Divagações: Cine Holliúdy

No ano passado, aconteceu um estranho fenômeno. Um filme feito no Ceará e exibido apenas em Fortaleza e algumas pequenas cidades do estad...

No ano passado, aconteceu um estranho fenômeno. Um filme feito no Ceará e exibido apenas em Fortaleza e algumas pequenas cidades do estado começou a atrair mais pessoas que os grandes blockbusters estadunidenses. Em pouco tempo, a produção começou a chamar a atenção da mídia – especializada ou não –, que chegou a exaltar a genialidade do diretor e roteirista Halder Gomes.

Exagero? Talvez. Mas a verdade é que seria ótimo se o cinema nacional pudesse contar com mais filmes como Cine Holliúdy. A produção valoriza a cultura local e sua gente, com direito a legendas para traduzir o ‘cearensês’. Assim como Curitiba Zero Grau me surpreendeu ao mostrar as ruas que conheço e personagens que frequentam os mesmos lugares que eu, esse filme aproxima o cinema das pessoas e garante um novo grau de identificação. Com uma boa dose de comédia, então, as coisas não podiam ficar melhores.

Evocando de perto Nuovo Cinema Paradiso, Cine Holliúdy se passa na década de 1970 e acompanha uma família em busca realizar o sonho de seu patriarca Francisgleydisson (Edmilson Filho), que quer ser dono de um cinema. Sua esposa Maria das Graças (Miriam Freeland) e o pequeno Francisgleydisson Filho (Joel Gomes) embarcam nessa loucura e não medem esforços para que o sonho se transforme em realidade. O desafio adicional está na popularização das televisões nas pequenas cidades do Ceará, roubando o já diminuto público do cinema.

Com a aproximação da inauguração, a família de sonhadores vai conhecendo as figurinhas carimbadas da população local. Isso inclui o prefeito Olegário Elpídio (Roberto Bomtempo), a torcedora de futebol (Karla Karenina), a mocinha namoradeira (Fernanda Callou), o cego da cidade (Falcão), o bêbado (João Neto), entre outros. Assim, o filme se alterna entre a apresentação desses personagens caricatos e a realização da fantasia do pai, vista majoritariamente pelos olhos inocentes do filho.

Narrativamente, não há nenhuma inovação. O filme é bastante competente em mostrar uma das facetas do humor nacional e com esse aspecto todos já estamos acostumados. Felizmente, é uma comédia mais solta, com espaço para cenas pastelão, boas tiradas e piadas mais físicas – o que já havia chamado atenção no curta-metragem Cine Holiúdy - O Astista Contra o Cabra do Mal, que deu origem a esse filme.

O aspecto visual segue no mesmo sentido, sendo caprichado, mas sem apresentar elementos que mereçam destaque. Evitando arriscar, Cine Holliúdy entrega uma obra barata e divertida, capaz de atingir bons resultados sem forçar a barra. Obviamente, um pouco mais de tarimba não faria mal, mas o resultado é único em sua simplicidade e em sua honestidade. É assim que as coisas são.

Para quem tem contato com o Ceará, o filme ganha pontos ao deixar o sotaque tomar conta e valorizar as expressões locais. Contudo, muitos elementos ultrapassam as fronteiras do estado e encontram identificação em qualquer parte do país. Um exemplo fácil está no prefeito cheio de promessas que inaugura um simples banco de cimento em uma praça escura.

Vale acrescentar que os fãs de dublagens alternativas e de filmes de kung fu com qualidade duvidosa também devem encontrar motivos para mais risadas. Afinal, sem querer fazer demais, Cine Holliúdy realiza com louvor aquilo a que se propõe: divertir o público.

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