivência com os colegas e com os prisioneiros acaba a aproximando de Ali (Payman Maadi), um dos detidos com comportamentos mais ‘selvagens’ e que demonstra uma real carência de se comunicar com alguém. Os dois têm breves conversas entre as barras (por assim dizer) e dividem um pouco de seu mundo um com o outro. A relação, obviamente, não passa desapercebida por alguns colegas de Cole, que tornam sua vida no local ainda mais difícil.
Escrito e dirigido pelo estreante Peter Sattler, o filme não se entrega a momentos emocionais fáceis e segura a barra com força. Isso funciona particularmente bem para Kristen Stewart, que trabalha melhor nas sutilezas do que em grandes rompantes. Além disso, o real desafio estava nas costas de Payman Maadi, que precisava esboçar uma gama variada de sentimentos e as consequências do que havia acontecido com seu personagem por meio de comportamentos aparentemente sem sentido e sendo frequentemente retratado por um ângulo bastante limitado, a janelinha na porta de sua cela solitária. Mesmo com duas missões tão diferentes, a dupla de protagonistas entrega a empatia necessária para fazer com que a história seja crível, ainda que a distância entre os dois nunca seja totalmente superada.
O detalhe é que, apesar de ser totalmente centrado nos protagonistas, é por meio da observação dos personagens secundários que Camp X-Ray se torna realmente interessante. Os colegas de Cole (e de Ali) retratam alguns padrões de comportamento que demonstram estratégias adotadas frequentemente por pessoas em situações indesejáveis. Alguns se fecham intelectualmente e vivem de acordo com o senso comum, sem qualquer espaço para pensamentos críticos ou independentes. Outros se tornam violentos e descontam suas frustrações nos demais – sejam colegas ou detidos. Também há aqueles que contam os dias para o fim. E, por fim, há quem se console com uma posição de superioridade, o que pode ser ainda mais perigoso.
No futuro, talvez Camp X-Ray seja um daqueles filmes exibidos na escola, para que os alunos entendam um determinado momento histórico. Os estudantes, obviamente, vão odiar o ritmo lento, a personalidade da protagonista e a falta de grandes cenas de ação ou emoção. Mas, sinceramente, eu espero que isso aconteça. É uma perspectiva muito mais animadora do que ter um futuro onde um filme como esse caia totalmente no esquecimento ou, pior, seja tido como uma ‘visão não recomendada’ dos acontecimentos.
O filme, que tem menos de duas horas de duração, mostra pouco sobre o que aconteceu (e talvez ainda aconteça) na base militar dos Estados Unidos localizada na Baía de Guantánamo, mas já se sabe um bocado sobre as torturas realizadas. E, por mais que Barack Obama tenha tentado encerrar as atividades (esbarrando em seu congresso) e tenha efetivamente reduzido significativamente o número de ‘detidos’ (uma denominação que escapa à Convenção de Genebra), o atual presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que se trata de um local para ser enchido de “caras malvados”. “Não me diga tortura não funciona – a tortura funciona (...) E, se não funcionar, eles mereceram de qualquer maneira”, afirmou. Vale lembrar que nenhum dos ‘detidos’ foi formalmente acusado de qualquer crime.
Voltando ao filme. Camp X-Ray conta a história do tempo de serviço de Amy Cole (Kristen Stewart) no Campo de Detenção de Guantánamo. Ela é uma jovem que está tentando um espaço na carreira militar e que tem um perfil adequado para isso – sabe as regras, é disciplinada e quer fazer a diferença para seu país. Ela assume com firmeza as tarefas de vigilância constante dos detidos e tem uma necessidade constante de se provar. Contudo, a convivência com os colegas e com os prisioneiros acaba a aproximando de Ali (Payman Maadi), um dos detidos com comportamentos mais ‘selvagens’ e que demonstra uma real carência de se comunicar com alguém. Os dois têm breves conversas entre as barras (por assim dizer) e dividem um pouco de seu mundo um com o outro. A relação, obviamente, não passa desapercebida por alguns colegas de Cole, que tornam sua vida no local ainda mais difícil.
Escrito e dirigido pelo estreante Peter Sattler, o filme não se entrega a momentos emocionais fáceis e segura a barra com força. Isso funciona particularmente bem para Kristen Stewart, que trabalha melhor nas sutilezas do que em grandes rompantes. Além disso, o real desafio estava nas costas de Payman Maadi, que precisava esboçar uma gama variada de sentimentos e as consequências do que havia acontecido com seu personagem por meio de comportamentos aparentemente sem sentido e sendo frequentemente retratado por um ângulo bastante limitado, a janelinha na porta de sua cela solitária. Mesmo com duas missões tão diferentes, a dupla de protagonistas entrega a empatia necessária para fazer com que a história seja crível, ainda que a distância entre os dois nunca seja totalmente superada.
O detalhe é que, apesar de ser totalmente centrado nos protagonistas, é por meio da observação dos personagens secundários que Camp X-Ray se torna realmente interessante. Os colegas de Cole (e de Ali) retratam alguns padrões de comportamento que demonstram estratégias adotadas frequentemente por pessoas em situações indesejáveis. Alguns se fecham intelectualmente e vivem de acordo com o senso comum, sem qualquer espaço para pensamentos críticos ou independentes. Outros se tornam violentos e descontam suas frustrações nos demais – sejam colegas ou detidos. Também há aqueles que contam os dias para o fim. E, por fim, há quem se console com uma posição de superioridade, o que pode ser ainda mais perigoso.
No futuro, talvez Camp X-Ray seja um daqueles filmes exibidos na escola, para que os alunos entendam um determinado momento histórico. Os estudantes, obviamente, vão odiar o ritmo lento, a personalidade da protagonista e a falta de grandes cenas de ação ou emoção. Mas, sinceramente, eu espero que isso aconteça. É uma perspectiva muito mais animadora do que ter um futuro onde um filme como esse caia totalmente no esquecimento ou, pior, seja tido como uma ‘visão não recomendada’ dos acontecimentos.
0 recados