Divagações: Joker: Folie à Deux

Em 2019, o diretor Todd Phillips disse que não tinha interesse em uma continuação de Joker e que esse não era o tipo de filme em que uma s...

Joker: Folie à Deux
Em 2019, o diretor Todd Phillips disse que não tinha interesse em uma continuação de Joker e que esse não era o tipo de filme em que uma sequência faria sentido. Entretanto, depois de US$ 1 bilhão na bilheteria e o desespero da Warner em tentar emplacar alguma coisa da DC, não há integridade artística que resista.

A verdade é que Phillips tentou de verdade e que esse não é um filme preguiçoso. Eu realmente acredito que toda a equipe de produção tentou o seu melhor para fazer desta uma obra diferente, com algo próprio a dizer. Mas, talvez pelos próprios méritos da produção original, o resultado é algo que trilha os passos do primeiro filme sem entender que ele já havia esgotado o que pretendia dizer.

Inclusive, Joker: Folie à Deux constantemente se refere aos eventos de seu antecessor. O longa-metragem até tenta colocar elementos novos aqui ou ali, mas eles são muito mais estilísticos do que necessariamente transformativos para a trama ou para os personagens, soando geralmente como meras distrações.

Em Joker: Folie à Deux, vemos a repercussão dos atos do primeiro filme. Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) está preso e aguardando julgamento. Ajudado por sua advogada, Maryanne Stewart (Catherine Keener), ele está recebendo tratamento psicológico e pode até ser considerado inimputável, ou seja, ao invés de ser executado pelos seus crimes, Arthur seria levado para um hospital psiquiátrico. Porém, ao conhecer Lee (Lady Gaga) as coisas mudam, já que ela aparenta ser uma grande fã e tenta trazer a faceta dormente de volta a qualquer custo.

Assim, enquanto Joker tinha uma tensão imanente, essa continuação parece estar, tal como seu protagonista, perdida em um mar de expectativas. O filme quer, ao mesmo tempo, ser um drama de personagem (como o anterior), trazer elementos narrativos mais familiares ao universo dos quadrinhos, explorar o controverso formato de musical; e apresentar um grande segmento de filme de tribunal.

Ou seja, Joker: Folie à Deux passa por uma verdadeira crise de identidade. Tentar este monte de coisas enfraquece a mensagem vista no filme de 2019 e deixa de lado boa parte do subtexto.

Mas vamos tirar o elefante da sala. Joker: Folie à Deux é um musical? Em várias métricas, sim, mas eu dificilmente o conceituaria como tal. Os números musicais não são muito memoráveis e raramente são relevantes ou ajudam a explicar a dimensão interna dos personagens. Um deles, talvez dois, são mais significativos, sendo que o melhor (musicalmente falando e de onde vem o único tema recorrente) é diretamente retirado do filme The Band Wagon, de 1953.

Então, esse aspecto da produção parece apenas um veículo para Lady Gaga mostrar suas capacidades. O detalhe é que, ao não se comprometer a ser um musical “de verdade” – onde essa ideia é bem explorada – e ficando em cima do muro, a produção talvez tenha escolhido a pior das alternativas.

Falando nisso, Joaquin Phoenix não é exatamente um cantor no nível de Lady Gaga. Ele até que se segura bem, tentando carregar sua performance muito mais na personalidade do que na técnica, o que funciona com diferentes graus de sucesso. Quanto ao restante, ele tem a capacidade de transformar completamente a aura do personagem, porém, não há o mesmo senso de tragédia e gravidade que visto no filme anterior, de modo que o resultado é menos digno de nota.

Do outro lado da moeda, Lady Gaga é perfeitamente aceitável no papel e convence com uma interpretação da personagem que é claramente inspirada na onda de fãs de true crime obcecadas. Com isso, ela inverte com sucesso a dinâmica natural de poder que normalmente vemos entre os personagens. Ainda assim, não é um trabalho com o mesmo nível de nuances e, comparada a Phoenix, ela termina o filme bem apagada e sem uma catarse.

No geral, Joker: Folie à Deux é um filme competente, mas que nem de longe chega à altura de seu antecessor. As canções não alcançam nenhuma nota nova, de modo que tudo que ele tenta transmitir já estava no filme de 2019 – e de um modo mais interessante e instigante.

A falha completa das instituições sociais, o niilismo constante no mundo contemporâneo (que glorifica comportamentos destrutivos unicamente porque eles são contra o sistema vigente), e o perigo em ignorar esses sinais de alerta: tudo isso já estava presente, só que era melhor executado e não havia a necessidade de jogar esses elementos na nossa cara.

Já quanto à trama mais textual, acredito que o filme também dá uma grande volta para chegar a lugar algum. Embora seu desfecho não seja de todo ruim, sinto que ele apenas piora o que já havia ficado claro anteriormente.

Mas tirem suas próprias conclusões. Joker: Folie à Deux é um filme que pode ir de terrível a ótimo, a depender de quem assiste e das expectativas. Vi muita gente que morria de amores pelo filme anterior e que detestou o que foi feito, mas também houve quem gostou bastante do que foi oferecido. Só não acho que a produção vai conseguir ganhar um novo público. Então, se esse é um filme no seu radar, provavelmente vale a pena conferir, ainda que ele não seja tão fresco e “revolucionário” (com o perdão da hipérbole).

Outras divagações:
Man of Steel
Batman v Superman: Dawn of Justice
The Batman
Black Adam
Suicide Squad
Birds of Prey: And the Fantabulous Emancipation of One Harley Quinn
Wonder Woman
Justice League
Aquaman
Aquaman and the Lost Kingdom
Shazam!
Shazam! Fury of the Gods
Joker

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

RELACIONADOS

0 recados