Divagações: Perfect Blue

Antes de saber que tipo de filme era Perfect Blue , eu soube da morte de seu diretor, Satoshi Kon . Aconteceu mais ou menos assim: eu estava...

Antes de saber que tipo de filme era Perfect Blue, eu soube da morte de seu diretor, Satoshi Kon. Aconteceu mais ou menos assim: eu estava no carro com meu namorado e ele colocou no rádio o podcast JCast, onde foi lida a carta que Satoshi Kon escreveu antes de morrer. Ele era consciente de sua doença e procurou arrumar as coisas de modo que sua partida incomodasse as pessoas ao seu redor no menor grau possível. Eu não conhecia aquela pessoa. Já tinha ouvido falar brevemente, mas nunca tive nenhum interesse especial. Mesmo assim, quase chorei ouvindo a leitura daquela carta. A sensibilidade que fez brotar aquelas palavras colocou também uma semente de curiosidade em mim. Seria questão de tempo até que eu me aproximasse mais da obra desse diretor de animação falecido em Tóquio, em 24 de agosto de 2010.

Algum tempo depois, soube que esse mesmo podcast fez um programa comparando Black Swan e Perfect Blue, o primeiro filme de Satoshi Kon lançado em 1998. Não cheguei a ouvir o programa completo, mas não nego que realmente há muitas semelhanças entre as duas obras e que o fato de Darren Aronofsky, diretor de Black Swan, ser detentor dos direitos de filmagem de Perfect Blue ajuda nessa influência (parcialmente) negada. Ainda assim, a versão oficial dos fatos prega que os direitos foram adquiridos para que Aronofsky pudesse filmar Requiem for a Dream, onde há uma cena na banheira muito similar a que aparece no filme japonês.

De qualquer modo, a sinopse dos dois filmes não nega certas semelhanças. A protagonista de Perfect Blue se chama Mima (Junko Iwao), ela é uma cantora adolescente de sucesso mediano. Para avançar na carreira, seu empresário aconselha que ela siga para a atuação, o que ela faz acompanhada por sua fiel amiga e agente Rumi (Rica Matsumoto). Essa mudança de cantora inocente e pura para atriz sensual acaba desagradando alguns dos antigos fãs de Mima, além de abalar o próprio psicológico da moça, que acaba sendo perseguida pelas ruas e fica rodeada por misteriosos atentados e assassinatos. A tensão sobre ela é tanta que Mima perde a noção de tempo, ficando com lapsos de memória e se desconcentrando no trabalho.

Assim, Perfect Blue, mesmo sendo uma animação, está longe de ser um filme para crianças. O filme recebeu censura R nos Estados Unidos, só podendo ser visto por maiores de idade. Uma curiosidade é que a produção deveria ser um longa-metragem com atores, mas se tornou uma animação devido aos custos que, suponho, também devem ter interferido na duração do filme, que tem apenas 81 minutos.

De qualquer forma, trata-se de um filme extremamente sensível. Toda a narrativa é focada na protagonista, sendo que o público sabe apenas o que ela sabe e compreende os acontecimentos com base na maneira como Mima os vê. As cores delicadas são contrabalanceadas pelo conteúdo forte, assim como a trilha sonora apresenta contrastes marcantes, que também denotam a mudança na carreira e no estilo de vida de Mima. O forte e o fraco, o real e a ilusão, a vida e a arte. Tudo é um jogo de opostos. O filme, inclusive, sabe se aproveitar do fato de ser uma animação para que a ilusão seja o mais real possível.

Acredite, Perfect Blue consegue ser encantador e perturbador ao mesmo tempo.

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