Quando saí de casa em uma tarde de terça-feira para assistir a um documentário nacional, eu definitivamente não esperava encontrar uma sala de cinema lotada. Mas suponho que essa é a magia de Rita Lee.
Por meio do resgate de entrevistas antigas, participações em programas de televisão e depoimentos filmados com a cantora já em idade avançada – quando já estava transformada em escritora –, Ritas tenta contar a trajetória de uma carreira (e, eventualmente, de um romance). Ao mesmo tempo, a produção também busca apresentar o ser humano por trás daquelas maluquices todas (mas só apresentar mesmo, porque explicar é impossível).
Para quem já acompanhava a obra de Rita Lee, suponho que há poucas novidades reais; mesmo assim, é preciso admitir que o documentário é um deleite para os olhos. Afinal, por mais que os livros sejam ótimos, engraçados e informativos, nada se compara a ver uma série de performances. Inclusive, eu estava em um cinema, mas faltou pouco para que o local fosse confundido com uma sala de espetáculos.
Com uma música atrás da outra, o documentário mostra diferentes fases da carreira de Rita Lee, apresenta as dificuldades inerentes a cada uma delas e vincula com o momento pessoal vivido pela artista. Para manter um ritmo frenético, Ritas faz um uso bem econômico de entrevistas com outras pessoas e, considerando a amplitude do escopo, fica evidente a falta uma profundidade maior. A duração de menos de uma hora e meia é realmente muito breve.
Para mim, enquanto as imagens do show que a levaram a ser excomungada estão entre as mais divertidas, as cenas de uma de suas últimas apresentações foram as mais sofridas. Nunca tive a oportunidade de ver Rita Lee ao vivo, mas tenho orgulho de gostar de uma artista que foi capaz de se expressar contra a violência policial de cima de um palco a ponto de ser presa por isso.
Aliás, embora Ritas seja oficialmente dirigido por Oswaldo Santana e Karen Harley, sinto que a cantora talvez merecesse um crédito. Em suma, além de contar com uma entrevista exclusiva que ajuda a direcionar a narrativa, o filme também possui sequências filmadas pela própria Rita, por celular, revelando momentos íntimos e reflexões muito individuais, inclusive sobre a morte.
Não à toa, a produção tem sido vendida como fazendo parte de um processo de “arqueologia pessoal” e realmente há muito disso; um vasculhar pelas memórias em busca de tesouros, muitas vezes com um valor cultural e histórico superior ao monetário. A expressão também se enquadra no extensivo uso de fotografias, que tanto eternizam momentos quanto parecem organizar o caos.
Com isso, é preciso admitir que Ritas talvez funcione melhor com quem já está propenso a gostar da produção (e, de preferência, tenha memórias afetivas que se confundam com as canções). A maneira escolhida para contar uma história tão rica traz algo de psicodélico, que combina com a retratada, mas também pode confundir alguém que caia de paraquedas. Se esse for o seu caso, espero que o filme seja capaz de instigar a curiosidade e a vontade de saber mais – Santa Rita Lee, afinal de contas, merece a eternidade.
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