Os fãs de animação que estão acompanhando a gestão atual da Warner passaram um bom tempo acumulando derrotas. Séries aclamadas produzidas pelo estúdio, como Infinity Train, desapareceram de todos os serviços e lojas digitais; além disso, houve o cancelamento de filmes já terminados, como Coyote v. Acme e Scoob!: Holiday Haunt. Ou seja, o futuro da divisão de animação da empresa parecia bastante incerto.
Felizmente, com uma ajudinha da Ketchup Entertainment, Coyote v. Acme foi tirado das prateleiras empoeiradas da Warner e, também, foi permitido que The Day the Earth Blew Up: A Looney Tunes Movie pudesse ver a luz do dia. Este lançamento, aliás, é algo admirável, considerando que estes personagens estão longe do seu ápice como ícones da cultura popular e que o filme que bebe muito do seu formato clássico, sobretudo dos desenhos de Bob Clampett dos anos 1930.
Ou seja, a produção tem uma pegada mais surreal do que a versão um pouco mais moderada de Chuck Jones (aquela com que a maior parte do público tem mais familiaridade). Assim, não temos nenhuma aparição desnecessária de celebridades, nenhuma sequência em live action e nada além dos personagens de Looney Tunes sendo eles mesmo em uma aventura em animação tradicional bastante caprichada.
Isso é, ao mesmo tempo, uma bênção e uma maldição. Como dizem: em terra de cegos, quem tem olho é rei. Ou seja, em um cenário onde os fãs passaram décadas sem um lançamento de peso, mesmo um filme que é bastante derivativo das dinâmicas que já foram exploradas no passado parece bastante fresco. Suponho que a sua tolerância para isso vai depender da sua exposição a estes tropos clássicos.
O comprometimento com o passado parece até se mostrar na estrutura do filme. Em vez de apelar para personagens mais famosos, como o próprio Bugs Bunny/Pernalonga para esse esforço, o filme aposta na dupla Porky Pig/Gaguinho (Eric Bauza/Manolo Rey) e Daffy Duck/Patolino (Eric Bauza/Márcio Simões).
Criados juntos desde a infância, os dois agora precisam lidar com a eminente demolição da sua casa, atingida por um meteoro. Para tentar salvar seu lar, eles começam a trabalhar em uma fábrica de chiclete, acompanhados por Petunia Pig/Petúnia (Candi Milo/Carol Crespo), uma porquinha cientista. Nesse processo, descobrem uma conspiração encabeçada pelo The Invader/Invasor (Peter MacNicol/Ulisses Bezerra) uma entidade alienígena que está alterando os chicletes para controlar a mente dos terráqueos.
A partir disso, The Day the Earth Blew Up: A Looney Tunes Movie faz muito bem aquilo que se propôs – a comédia pastelão típica destes personagens não deixa nada a desejar e é muito bem animada. As piadas visuais e as relações entre os personagens me lembraram um pouco de Ren & Stimpy (mas sem os seus elementos mais grotescos). E, apesar de não ter a primazia técnica que um longa de animação pode apresentar, é compreensível, uma vez que esse projeto não era de primeira prioridade.
De qualquer modo, a dinâmica dos personagens é bacana e fico contente em ver tanto Patolino quanto Gaguinho sendo mais bem explorados, indo além das suas relações mais comuns. Sem a presença de Pernalonga, Patolino é o maior responsável pelos exageros cartunescos e as coisas mais “lunáticas” da história, enquanto a relação entre Gaguinho e Petúnia é bastante fofa, sendo um dos elementos novos que funciona.
Por sua vez, a dublagem nacional é caprichada como o esperado. Sem “participações especiais” e com um time de profissionais afiados, que trabalham com estes personagens há muito tempo, o áudio cai bem aos ouvidos. Realmente, o filme soa como qualquer outro desenho que passava durante as manhãs na televisão e, para mim, isso é ótimo em um cenário onde youtubers e influencers apinham as equipes de dublagem de qualquer coisa minimamente considerada para o público infantil.
Entendo que talvez haja pouco espaço para esse tipo de produção hoje em dia. Só consigo imaginar o desafio que é convencer o público a ir para os cinemas ver uma animação tradicional que, fundamentalmente, é uma coleção de piadas sem um elemento narrativo muito forte (ainda mais quando o filme saiu lá fora em novembro). Mas é por isso mesmo que considero The Day the Earth Blew Up: A Looney Tunes Movie como um filme relevante para ser visto aos fãs de animação.
O longa-metragem pode não ser o melhor exemplar da sua espécie, mas se esforça para nadar contra a corrente e oferecer uma experiência genuína, sendo reverente ao passado sem apoiar unicamente em nostalgia. Por conta disso, eu encaro a produção com respeito e fico genuinamente feliz que ela tenha suas chances no cinema – até mesmo no Brasil, onde eu jurava que ficaria relegado as plataformas de streaming. Se você ecoa esse sentimento, não dá para dizer que não são 90 minutos bastante divertidos.
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle
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