Divagações: Vermiglio

Vermiglio

Antes de assistir Vermiglio, eu tentei convencer uma pessoa a me fazer companhia. Nesse processo, li uma série de sinopses que traziam variações das mesmas informações (todas falavam sobre o mesmo filme, afinal!), mas sem muitos detalhes – e algumas, aliás, deixavam elementos bem importantes de fora. Ao efetivamente ver o filme, percebi que ele é mais interessante que todas elas. Então, vou fazer um esforço para apresentar a produção sob uma luz diferente.

A história se passa em uma vila isolada nos alpes italianos. Durante os anos finais da 2ª Guerra Mundial, o local recebe de volta um de seus rapazes (Santiago Fondevila) em circunstâncias complicadas: machucado, ele vem fugido das tropas inimigas nos ombros de um companheiro, Pietro Riso (Giuseppe De Domenico), que é natural da Sicília. Na posição de desertores, eles precisam do apoio dos demais para permanecerem ocultos até o fim da guerra. 

A recepção para o “forasteiro” quietão, entretanto, é mista – alguns expressam gratidão e outros enxergam apenas um estranho, que fala outro dialeto. Entre os que se colocam a favor do recém-chegado está o professor da escolinha local, Cesare Graziadei (Tommaso Ragno), um homem rígido e com uma penca de filhos, mas que parece ser justo e esclarecido. E essa aproximação faz com que Pietro e a filha mais velha do professor, Lucia (Martina Scrinzi), acabem iniciando um relacionamento.

Contudo, uma grande desilusão não demora a atingir a todos, afetando Lucia em especial. É a partir desse momento que os personagens mostram suas verdadeiras crenças, lealdades e falhas. Para completar, com o fim da guerra e a necessidade de se reconstruírem emocionalmente, várias dessas pessoas precisarão buscar novos caminhos.

Dessa forma, Vermiglio retrata o fim de um período muito específico. Afinal, sabemos que haverá uma grande revolução tecnológica e cultural em breve. Há até um vestígio disso, com a mãe da família, Adele (Roberta Rovelli), expressando seus descontentamentos e com a irmã do meio, Ada (Rachele Potrich), descobrindo sua sexualidade com um empurrão da rebelde local (Carlotta Gamba). 

Não por acaso, a diretora e roteirista Maura Delpero colocou os irmãos dessa família (Patrick Gardner e Enrico Panizza) em posições de ignorância e/ou inocência. Já a irmã mais nova, Flavia (Anna Thaler), parece ser destinada a sair do vilarejo e buscar algo melhor e maior para si mesma. É chegado o momento de as mulheres conquistarem seus espaços. Também são elas que passarão essas histórias adiante, já que o filme se baseia em relatos da própria família da cineasta.

Esse processo de mudança, entretanto, é difícil, sofrido e lento. Em um local rodeado de montanhas, há muito silêncio e a paisagem vai demarcando as estações do ano (a trilha sonora é bela e esparsa; portanto, também é bem demarcada). Dia após dia, tudo o que os personagens fazem é tentar sobreviver, produzindo seus próprios alimentos e tentando manter uma relação cordial com os vizinhos.

Vermiglio, obviamente, não combina nem um pouco com essa temporada de blockbusters que está se desenhando, mas suponho que seu lançamento funcione justamente para que exista uma alternativa (ainda que em poucas salas), com algo mais lento e reflexivo. Este é, sem dúvida, um filme muito bem construído e que traz uma série de pontos interessantes – resta saber se ele vai encontrar seu público.

Comentários