Divagações: Jersey Boys

Mesmo que Jersey Boys tenha tudo para ser um projeto interessante – quem não ficaria intrigado para ver a adaptação de um musical da Bro...

Mesmo que Jersey Boys tenha tudo para ser um projeto interessante – quem não ficaria intrigado para ver a adaptação de um musical da Broadway dirigido por Clint Eastwood? – não consegui deixar de pensar que, talvez, a hora de conhecer a trajetória musical de Frankie Valli e do The Four Seasons já passou.

Para quem cresceu na cultura do American Bandstand, a nostalgia pode ser um atrativo significativo, porém, para os brasileiros que atravessaram os anos 1960 e 1970 mergulhados na bossa e na tropicália, esses nomes são de ilustres desconhecidos. Não há como se negar que, para quem nunca ouviu os grandes sucessos da banda, assistir Jersey Boys se torna um exercício bastante diferente daquele visualizado por Eastwood, para o bem ou para o mal.

No filme, acompanhamos a história de um grupo de rapazes ítalo-americanos que crescem em uma perigosa Nova Jersey dos anos 1960. Inspirado pelo problemático Tommy DeVito (Vincent Piazza) e seu colega Nick Massi (Michael Lomenda), o talentoso Frankie Valli (John Lloyd Young) acaba entrando para o mundo da música. O trio vê no trabalho do compositor e cantor Bob Gaudio (Erich Bergen) a chance de partir para o estrelato, tornando-se o grupo The Four Seasons e embarcando em uma longa estrada de sucessos, discussões, paixões, brigas, envolvimento com a máfia e problemas financeiros.

Ainda que de início o filme pareça um pouco genérico, seu elenco extremamente talentoso e seu tom divertido e descompromissado conseguem equilibrar muito bem o drama e o humor, dando substância e energia a uma história que não se afasta muito do que já era esperado de uma cinebiografia como essa. É claro que a culpa da trama um pouco previsível não é da produção, porém, a ausência de grandes surpresas faz com que o roteiro carregue no melodrama para manter as coisas mais interessantes.

Jersey Boys ainda consegue realizar um diálogo bastante interessante com o teatro. Resultado da experiência de parte do elenco e da equipe técnica na realização do espetáculo da Broadway, o filme traz uma dose do intimismo e de contato direto com o espectador. Infelizmente, este recurso – que casa muito bem com o tom inicial do filme – é esquecido lá pela metade da trama e retorna com mais intensidade em momentos um pouco inadequados, transformando certas sequências que precisariam de sutileza em uma série de diálogos excessivamente expositivos.

Ainda assim, não é preciso dizer que as musicas são muito boas e bem interpretadas, sobretudo pela ótima performance de John Lloyd Young, que não faz feio em emular o falseto poderoso que consagrou Frankie Valli. As canções são bem inseridas durante o filme e pontuam muito bem os momentos pelos quais os personagens passam. A ambientação também é competente, transmitindo o clima da era de ouro do rock americano com seus terninhos e uma malandragem quase que ingênua.

Porém, sinto que talvez esse filme só possa ser verdadeiramente apreciado se você for um fã da banda ou alguém com um contato maior com o meio musical. Sem essa carga emocional, algumas falhas do filme se tornam um pouco evidentes, como a irregularidade do roteiro ou a existência de muitas cenas que soam atropeladas ou desnecessárias para o desenrolar da trama, prejudicando o desenvolvimento dos personagens e, muitas vezes, tirando o aspecto orgânico que torna outras partes do filme interessantes.

Jersey Boys é empolgante e divertido, mas está longe de ser brilhante, faltando certa qualidade intangível que o tornaria algo memorável. Seus problemas de ritmo são os mesmos que atingem os trabalhos recentes de Clint Eastwood como diretor, porém, por se tratar de uma obra mais leve e despretensiosa, são defeitos fáceis de relevar. Quer você seja um fã de musicais ou do The Four Seasons, Jersey Boys é um filme sólido e merece ser visto, só não é uma grande obra prima. Mas se nem as músicas da banda tinham a intenção de o ser, por que o filme seria diferente?

Outras divagações:


Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

RELACIONADOS

0 recados