A Disney parece não ter a menor ideia do que fazer com diversas franquias – e Tron é um destes casos. Ao mesmo tempo em que é um marco estético e uma obra surpreendentemente influente, o título atrai pouca gente enquanto um universo ficcional. Para completar, com todas as mudanças nas relações entre a sociedade e a tecnologia vistas nos últimos 40 anos, sua narrativa central está cada vez mais desconectada da realidade, o que prejudica novas obras.
Tron: Legacy até tentou levantar o interesse do público (que estava no chão) e, ainda que a opinião popular sobre a obra pareça ter melhorado de quinze anos para cá, tudo o que as pessoas realmente se lembram é da excelente trilha sonora do filme. Ou seja, a pergunta que fica no ar é: “Quem realmente precisa de um novo Tron?”
Mais do que isso. Quem precisa de um novo Tron estrelando Jared Leto, que tem sido uma figura controversa na sua vida pessoal e artística? Ligado a algumas “bombas”, como Morbius, o ator acaba sendo uma escolha difícil de entender. De qualquer modo, independente dessas conjecturas e contra todas as expectativas, Tron: Ares está aí, com a clara intenção de “marvelizar” a marca e tentar emplacar um sucesso para a Disney, que está com dificuldades de voltar às graças do público.
Reciclando parte do argumento do antecessor, Tron: Ares traz uma continuidade meio torta do universo. Kevin Flynn (Jeff Bridges) continua desaparecido e seu filho abandonou a direção da Encom em algum ponto, fazendo com que a posição de CEO recaísse sobre Eve Kim (Greta Lee). Ela, por sua vez, revigorou a empresa e agora estuda os algoritmos deixados por Flynn, como uma forma de fazer a ponte entre o Grid e o mundo real.
Percebendo a aproximação desta descoberta, Julian Dillinger (Evan Peters), o ambicioso CEO de uma empresa rival, também busca usar as propriedades do Grid para dominar o mercado. Para isso, ele cria Ares (Jared Leto), um sofisticado software de defesa para agir dentro e fora do mundo digital, com o propósito de tomar para si o programa que permitiria a permanência de objetos do Grid em nosso universo.
Assim, Tron: Ares tenta se diferenciar de seus antecessores por se passar majoritariamente fora dos computadores. O personagem do título é um meio Pinóquio, meio Exterminador do Futuro que ambiciona quebrar suas diretrizes para existir no mundo real como um ente autônomo.
Porém, ao abandonar parcialmente sua ambientação, Ares é menos visualmente espetacular e tem uma estranha noção de escala, em que tudo parece surpreendentemente pequeno, próximo e desimportante – especialmente porque todas as localidades do filme estão a meia hora de distância umas das outras.
Isso poderia não ser um problema se o filme se comprometesse a ser uma ficção-científica mais cabeçuda, com algum tipo de discussão interessante sobre inteligência artificial, transumanismo e as implicações éticas de programas de computador sencientes. Mas Tron sempre foi mais estilo do que substância, e isso não muda.
O roteiro tem a profundidade de uma poça d’água e poucas intenções de fazer qualquer comentário interessante sobre os seus temas. Os personagens também são meio chatos. Greta Lee faz o que pode com o seu drama pessoal, mas o filme dá pouquíssimo espaço para qualquer desenvolvimento.
Já Ares é um personagem mais interessante por natureza, mas a sua “gradual” humanização é inexistente e tudo soa muito brusco e repentino. Em contrapartida, pelo menos sua inflexão robótica exige poucos músculos dramáticos de Leto, que não chega a atrapalhar.
Tal como em Tron: Legacy, esta produção se salva totalmente no quesito música. Sai Daft Punk e entra Nine Inch Nails, com um som mais “limpo” do que a trilha com muita textura da dupla francesa, mas ainda assim bem competente; Trent Reznor entrega um som energético e que casa bem com o filme. Não há nenhuma faixa tão icônica quanto Derezzed, mas também não acho que dá para reclamar muito nesse quesito.
Tron: Ares ainda me soa como um filme dispensável e que não está comprometido em fazer nada realmente interessante com o seu universo. É a grande sina desse vício em sequências que atinge os grandes estúdios de Hollywood – com direito a uma cena pós-créditos apontando para uma continuação que talvez nunca aconteça.
Quando ele se dedica ao espetáculo visual e auditivo, o filme é divertido. Isso inclui uma ótima, ainda que breve, recriação do universo do filme de 1982 (surpresa já estragada pelos trailers, infelizmente) e algumas cenas bacanas dentro do Grid, com o mesmo charme de sempre.
Mas, sem nenhum peso dramático, Tron: Ares não para em pé, sendo só um show de luzes e cores por duas horas. Não é nem de longe a bomba que eu esperava, considerando o histórico recente do estúdio com esse tipo de continuação, mas não acredito que “nem fede nem cheira” possa ser considerado um elogio.
Outras divagações:
Tron: Legacy
Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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