Divagações: Sakasama no Patema
6.11.14
Eu não me surpreenderia se, algum dia, anunciarem a adaptação de Sakasama no Patema para um filme hollywoodiano estrelando jovens nomes da ação – e alguns veteranos do gênero para acompanhar. Embora essa animação não seja exatamente focada em perseguições e correrias, há algumas sequências que mostram o potencial.
A história se passa em um mundo que pode ou não ser a Terra. Embaixo do solo, vivem muitas pessoas com um estilo de vida modesto e feliz, mas a jovem Patema (Yukiyo Fujii) sonha em sair dos túneis e conhecer o ar livre. Em um acidente, ela consegue realizar seu desejo e conhece um menino da sua idade, Age (Nobuhiko Okamoto). Ele é um jovem revoltado com o regime totalitarista de sua cidade e quer saber exatamente o que aconteceu com o mundo. Detalhe: os dois possuem gravidades invertidas. No mundo de Age, Patema fica de ponta-cabeça, sendo atraída para o céu (e vice-versa).
Obviamente, fica difícil buscar explicações científicas para uma premissa dessas, de modo que alguns personagens do filme assumem um fervor fanático-religioso, especialmente o ‘ditador’ Izamura (Takaya Hashi). Essa opção fica bem interessante, uma vez que a tão buscada liberdade da protagonista acaba trazendo novos mistérios e abrindo perspectivas. Ela procura sua liberdade, mas acaba encontrando algo muito maior e levando esperança para Age.
Observado de forma metafórica, Sakasama no Patema pode ter muitos significados. O filme pode ser comparado à Alemanha nazista e a diversos regimes políticos e religiões. Mesmo tendo crianças em idade escolar como protagonistas, as questões levantadas pela produção não são simples nem fáceis de responder.
Além disso, Patema – uma princesa com ares de ‘salvadora’ – representa um papel que dificilmente é feminino, pois é curiosa, exploradora, esperta e motivada; sem deixar de ter seus mimos e medos. Por sua vez, Age surge como uma figura mais emocional. Enquanto ela parece razoavelmente conformada pela perda de seu mentor, Lagos (Masayuki Katô), ele ainda sofre pelo assassinato de seu pai, Eiichi, o que motiva sua revolta social.
Como animação, Sakasama no Patema merece destaque especialmente pela riqueza de detalhes dos cenários. A iluminação das cenas ajuda a estabelecer as relações emocionais dos personagens e todo o design é muito bem pensado. Com roteiro e direção de Yasuhiro Yoshiura, a trama pode até eventualmente se parecer com uma aventura alongada de um anime para televisão, mas seu desfecho garante que ninguém saia insatisfeito da sessão – confuso, talvez.
Não muito indicado para pessoas com problemas de labirintite, o longa-metragem alterna de maneira criativa entre as perspectivas de Patema e Age, dando ao espectador relances de como seria ter sua gravidade invertida, mas evitando deixar seu público de ponta-cabeça por muito tempo. Contudo, o grande trunfo do filme é sua capacidade de incluir novos mistérios ao longo de toda a trama, sem fazer um esforço aparente para resolver todas as questões.
Sakasama no Patema, ainda assim, consegue ser uma produção leve. Indicada para pessoas de diversas idades, a história consegue servir de entretenimento para diferentes graus de compreensão. É um filme diferente de qualquer outro que está passando no cinema e merece ser visto antes que surja uma versão mais focada em lutas e efeitos especiais que em colocar o espectador para pensar.
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