Divagações: The Kid Who Would Be King

Joe Cornish , apesar de ter trabalhado como roteirista em algumas coisas grandes aqui ou ali, só é conhecido mesmo como diretor por Attack...

Joe Cornish, apesar de ter trabalhado como roteirista em algumas coisas grandes aqui ou ali, só é conhecido mesmo como diretor por Attack the Block, um filme inglês de 2011 que basicamente revelou John Boyega e conseguiu misturar ação, comédia e ficção-científica de um jeito que já não víamos há algum tempo. Entretanto, The Kid Who Would Be King parece ser um trabalho bastante distinto para dar continuidade a filmografia do diretor, apresentando algo cada vez mais raro nos dias de hoje – um filme live action para o público infantil.

Inspirado nas lendas arturianas, a produção tem como protagonista Alex (Louis Ashbourne Serkis), um jovem rapaz que, nos dias atuais, tem que enfrentar a ausência do pai e problemas na escola. Um dia, depois de se colocar no alvo dos dois grandes valentões da turma, Lance (Tom Taylor) e Kaye (Rhianna Dorris), para ajudar seu único amigo, Bedders (Dean Chaumoo), Alex acaba se deparando com uma espada antiga em meio a uma construção abandonada. Ao retirá-la da pedra, ele acaba libertando a feiticeira Morgana (Rebecca Ferguson), que vê nisso a oportunidade para recuperar o artefato e dominar o mundo. Felizmente, Alex conta com a repentina ajuda do mago Merlin (Angus Imrie/Patrick Stewart), que ressurge para auxiliar o garoto e seus improváveis aliados a deter os planos da bruxa.

A maior complicação em fazer um filme voltado para o público infantil e, por consequência, para o resto da família que vai assistir a tiracolo, é conciliar uma história interessante com uma boa mensagem, já que esse tipo de filme raramente se dá ao luxo de ser apenas entretenimento. Por mais que isso possa incomodar em muitas ocasiões, especialmente quando a integridade da trama é comprometida pelas lições de moral, eu me surpreendi com o tato que The Kid Who Would Be King tem para tratar de certas questões.

Lançado em tempos de Brexit e durante certo clima de “desunião” da Grã-Bretanha, The Kid Who Would Be King tenta trazer uma história que lida justamente com estes temas e sentimentos de conflito no mundo moderno. O filme parte da proposição de que a nova geração é responsável por tornar o mundo um lugar melhor e mais igual, tratando as crianças com bastante maturidade e respeito, além de falar de vários outros temas interessantes no processo. Ainda que não se aprofunde demais e fique devendo um pouco na execução coerente de sua mensagem, o longa-metragem fica com saldo positivo, ainda mais por propositalmente rejeitar o velho clichê do herói escolhido e sua herança de sangue – algo que talvez não caiba mais na cultura contemporânea.

A aventura em si é competente, tem algumas surpresas legais e ideias realmente interessantes. Angus Imrie, sobretudo, rouba a cena como Merlin e injeta energia em um filme que talvez fosse bem mais apático de outro modo, dando a dose necessária de fantasia e magia em meio ao mundano e sendo cômico sem soar como um idiota. Porém, como muitos outros filmes com um elenco infantil, The Kid Who Would Be King sofre um pouco com atores inexperientes e personagens rasos. Somando-se isso a algumas piadas meio bobinhas e fora de lugar, a subutilização da vilã e um design de produção que deixa transparecer o orçamento limitado, temos algo que pode incomodar um pouco os adultos mais cínicos.

Mas meu único porém nem é exatamente culpa do filme: a ausência de cópias legendadas da produção para o grande circuito, mesmo em cidades onde esta prática é comum. Entendo que, por se tratar de um filme voltado a um público mais novo, existe uma demanda grande pelo produto dublado, mas é complicado encarar um live action dessa forma sem um pouco de estranhamento. Apesar de admirar o trabalho de dublagem nacional de forma geral, eu tento evitar isso para filmes com atores– infelizmente, dessa vez não foi possível, o que prejudicou meu aproveitamento.

De qualquer modo, se você tem uma criança em casa e quer ver um filme para toda a família que seja diferente, considere uma sensibilidade mais britânica e uma pegada mais agitada. The Kid Who Would Be King é uma escolha interessante para esse final de férias, porém, não sei se é algo que vai facilmente agradar a um público mais maduro. Mesmo os mais empolgados com o background arturiano podem muito bem esperar o lançamento sair em DVD e Blu-Ray para não precisar lidar com a obrigatoriedade da dublagem.

Outras divagações:
Attack the Block

Texto: Vinicius Ricardo Tomal
Edição: Renata Bossle

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